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O que a Folha pensa Cracolândia

Pedras no caminho

Após 4 meses, ações na cracolândia acumulam resultados modestos e incertezas

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Venda e consumo de drogas na cracolândia da rua Helvétia, no centro da capital paulista - Danilo Verpa/Folhapress

"Cinco pedras", pede o homem ao entregar uma nota de R$ 50. "O senhor trabalha?", pergunta o suposto traficante, após uma rápida conversa. "Cinco pedras", repete por duas vezes o dependente químico, visivelmente debilitado.

O imaginário vendedor de crack —na realidade o delegado Roberto Monteiro— chefiava uma operação contra o tráfico, em um prédio abandonado no centro de São Paulo, e acabou confundido.

O policial classificou o episódio como "triste" e "surreal". Já o usuário, ao notar que a negociação não iria adiante, logo partiu —não sem antes pegar seu dinheiro de volta.

A cena insólita, flagrada pela Folha no último dia 20, ilustra a dimensão do flagelo na região da cracolândia, agora pulverizada pela capital paulista após mais de quatro meses de controversas intervenções lideradas pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) e pelo governador Rodrigo Garcia (PSDB).

Desde que uma blitz desocupou a praça Princesa Isabel, onde se concentrava o fluxo, usuários perambulam e se instalam em pontos diversos, num jogo de gato e rato com as forças de segurança.

Espalhadas, as minicracolândias têm prejudicado comerciantes e assustado pedestres e moradores, muitas vezes acuados entre a desordem pública, a insegurança e as recorrentes ações de repressão.

Um ponto crítico parece ser a rua Helvétia. No último dia 13, escamoteados em barracas e bancas, traficantes vendiam crack livremente a poucos passos de uma delegacia. Não longe dali, na região da Santa Ifigênia, moradores contam que, à noite, o feirão ocorre aos gritos de "olha o pó, olha a pedra".

Coibir o agrupamento em um só local faz parte do modelo adotado por prefeitura e governo do estado. Avalia-se que a desarticulação obstrui o comércio de entorpecentes e facilita intervenções para estimular usuários a buscar tratamento.

A estratégia é criticada por especialistas que defendem uma política de redução de danos menos repressiva e de acolhimento.

Os resultados até agora se limitam a prisões que parecem não inibir o crime, apreensões esporádicas e algumas internações.

Não resta dúvida de que ainda é cedo para cobrar resultados duradouros diante de uma chaga que assola a cidade há décadas.

As incertezas, contudo, podem crescer em 2023 com uma possível troca de comando no Bandeirantes. É crucial que os postulantes, entre eles o incumbente, esmiúcem seus planos além de promessas vagas e soluções simplistas.

editoriais@grupofolha.com.br

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