Lento. Desgastante. Doloroso. Os adjetivos usados pela mãe de Yan Barros da Silva, 19, definem a morosidade do sistema judiciário na punição dos responsáveis pela morte de dois jovens negros em Salvador, há um ano. A dupla foi entregue a um tribunal de criminosos, e os corpos traziam marcas de tiros e sinais de tortura. À Justiça coube justificar o hiato para concluir o julgamento pela carência de servidores e por falta de agenda.
Os assassinatos reúnem, ainda, mais um elemento vexatório para as instituições e para o país. Foram motivados pelo furto de carne, produto que contribuiu para que a inflação da cesta básica superasse a média de preços no acumulado de 12 meses até fevereiro.
É na mesma rede judiciária que, nos estados, tem desaguado com mais força principalmente após a pandemia o volume de presos por furto de alimentos.
Não há estatística oficial, mas Defensorias Públicas de estados como Goiás e Pernambuco estimam que até dobraram os casos de detidos subtraindo itens como leite, biscoito e papel higiênico se comparado a 2020.
As situações que chegam a público estão ainda aquém da realidade, afirmam os defensores. Isso porque funcionários muitas vezes não acionam a polícia e fazem o próprio tribunal de condenação ou absolvição de quem suspeitam.
A ausência de estatísticas embasa a consequente lacuna de ação pública não apenas para envolvidos em crimes famélicos.
Também não há dados sobre outro grupo vulnerável. Nas capitais, as prefeituras não sabem quem são e quantas são as pessoas em situação de rua pela falta de censo atualizado.
Belo Horizonte é um dos municípios mais defasados, com último levantamento sobre sua população de rua feito em 2013. Em Fortaleza, o mapeamento mais recente é de 2015.
Sem dados, um problema não existe e não se exige atuação do poder público. Sem justiça, a dor de Elaine Costa Silva, 38, mãe de Yan, e a de tantas famílias vulneráveis permanecem sem amparo.
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