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Flavio Cunha

Primeira infância e o caminho da prosperidade

Estamos limitando o desenvolvimento das crianças

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Flavio Cunha

Em 2006, o nosso país descobriu imensas reservas de petróleo na camada pré-sal. Como o reservatório está a 8.000 metros abaixo do nível do mar, no momento da descoberta não era nem um pouco óbvio o que fazer para extrair este recurso mineral. Hoje, a produção do pré-sal representa 60% da produção nacional. Este avanço jamais seria possível sem o trabalho de centenas de engenheiros que desenvolveram a tecnologia que garante ao Brasil enorme vantagem comparativa na extração de petróleo em grandes profundidades. Este caso mostra que o crescimento econômico de longo prazo é fruto de progresso tecnológico.

Progresso este que só é viável com um elevado estoque de mão de obra qualificada. E, por duas razões, devemos elevar investimentos no desenvolvimento na primeira infância para que o nosso país tenha trabalhadores altamente capacitados.

Alunos do 1º ano do ensino fundamental brincam de cabo de guerra em colégio de São Paulo - Raquel Cunha - 18.ago.15/Folhapress

Primeiro, as competências que as crianças adquirem no começo de suas vidas são pedras fundamentais para muitas outras habilidades que elas desenvolverão em estágios posteriores. Por exemplo, a proficiência em interpretação de textos é uma função da capacidade de decodificação e das competências da linguagem oral como vocabulário, semântica e compreensão da linguagem falada. Uma meta-análise nos EUA demonstrou que, entre crianças que tinham plena capacidade de decodificação, um ano de atraso no desenvolvimento da linguagem oral estava associado a um ano de atraso em interpretação de texto.

Em segundo lugar, vários estudos científicos mostram que algumas habilidades fundamentais são facilmente desenvolvidas na infância e que, quando nossas crianças não adquirem essas competências essenciais, o custo para toda a sociedade é muito elevado. A literatura mostra que crianças que crescem em ambientes com pouca interação verbal com adultos não desenvolvem toda sua capacidade de expressão e compreensão da linguagem oral. 

Um estudo icônico nos EUA documentou que pais com baixa escolaridade falam, diariamente, quase quatro vezes menos palavras para suas crianças que os pais de elevada escolaridade. O resultado é que, aos três anos de idade, as crianças vulneráveis tem um atraso no desenvolvimento do vocabulário de um ano de vida. Nossos estudos demonstram que é possível eliminar essa diferença a um custo de cerca de R$ 750 por família. Embora para alguns este valor seja elevado em período de crise fiscal, é importante considerar que a reprovação escolar dos alunos brasileiros, que não conseguem aprender muitas vezes por deficiência em leitura, nos custa em torno de R$ 16 bilhões por ano.

Nosso país tem limitado o potencial de desenvolvimento de nossas crianças, pois investimos pouco nos brasileirinhos. Neste sentido, a Iniciativa Petrobras pela Primeira Infância é bem-vinda pois reconhece a importância do desenvolvimento de crianças de zero a 6 anos. O projeto é pioneiro em política pública e será desenvolvido em parceria com o Ministério da Cidadania e as prefeituras. Ele poderá ser adaptado por todos os entes federativos do nosso país, com ou sem o apoio institucional da empresa. Além disso, por focar nas crianças em situações de vulnerabilidade, a Iniciativa Petrobras elevará a justiça social.

É improvável que o Brasil volte a ter elevadas taxas de crescimento econômico sem antes resolver o problema estrutural de formação de capital humano. Da mesma maneira que o nosso capital humano nos permitiu retirar tanta riqueza de enorme profundidade, necessitamos incrementá-lo para desenvolver novas tecnologias e elevar a produtividade das nossas empresas. Investir em capital humano, em especial na primeira infância, é o verdadeiro caminho da prosperidade nacional.

Flavio Cunha

Doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), professor titular da Cadeira Ervin Kenneth Zingler e um dos fundadores do Laboratório de Políticas Públicas do Texas, na Universidade Rice (EUA)

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