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Longe das encostas

Verticalizar o litoral paulista aliviaria falta de lotes, mas há outros desafios

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Deslizamento de terra destrói casas na Barra do Sahy, em São Sebastião (SP) - Amanda Perobelli/Reuters

Chuvas de mais de 600 mm em poucas horas castigaram São Sebastião, localidade do litoral norte paulista mais atingida pelo evento climático extremo que matou 65 pessoas no Carnaval. Não há solução rápida para prevenir novas tragédias, mas urge mobilizar a comoção surgida para formatar um projeto justo e exequível no médio prazo.

Antes de surgirem cerca de 2.000 novos desabrigados, concentrados na praia de Barra do Sahy, o município já contava 25 mil habitantes em moradias inadequadas, sendo 9.000 em áreas de risco como as encostas que deslizaram. Calcula-se que seria preciso erguer de 8.000 a 10.000 casas para sanar o déficit.

Mas a proximidade entre a orla e o paredão da serra do Mar, a ocupação intensa por casas de veraneio e 70% de áreas com restrições ambientais limitam a disponibilidade de terrenos para erguer conjuntos habitacionais de cunho social.

Assim, parece razoável a proposta do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) de verticalizar a região, elevando de 9 para 15 metros o gabarito máximo para prédios. A medida aliviaria em parte a escassez de lotes, sem, no entanto, garantir que se superaria a segregação social na região.

Em primeiro lugar, os pobres que prestam serviços para turistas já careciam de saneamento básico em suas moradias precárias. Não faria sentido sair a construir casas só para jogar mais esgotos in natura no mar, agravando a saúde dos moradores permanentes e a deficiente balneabilidade das praias.

Terrenos distantes das encostas perigosas, ademais, são precisamente o alvo da especulação imobiliária. Construir novas moradias nos extremos norte e sul, forçando trabalhadores a viagens diárias de dezenas de quilômetros, só aprofundaria a estratificação social

O ideal seria edificar conjuntos menores, verticalizados que sejam, nos lotes que restam perto do mar e dos locais de trabalho.

Por fim, há uma preocupação pertinente sobre a possibilidade de que futuros apartamentos sociais ou casinhas geminadas venham a se tornar propriedade de forasteiros recém-chegados. Assim aconteceu no passado com as casas de caiçaras na praia, e o resultado consternador está à vista de todos nos dois lados da Rio-Santos.

Os mais pobres voltariam mais uma vez a ocupar os morros instáveis e as tragédias tornariam a repetir-se nos piores verões —assim como promessas de solução do poder público que nunca chegam.

editoriais@grupofolha.com

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