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Irã eleva riscos da guerra com demonstrações de força militar

Ataque no Paquistão e revide de Islamabad evidenciam perigo da extensão do conflito em Gaza

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São Paulo

Quando o Hamas atacou brutalmente Israel em 7 de outubro, parte de seu cálculo mais óbvio era a esperança de incendiar o chamado Eixo da Resistência, o grupo de aliados do Irã contrários à existência do Estado judeu, em uma guerra regional.

O foco mais evidente era o Hezbollah libanês; seu poderoso arsenal de mísseis e combatentes experimentados por anos de conflito com Tel Aviv; e, numa extrapolação, o próprio Irã.

Em Islamabad, ativistas de grupo islâmico protestam contra ataque do Irã a região do Paquistão
Em Islamabad, ativistas de grupo islâmico protestam contra ataque do Irã a região do Paquistão - Farooq Naeem/AFP

A intervenção militar dos Estados Unidos, que enviaram porta-aviões, caças e reforços para suas bases no Oriente Médio, deu as mãos aos temores domésticos do efeito de um conflito generalizado em Beirute e em Teerã, mantendo as tensões em um nível mais retórico do que prático.

A escalada da violência no teatro secundário do mar Vermelho, onde os houthis, grupo pró-Irã do Iêmen, deixaram de ser uma triste nota de rodapé nas guerras que assolam a região e viraram um problema para a economia mundial, começou a mudar a perspectiva.

Ante a reação dos EUA e seus aliados, em especial o Reino Unido, que estão transitando da timidez ineficaz da escolta de navios mercantes para bombardeios ativos de alvos houthis, Teerã se viu compelida a mostrar força.

Com uma justificativa aceitável —a reação ao maior atentado de sua história de 45 anos como República Islâmica—, o país dos aiatolás resolveu flexionar sua musculatura militar para lembrar o Ocidente e Israel de que gosta de operar por meio de prepostos, mas tem capacidades nada desprezíveis.

Primeiro, atacou bases de grupos sunitas rivais na área da Síria que não é controlada por seu aliado Bashar al-Assad. Provavelmente o fez de forma combinada com Damasco. Até aí, tudo bem, o recado era claro: foram usados mísseis balísticos para atingir alvos a 1.300 km de distância, uma prova do que Teerã é capaz.

A coisa se complica no outro ataque inicial, ao Iraque. O país vive uma situação peculiar, servindo ao mesmo tempo como aliado do Irã e hospedeiro de forças americanas e de outros países que lutam contra o Estado Islâmico —o mesmo que reivindicou o atentado contra o Irã no começo do ano— e são elas mesmas, pontualmente, alvo de ataques.

Ainda assim, estamos falando de países envolvidos numa mesma trama de conflito. Mas o sinal de alerta foi acionado nesta semana, com o bombardeio com mísseis e drones de uma base do chamado Exército da Justiça, um dos inúmeros grupos de combatentes abrigados nas áreas fronteiriças do Paquistão —terroristas para uns, arautos da virtude para outros, violentos e assassinos sempre.

Por toda sua instabilidade crônica, que remonta à traumática criação com a partilha da Índia britânica de 1947, o Paquistão não é nem o Iraque, muito menos a alquebrada Síria.

Esteve no centro da antiga "guerra ao terror" dos EUA no Sul da Ásia. É uma potência nuclear, dona de 170 ogivas atômicas, e mais militarizada que o Irã, tendo um Exército que lutou quatro guerras contra os indianos e vive em estado de constante alerta militar.

O revide de Islamabad, na madrugada desta quinta (18), teoricamente serve para deixar a opinião pública paquistanesa e a poderosa mídia local satisfeitas, permitindo que o assunto seja encerrado. O problema, claro, continua, dado que a política de fomento a grupos radicais está no DNA do Exército do país —que gestou nos anos 1990 um certo Talibã.

Concorre em favor do comedimento também o fato de que a China ocupou o espaço que por décadas foi dos EUA como principal patrono do Paquistão, tanto por interesses econômicos de escoamento de exportações como pela necessidade de manter a rival comum de ambos, a Índia, sob pressão.

E a China é uma aliada de Teerã no grande jogo da Guerra Fria 2.0, assim como a Rússia de Vladimir Putin. Não interessa a ninguém ver a briga fronteiriça escalar para algo pior.

Isso dito, as fagulhas de Gaza seguem insinuando labaredas que agora ultrapassam as fronteiras do Oriente Médio. Se a reação de Tel Aviv ao terror do Hamas não gerou o grande levante muçulmano sonhado pelo grupo palestino, é certo que a continuidade do conflito só arrisca um incêndio maior.

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