“Crime contra a humanidade” e “ato execrável” foram algumas das expressões utilizadas por especialistas em saúde para adjetivar a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de suspender o repasse de fundos à Organização Mundial da Saúde (OMS).
Líderes políticos e empresariais, além do secretário-geral das Nações Unidas, usaram palavras menos fortes, mas não tergiversaram ao condenar a decisão do mandatário norte-americano.
Com uma transferência anual em torno dos US$ 400 milhões, os EUA são a nação que mais dá dinheiro à organização. A OMS se mostra a única entidade com estrutura para promover em escala global a troca de informações sobre a Covid-19 e coordenar os esforços de autoridades sanitárias de todo o mundo.
Especialmente para países pobres da África e da América Latina, é ela que na prática acaba delineando as políticas para o enfrentamento da epidemia. Se seu poder de reação cair por falta de financiamento, deve haver custo em vidas.
Se já configura absurdo, por si só, privar a organização de verbas no auge da provável pior pandemia desde a da gripe espanhola, entre 1918 e 1920, a medida desafia os limites da torpeza quando se consideram as motivações de Trump.
Por um momento, pareceu que o republicano, que até há pouco integrava o bloco dos governantes negacionistas, havia feito as pazes com a realidade. Ele passou a ouvir seus conselheiros médicos e deixou de atuar contra as medidas de isolamento social.
Também começou a ordenar ações fortes para a aquisição de equipamento médico —talvez fortes demais, uma vez que os EUA passaram a ser acusados por aliados europeus de “pirataria moderna”, ao sequestrar cargas destinadas a outros países.
Bastou, porém, que a imprensa apontasse os muitos erros cometidos por Trump —notadamente a recusa em agir antes do espalhamento do vírus— para desencadear uma reação defensiva.
O americano decidiu fazer da OMS um bode expiatório, atribuindo-lhe alguns de seus próprios erros. Acusou-a, por exemplo, de demorar a reconhecer a magnitude da crise. Também deu vazão a suas obsessões clássicas, afirmando que a instituição “globalista” estava a serviço de interesses da China, entre outros disparates.
Não se pretende que a gestão da OMS nesta crise tenha sido perfeita. As críticas justas, entretanto, devem levar em conta o nível de informação de que se dispunha no momento da decisão. Nesse quesito, Trump se sai bem pior.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.