Descrição de chapéu
Roberto Muylaert

"Argentina, 1985"

Assista ao filme e sinta inveja ao ver que, lá, os generais foram em cana

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Roberto Muylaert

Escritor e jornalista

Para mim, cinema argentino é Ricardo Darín. Claro que não é só isso, mas um bom ator como ele convence sempre, qualquer que seja o tipo de filme, amparado por uma equipe de roteiristas, fotógrafos, produtores e diretores que fazem a diferença graças aos cursos técnicos de bom nível que sempre existiram naquele país.

Bom a gente assistir a "Argentina, 1985" em época de eleições, porque não é possível votar em Jair Bolsonaro (PL) na sua qualidade de declarado admirador do celerado delinquente, membro das nossas Forças Armadas, coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra —ex-chefe do DOI-Codi do 2º Exército, em São Paulo, um dos órgãos atuantes na repressão política, durante a ditadura militar no Brasil.

A Argentina torturou e matou muito mais gente que o Brasil; em por isso os crimes do gênero perpetrados por aqui são menos indecentes.

Na Argentina, os militares envolvidos foram em cana, sendo alguns ex-presidentes punidos com prisão perpétua.

Aqui não: muito torturador circula por aí, assustando os antigos "clientes" com quem podem cruzar na rua por acaso. Brasil tem o tal do jeitinho, que acho até uma qualidade do nosso espírito, em oposição ao estilo germânico, onde a espinha dorsal quebra, mas não verga. Somos mais flexíveis.

Mas, no campo dos direitos humanos, não há como "dar um jeitinho" ao anistiar conhecidos criminosos que trataram com desdém garantias da Declaração dos Direitos Humanos Universais. O fato é que eles foram perdoados "ad limine" por uma anistia em que se comparam oficiais do Exército e seus homens instalados em próprios das Forças Armadas, aos guerrilheiros aniquilados.

Nosso jeitinho foi além, revelando em testemunhos os abusos cometidos por agentes da ditadura —Comissão da Verdade-, mas sem finalidade punitiva, pois a anistia geral, ampla e irrestrita seguiu valendo, mesmo tendo sido estabelecida ainda na ditadura militar.

Assista ao filme e sinta inveja ao notar que os generais de lá, após esgotarem suas pesadas ameaças, foram em cana —sem antes se debaterem como peixe apanhado na rede de seus próprios malfeitos. Por aqui, faltou a figura valente do promotor Julio Cesar Strassera, vivido por Darín.

E, cá entre nós, que debate primário o de sexta-feira (28). Deve ter aumentado o número de votos nulos.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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