Descrição de chapéu
Nísia Trindade Lima e Cristiana Toscano

Vacina de confiança

Só superaremos o desafio com ações coletivas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Nísia Trindade Lima

Presidente da Fiocruz e membro da Academia Brasileira de Ciências

Cristiana Toscano

Integrante do Grupo Consultivo Estratégico de Especialistas em Imunização da Organização Mundial da Saúde (Sage-OMS)

Pandemias são fenômenos recorrentes na história da humanidade, e seu impacto tem sido determinado pela forma como as sociedades se organizam para enfrentá-las. Ainda que se verifiquem hoje avanços no desenvolvimento científico e tecnológico, tão necessários a esse enfrentamento, a gravidade da crise desencadeada pela Covid-19 impõe novos modos de pensar e agir, com o fortalecimento da cooperação internacional e a revisão do modelo de desenvolvimento em curso.

E é nesse sentido que a atual pandemia deve ser vista como um fato social total, por envolver todas as instituições da sociedade —sanitárias, científicas, econômicas, políticas, religiosas e culturais. Se o conceito proposto por Marcel Mauss ajuda a pensar a Covid-19 para além do fenômeno biológico da infecção de seres humanos pelo Sars-CoV-2, mostra também sua força quando analisamos o papel das vacinas que começam a ser oferecidas como resposta à crise sanitária, social e humanitária que vivemos.

A vacinação mobiliza um amplo complexo de ações e instituições envolvendo rede de pesquisadores, laboratórios científicos e de desenvolvimento tecnológico, grandes farmacêuticas, regulação sanitária, organismos internacionais e políticas específicas dos estados nacionais; sendo implementada por meio de uma complexa operação logística para distribuição das vacinas e por milhares de profissionais de saúde treinados para administrá-las.

Diante das grandes assimetrias mundiais e dos efeitos de opções econômicas imediatistas, responsáveis pela dependência da maior parte dos países do mundo a poucos centros de produção, os principais laboratórios de tecnologias em saúde —no Brasil, Fiocruz/Biomanguinhos e Instituto Butantan— vêm dando uma contribuição inestimável para a proteção da sociedade brasileira.

No caso da Fiocruz, destaca-se a produção, através do acordo de encomenda e transferência tecnológica firmado com a farmacêutica AstraZeneca, do imunizante originalmente desenvolvido pela Universidade de Oxford contra a Covid-19. A instituição fornecerá, por meio do SUS, 200,4 milhões de doses ainda em 2021 à população brasileira. Trata-se de uma inovação que também permitirá ao país incorporar a tecnologia de vetores virais, além de garantir a sustentabilidade da produção nacional da vacina contra a doença.

O imunizante Oxford/AstraZeneca/Fiocruz tem eficácia e segurança demonstradas e está sendo adotada por vários países do mundo. É recomendado para adultos a partir de 18 anos, incluindo idosos, e deve ser administrado em duas doses. Evidências recentes de eficácia subsidiaram a recomendação da Organização Mundial da Saúde de se estabelecer o intervalo entre as doses para 8 a 12 semanas. Além de mais eficaz, o intervalo recomendado permite ampliar o alcance da vacinação.

Só poderemos superar esse tempo de grandes perdas e incertezas com ações coletivas orientadas pelos princípios de cooperação e solidariedade social. Se olhamos esse processo como uma corrida, temos a sensação de que o vírus está sempre na dianteira, com novas manifestações e variantes que impõem contínuos desafios para o controle efetivo da pandemia. Aqui, novamente, as vacinas aparecem como importante instrumento; quanto mais vacinarmos, menos chances daremos às mutações virais.

Frutos do desenvolvimento científico e tecnológico e necessárias enquanto bem público e de acesso universal, as vacinas são literalmente gotas de confiança e esperança; e a vacinação é, de fato, o caminho para a superação da pandemia. Ele deve ser trilhado sem que esqueçamos as medidas não farmacológicas de proteção: distanciamento social, uso de máscaras e higienização. Não há proteção individual sem a necessária proteção coletiva. Esta máxima deve orientar as ações de resposta à crise global representada pela Covid-19.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.