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Luciana Holtz e Mônica Gregori

Dados sobre câncer importam

Lei que torna obrigatória a notificação de casos precisa ser regulamentada

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Luciana Holtz Mônica Gregori

É provável que o número de casos de câncer no país seja muito maior do que o registrado nas bases oficiais existentes. Diversos especialistas na comunidade médica concordam que a baixa qualidade dos dados e a subnotificação podem estar mascarando nossos indicadores sobre a doença. Sem dados confiáveis, não sabemos com precisão onde vivem, como foram diagnosticados e como estão sendo tratados os pacientes.

Embora muitos se sensibilizem com o fato de o câncer ser um dos temas mais complexos que o sistema de saúde brasileiro enfrenta —dado seu impacto social e econômico—, poucas pessoas, incluindo representantes do poder público, têm noção do abismo que separa os registros oficiais da realidade dos hospitais e clínicas Brasil afora, ou seja, o problema é mais preocupante do que se pensa.

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), no ano passado, havia uma relação de 200 casos de câncer para cada 100 mil brasileiros. No entanto, esse número pode ser muito maior, pois as bases de dados ainda sofrem com a subnotificação e a defasagem de informações.

O Brasil, atualmente, tem apenas 21% da população coberta pelos registros de câncer (sistemas de mapeamento da doença utilizados mundialmente). Para efeito comparativo, outros países com sistemas unificados de saúde, similares ao SUS, possuem 100% de cobertura —caso do Reino Unido e países escandinavos. Mesmo que não tenhamos que atingir cobertura completa, devemos e podemos almejar melhores dados. Um caso de sucesso entre países com um sistema equiparável ao nosso é a Turquia, que em menos de 15 anos aumentou sua cobertura de registros de câncer para 62%.

Pacientes com câncer fazem sessão de quimioterapia em hospital paulistano
Pacientes com câncer fazem sessão de quimioterapia em hospital paulistano - Lalo de Almeida - 3.ago.18/Folhapress

Diante desse problema, a lei 13.685/18 foi aprovada, com o objetivo de garantir que todos os casos de câncer no Brasil, quando diagnosticados, sejam obrigatoriamente notificados às autoridades. A legislação, como de costume, não informa quem vai inserir a informação, qual sistema será usado e quais são as sanções para quem não cumprir a norma. Esse é um trabalho para o Ministério da Saúde: fazer a regulamentação da lei. No entanto, em 26 de junho, completou um ano de sua publicação e ela está engavetada nos escaninhos da pasta. 

Mais do que cobrar dos nossos representantes, é preciso que todos entendam que o problema do câncer só será enfrentado com eficácia se tivermos bom planejamento e clareza do que ocorre no sistema de saúde. Somente assim será possível identificar gargalos e monitorar o que está funcionando. A falta de notificação amplia a zona nebulosa na qual o câncer se alastra pelo Brasil, deixando ainda mais invisíveis os desafios a serem superados.

A lei parte da necessidade de que o sistema de dados sobre os vários tipos de câncer seja aprimorado. Hoje, ele é composto por diversos registros, mas eles não são integrados e seu preenchimento não é obrigatório.

No momento em que os ajustes fiscais e a contenção de recursos são debatidos em todo o Brasil, sua aplicação é fundamental para que os gestores públicos consigam priorizar iniciativas de maneira mais racional e estratégica, apliquem os investimentos com mais eficiência e tornem seus programas cada vez mais focados na realidade. Já para os pacientes, o principal benefício é de agilizar o acesso ao tratamento, pois, com a obrigatoriedade da notificação, será mais fácil aplicar determinações da Lei 12.732/12, que impõe o início do tratamento em até 60 dias após o diagnóstico.

Como todo gestor sabe, sem dados não se faz planejamento e sem planejamento não há gestão capaz de obter resultados sustentáveis. Por isso, defendemos a urgência para a regulamentação da lei 13.685/18. Com melhor aplicação dos recursos e aprimoramento da jornada do paciente, poderemos, enfim, trazer esperança para milhares de pessoas que convivem com a doença.

Luciana Holtz

Presidente do Instituto Oncoguia e fundadora do movimento Go All

Mônica Gregori

Cofundadora da Cause e gestora-executiva do Go All

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