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Ives Gandra da Silva Martins

Harmonia e independência dos Poderes

Nunca a nação precisou tanto de diálogo como neste momento

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Ives Gandra da Silva Martins

Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP e professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra

Kant, ao examinar os princípios que fundamentaram a Revolução Francesa, concluiu que eram muito superiores a seus líderes, que, ao tentarem implantar a liberdade, igualdade e fraternidade, geraram o maior banho de sangue da história interna daquele país.

Com efeito, principalmente Robespierre, que governou um período denominado a Era do Terror (1792-1794), ao substituir Deus pela deusa “Razão”, tornou os tribunais populares, que condenavam à guilhotina quaisquer cidadãos por mera suspeita, a força suprema para separar os amigos do regime dos pretensos regimes.

A Revolução Francesa foi enterrada com a morte de Robespierre, vítima de seu próprio remédio político —seus ideais—, porém permaneceram influenciando até hoje os alicerces de qualquer regime democrático. Este se caracteriza pela convivência das opiniões divergentes e pela representação popular ser exercida por legisladores e administradores eleitos livremente.

O jurista Ives Gandra da Silva Martins - Mathilde Missioneiro/Folhapress

Na tripartição de Poderes, pretendida por Montesquieu em 1748, época em que foi criticado sob a alegação de que Poder dividido não é Poder, respondeu que é necessário que o Poder controle o Poder, pois o homem no poder não é confiável.

Dos três Poderes, o mais representativo é o Poder Legislativo, pois nele todo o povo está presente (situação e oposição), vindo a seguir o Executivo, em que a maioria apenas está representada e, às vezes, nem a maioria, quando há segundo turno nas eleições.

Por fim, o Poder Judiciário não é eleito pelo povo, mas, como a maioria dos servidores, seus juízes são aprovados por concursos e, em alguns países, aqueles da Suprema Corte escolhidos, pessoalmente, pelo primeiro mandatário.

A Constituição brasileira determinou que o Estado democrático (artigo 1º) teria três Poderes harmônicos e independentes (artigo 2º) com atribuições bem definidas na lei suprema. O Legislativo tem-nas nos artigos 44 a 69, devendo zelar sua competência normativa perante os outros Poderes (artigo 49, inciso 11).

O Executivo possui suas atribuições privativas descritas no artigo 84, não podendo ser retiradas por legislação infraconstitucional ou decisões judiciais.

E ao Judiciário não é permitido invadir competências legislativas ou executivas, nem mesmo quando, em ações diretas de inconstitucionalidade por omissão, percebe a existência de omissões inconstitucionais nesses Poderes, devendo apenas notificá-los para que corrijam a omissão (artigo 103, parágrafo 2º).

Os freios e contrapesos estão na lei maior para que os Poderes sejam harmônicos e independentes, e a cidadania e seus direitos e garantias individuais preservados na democracia brasileira (artigos 5º a 17 da CF).

Em face destes dispositivos, eu me pergunto se ainda os Poderes são harmônicos e independentes no país.

As crises econômica e de saúde, que o Brasil longe está de ter superado, merecem de todos os brasileiros, cidadãos vinculados ou não ao Poder uma reflexão profunda, a fim de que, com a colaboração de todos, possamos vencer o quanto antes os dramáticos desafios.

Nunca a nação precisou tanto de diálogo como agora.

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