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Pedro Estevam Serrano

O voto secreto é o melhor modelo para as eleições das presidências da Câmara e do Senado? NÃO

Voto do parlamentar não é expressão de interesse próprio ou corporativista

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Pedro Estevam Serrano

Doutor em direito do Estado, é professor de direito constitucional e de teoria do direito na Faculdade de Direito da PUC-SP

Nossa Constituição não possui uma regra expressa quanto à exigência de voto secreto ou público para as eleições das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. O artigo 57, parágrafo 4º, da Carta Magna prevê apenas que as Casas do Congresso Nacional reunir-se-ão em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro do primeiro ano de cada legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas. Por outro lado, os regimentos internos das Casas preveem escrutínio secreto.

Entretanto, a eleição das Mesas —o que inclui a escolha dos presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados— deve ocorrer em sessão pública e mediante voto aberto. A publicidade é uma exigência que se impõe em razão da natureza democrática e republicana da função pública exercida pelos parlamentares, bem como do direito de controle, pelo povo, sobre a ação dos seus representantes eleitos —sem que isso implique adoção, entre nós, do chamado mandato imperativo.

O professor de direito Pedro Serrano no lançamento de seu livro 'Autoritarismo e Golpes na América Latina - Breve Ensaio sobre Jurisdição e Exceção', na Livraria da Vila, em São Paulo - Bruno Poletti - 26.ago.16/Folhapress

A publicidade do voto permite, sem comprometer a independência do parlamentar —o qual, inclusive, é munido de determinadas prerrogativas e imunidades—, o acompanhamento do cumprimento da ideologia e do seu programa político e, consequentemente, confere ao eleitor informações imprescindíveis para o periódico exercício do sufrágio universal, especialmente em democracias constitucionais que não admitem o “recall”. Por essa razão, o sigilo é uma fraude à democracia constitucional na medida em que o voto do parlamentar não é uma expressão de um interesse próprio, corporativista ou particularista.

As presidências das Casas do Congresso Nacional exercem relevantes funções relativas à organização político-administrativa do Estado brasileiro, destacando-se, exemplificativamente, estarem na linha sucessória da Presidência da República, representarem as respectivas Casas, presidirem sessões legislativas, organizarem a agenda de proposições a serem apreciadas, designarem a ordem do dia e integrarem o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional —sendo, ainda, de competência das Mesas promulgar emendas à Constituição e propor ações de controle de constitucionalidade.

Também por essa razão, o sentido da democracia não deve esgotar-se nas eleições majoritárias e proporcionais periódicas. É preciso que a soberania popular seja munida de mecanismos ininterruptos de controle.

O acompanhamento da atividade política do parlamentar através de ampla publicidade para seus atos é essencial ao modelo representativo, o que pressupõe incessante fiscalização. O acompanhamento dos processos decisórios parlamentares, dentre os quais se incluem as votações nas eleições das mesas das Casas do Congresso Nacional, é inerente ao espírito da democracia constitucional, o que pressupõe, inclusive, legítima pressão da opinião pública.

O clássico trinômio eletividade, periodicidade e responsabilidade, inerente à forma republicana de governo em que o exercício das funções políticas ocorre em nome do povo, não esgota os anseios decorrentes da complexidade do regime democrático na contemporaneidade. Por essa razão, não se pode suprimir o que é mais elementar na nossa democracia constitucional: o processo constante que a oxigena com transparência e permite o escrutínio das representações do povo, do qual todo poder emana e não se realiza às cegas.

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