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Julio Cesar Vieira Gomes, Sandro de Vargas Serpa e José de Assis Ferraz Neto

É preciso desconcentrar a tributação da renda nas empresas

Modelo prejudica reinvestimento e afeta produtividade e criação de empregos

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Julio Cesar Vieira Gomes

Secretário especial da Receita Federal

Sandro de Vargas Serpa

Secretário especial adjunto da Receita Federal

José de Assis Ferraz Neto

Subsecretário-geral da Receita Federal

O Brasil possui um sistema tributário peculiar, que diverge do mundo em relação à tributação dos dividendos. Dentre os países da OCDE, somente Letônia e Estônia adotam o modelo brasileiro e não tributam a distribuição de lucros. A maioria das economias, inclusive China, Índia, Argentina e Colômbia, utiliza o modelo de tributação dos lucros em duas etapas, com tributação no nível da empresa e na pessoa física.

O modelo brasileiro vem de 1995, quando se optou por concentrar a tributação do lucro no nível da empresa e isentar as distribuições efetuadas às pessoas físicas.

Sede da Receita Federal, em Brasília - Sérgio Lima/Folhapress

A incidência única do imposto no nível da pessoa jurídica prejudica o reinvestimento na atividade empresarial e tem efeitos negativos sobre a produtividade e a geração de emprego. É ineficiente quanto à atração de investimento estrangeiro. Ao se concentrar a tributação na empresa, o investidor estrangeiro estará sujeito à tributação no nível da pessoa jurídica e, muitas vezes, quando se dá a distribuição dos lucros, também no seu país de residência.

Os demais países seguiram em direção diametralmente oposta a partir da constatação de que a desoneração do capital não acelerou o crescimento econômico, mas sim a desigualdade social. O modelo brasileiro reflete bem essa desigualdade. A isenção concedida contribui para a regressividade, pois aqueles com maior capacidade contributiva acabam por ter uma tributação favorecida quando comparada com a tributação da renda incidente sobre rendimentos em geral das pessoas físicas, como salários e proventos de aposentadoria. Sem mencionar a patogênica "pejotização" e proliferação de empresas criadas por contribuintes de alta renda para explorar seu patrimônio e subtributar seus rendimentos.

Essa regressividade está bem demonstrada na análise das declarações de IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física) de 2020. Com rendimentos acima de 320 salários mínimos (R$ 352 mil/mês), há 20.858 contribuintes que, em conjunto, receberam R$ 230 bilhões de rendimentos isentos. O imposto pago por esse grupo revela uma alíquota média de IR de apenas 1,8%.

As grandes economias adotam um modelo de tributação do lucro em duas etapas (parte na empresa e parte no investidor). Entre 2000 e 2022, houve uma redução média de 9% das alíquotas nominais do IR das empresas entre os países da OCDE. O Brasil não seguiu essa tendência e manteve a alíquota de tributação das empresas no mesmo patamar (34%), bem acima da média dos países da OCDE (23,3%) e do G20 (26,9%). No entanto, como a distribuição de dividendos é isenta, no conjunto das duas incidências o Brasil está abaixo da média da OCDE (41,9%). ​

A proposta do governo segue a tendência mundial, com desoneração das empresas e do trabalhador, incentivando a produção e promovendo a igualdade. Ataca privilégios hoje usufruídos por poucos, mas cujo ônus é sustentado por todos.

O modelo proposto de tributação dos lucros é simples e adotado por diversos países. Não traz complexidades para a pessoa física e tampouco para a pessoa jurídica. O imposto será retido na fonte quando os dividendos são pagos aos sócios.

Tem-se propagado que o modelo atual teve efeito positivo na redução de litígios e que o novo modelo aumentará a insegurança jurídica. Entretanto o que se constatou foi a alteração nas questões controversas, passando a se concentrar em aspectos para a redução da base de cálculo do IRPJ (Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas) e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), tendo em vista a alíquota de tributação da renda em 34%. Há o incremento em disputas envolvendo práticas para a redução da base de cálculo, tais como ágio, despesa de arrendamentos, preços de transferência...

O projeto encaminhado pelo governo de tributação dos dividendos e redução do IRPJ é uma proposta sólida, de longo prazo, e que pretende promover o crescimento e reduzir a iniquidade tributária existente no país. Cabe à nossa sociedade não perder a oportunidade histórica de discuti-la com maturidade e isenção.

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