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Fernando Goldsztein

Coalizão ou loteamento?

Processo transitório é saudável, mas preocupa briga por espaço no novo governo

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Fernando Goldsztein

Empresário e fundador do The Medulloblastoma Initiative

MDB, PT, PSDB, PP, PDT, União Brasil, PTB, PL, PSB, Republicanos, Cidadania, PSC, Podemos, PSD, PC do B, PV, Patriota, Solidariedade, PSOL, Avante, PMN, Agir, DC, PRTB, Pros, PMB, Rede, Novo, PSTU, PCB, PCO e UP,

Sim, este primeiro parágrafo mais parece aquela sopa de letrinhas que saboreávamos quando crianças. Mas este artigo, infelizmente, nada tem a ver com as nossas saudosas experiências infantis. O emaranhado de siglas representa os 32 partidos políticos existentes no Brasil. Sim, você não leu errado. Temos 32 partidos políticos.

Desde que consumadas as eleições para presidente, não se fala em outra coisa que não a transição de governo. Pipocam alianças, nomeações e cargos por todos os lados. O alvoroço é grande. Tal qual um pote de açúcar colocado ao lado de um formigueiro.

Claro que as transições de governo fazem parte do processo democrático. Governos não transitórios, que são as ditaduras, não são desejáveis. Portanto, não faço apologia contra as inúmeras comissões que estão sendo formadas para conduzir esse processo.

O que realmente preocupa é perceber que muitos dos envolvidos não estão preocupados em construir um país melhor para os nossos filhos e netos. Desejam, sim, conseguir espaço no novo governo. Um bom cargo de confiança, a diretoria de uma estatal ou, quem sabe, até um novo ministério.

A chamada coalizão para governar confunde-se com o loteamento do governo e a consequente distribuição de cargos (na maioria das vezes sem levar em conta os melhores interesses do país). Tal fenômeno, que é recorrente também nas esferas estaduais e municipais, infelizmente faz parte da história do Brasil.

Independentemente de os governos serem liberais ou conservadores, ou de estarem posicionados mais à esquerda ou à direita, existem verdades que, a essa altura, não podem (ou não poderiam) ser alvo da retórica inconsequente. Trata-se da responsabilidade fiscal. Sem ela geramos instabilidade, fuga de investimentos, inflação, desemprego e, ao fim e ao cabo, sofrimento justamente para os mais vulneráveis.

É evidente que o social deve ser prioridade, mas, para isso, é necessário cortar custos, ineficiências e privilégios, não aumentá-los. É necessário preencher os quadros do governo com técnicos competentes, não com políticos. É necessário adotar políticas públicas que atraiam investimentos, não que afugentem os investidores. Somente assim conseguiremos gerar mais empregos e arrecadar mais impostos (justamente para fazer mais pelo social). A retórica não enche a panela de ninguém, pelo menos não no longo prazo.

Como diz Barry Ames no seu livro lançado em 2001, "The Deadlock of Democracy in Brazil" ("O Impasse da Democracia no Brasil", em tradução livre): "Embora privilégios irracionais podem ser encontrados em agências de governos por todo o mundo, no Brasil o escopo e a profundidade destes privilégios não têm precedentes. A estrutura politica do Brasil é preenchida por uma grande quantidade de partidos fracos e indisciplinados e também por centenas de deputados que se preocupam muito mais com seu curral eleitoral e com interesses pessoais do que com questões de abrangência nacional. Em alguns países, o Executivo consegue o apoio do Legislativo pressionando os partidos a apoiar os programas presidenciais. Essa tática possui pouca resposta no Brasil porque os laços entre os eleitores, os deputados e os partidos são extremamente fracos". Toda essa situação descrita por Ames há 20 anos segue muito atual ou até pior nos dias de hoje.

É evidente, também, que a verdadeira solução para o Brasil passa por reformas estruturantes, tais como a política, a tributária e a administrativa; além, é claro, por privatizações. Um governo mais "leve" e eficiente, não um cabide de empregos e privilégios, poderá fazer muito mais pelo social. Mas este será tema de próximos textos. Por ora, torço para que o novo governo dê a devida importância para a responsabilidade fiscal e não abra mão de colocar técnicos competentes para preencher seus cargos. Isso já seria um grande avanço!

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