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O que a Folha pensa mudança climática

Tragédia recorrente

Chuvas evidenciam mudança do clima a exigir de governos um plano de adaptação

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Lama desce encosta do morro e invade ruas na região de Juquehy, em São Sebastião (SP) - Fernando Marron/AFP

O dilúvio mortífero abatido sobre o litoral norte de São Paulo se enquadra na categoria dos desastres sazonais cuja repetição destoa em tudo da capacidade do poder público —ou falta dela— de se preparar para defender a população.

A cada passagem do ano, Sudeste e Sul do país, assim como o litoral do Nordeste, se veem inundados por chuvas torrenciais. Ruas e bairros deslizam morro abaixo, sepultando famílias inteiras. Desta feita, o epicentro da tragédia calhou de ser São Sebastião (SP) e municípios lindeiros.

Há mais que repetição na pluviosidade e na incúria. Em alguns locais caíram mais de 600 mm em poucas horas, mais de 600 litros por metro quadrado, acima da média de todo o mês de fevereiro.

Tamanho jorro se qualifica como o que meteorologistas e climatologistas chamam de eventos extremos. São paroxismos de precipitação, estiagem ou temperatura que desbordam até das amplitudes máximas sugeridas por curvas obtidas de médias históricas.

Fenômenos que ocorriam só em escalas de séculos se amiúdam em consequência das mudanças do clima ocasionadas pelo aquecimento da atmosfera. Enchentes, secas e incêndios florestais devastadores passam a eclodir em ritmo de décadas, quando não se tornam anuais.

Tudo está previsto há décadas, igualmente, por modelos computacionais de projeção do clima. Médias históricas se tornam de pouca valia para planejar obras de infraestrutura, como estradas, pontes e galerias pluviais, assim como sistemas de defesa civil e salvamento.

Conferências sobre crise do clima se sucedem desde 1992 sem que as nações acordem providências efetivas para mitigar o aquecimento global. Para contê-lo na margem de 1,5ºC, como se decidiu em 2015, seria necessário cortar emissões de carbono pela metade neste decênio e zerá-las até 2050.

A cada ano que passa, a janela de oportunidade se estreita. Governos brasileiros, como tantos outros, concentram políticas públicas na mitigação, ocupando-se quase só do desmatamento na Amazônia, nossa maior fonte de emissões, e mais recentemente no cerrado.

Claro está que é obrigação fazê-lo, em tudo ignorada pela administração de Jair Bolsonaro (PL). Já não basta. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recompôs a prioridade para o tema, mas só o enfrentará de modo consequente quando liderar um plano nacional de adaptação para a mudança incontornável do clima.

Instalar sirenes de alerta que funcionem a tempo é o mínimo; no médio e longo prazo, só uma política portentosa de habitação e saneamento básico defenderá os brasileiros pobres de hecatombes que retornam a cada verão.

editoriais@grupofolha.com

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