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O que a Folha pensa enem

Transparência é lei

Regras de proteção de dados não podem obstruir informações públicas essenciais

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Tela de computador - Mal Langsdon/Reuters

Agentes do Estado não precisam de mais do que um filamento de pretexto jurídico para tentar forçar a interpretação das leis que lhes convêm, nem sempre coincidente com o interesse público.

Exemplo grotesco desse pendor veio do Exército, que, em nome da proteção à privacidade do general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, determinou, com base na Lei de Acesso à Informação, sigilo de cem anos para o processo que livrou o militar da ativa de punição por ter participado de ato político de apoio a Jair Bolsonaro (PL).

Pior, a prática tortuosa vem sendo estendida até a grandes coleções de dados produzidas pela administração, com impactos deletérios para a transparência pública e até para a atividade científica.

Com efeito, agentes públicos vêm invocando dispositivos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para suprimir o acesso a microdados do Enem e de outras avaliações a cargo do Ministério da Educação, fundamentais para a produção de estudos que poderão dar sustentação a políticas públicas para o setor.

Foi à LGPD que o Gabinete de Segurança Institucional recorreu para negar-se, repetidas vezes, a divulgar listas de pessoas que visitaram o Palácio do Planalto.

E foi com base nesse mesmo diploma que se cogitou impor sigilo a dados sobre doações eleitorais. Em tempo, o presidente do TSE, Edson Fachin, afastou essa interpretação, ao menos em sua gestão.

Não se pode afirmar que seja uma surpresa. Como observou o colunista Ronaldo Lemos nesta Folha, Cláudio Weber Abramo já alertara, em 2018, que autoridades recorreriam à LGPD para sonegar dados e documentos à sociedade.

Não há dúvida de que o Estado precisa tentar salvaguardar informações sensíveis de cidadãos que estejam em seu poder. Experimentos um tanto sinistros mostraram que mesmo dados "anonimizados" podem, se houver disposição e acesso a outras bases, ser facilmente "desanonimizados". É característica dos tempos atuais.

Entretanto isso deve servir de estímulo a que se busquem novas formas de proteger registros, não a que sejam simplesmente retirados do escrutínio público.

A regra geral da administração, que vale para atos, processos e números, é a publicidade —sendo o sigilo reservado para os casos excepcionais em que há ameaça de dano concreto ao cidadão. Sem isso, é a própria democracia que não estará funcionando bem.

editoriais@grupofolha.com.br

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