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Um golpista a menos

Investida canhestra de Castillo no Peru é barrada, mas política segue no caos

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Pedro Castillo, ex-presidente do Peru - Ernesto Benavides/AFP

Se a falta de tarimba política, o pendor autoritário e a débil base de apoio já prenunciavam as dificuldades que Pedro Castillo encontraria como presidente do Peru, sua derrocada, 16 meses após assumir o cargo, causa espanto até mesmo em se tratando de um país que se acostumou a conviver com crises institucionais.

Na quarta-feira (7), em ação tão inesperada quanto canhestra, Castillo anunciou a dissolução do Congresso, um toque de recolher e a instauração de um governo de exceção. Em poucas horas, no entanto, a tresloucada tentativa de subversão da ordem foi fulminada.

Qualificado de golpe de Estado pelo Tribunal Constitucional, condenado pelas Forças Armadas e rechaçado por integrantes do próprio governo, o movimento cesarista serviu apenas para angariar no Congresso o apoio necessário à destituição do presidente, enfim aprovada por 101 dos 130 membros.

A manobra do líder esquerdista também foi rapidamente repudiada por outros países do continente, bem como pelo presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que reconheceu a legalidade da resposta institucional.

O fracassado levante de Castillo, que acabou detido sob a acusação dos crimes de rebelião e conspiração, encerra de modo tragicômico uma trajetória política improvável e caótica. Após um pleito extremamente polarizado, o ex-professor primário assumiu o poder em julho do ano passado, mas nunca chegou, de fato, a governar.

Em constante atrito com o Legislativo, acumulou nada menos que cinco gabinetes ministeriais. Nos últimos meses, viu-se ainda enredado em escândalos de corrupção.

Na quarta, com a votação de uma moção de censura no Congresso, o líder aventureiro tentou se salvar rompendo as regras —num gesto que, guardadas as proporções, remete à usurpação de poder levada a cabo por Alberto Fujimori no país vizinho três décadas atrás.

A destituição de Castillo, contudo, apenas afasta um dos vértices da crise e não significa o fim da tormenta política peruana.

A nova presidente, Dina Boluarte, a sexta pessoa a ocupar o cargo desde 2018, também lidará com um Congresso instável, coalhado de siglas com pouca coesão interna que atravancam as negociações com o mandatário de turno.

A isso soma-se um desenho institucional problemático, que permite que Legislativo e Executivo possam, com muita facilidade, investir contra os poderes um do outro.

O agora ex-presidente Pedro Castillo era certamente o homem errado no lugar errado, mas ainda há muito a ser feito para que o estado de crônica crispação política do Peru se dissolva nas águas mais calmas da estabilidade democrática.

editoriais@grupofolha.com

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