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Licença para gastar

Livrar presidente de processo por crime de responsabilidade incentiva despesa

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Fernando Haddad, ministro da Economia, em coletiva de imprensa após a entrega da nova regra fiscal ao Congresso - Ueslei Marcelino/Reuters

Se já havia grande dúvida sobre a capacidade do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de cumprir as metas de equilíbrio orçamentário anunciadas há três semanas, o envio do projeto da nova regra fiscal ao Congresso nesta terça (18) deu resposta ainda mais alarmante.

O texto indica que Lula simplesmente não se compromete com as metas —e quer desde já livrar-se de punições caso o saldo entre as receitas e despesas do Tesouro Nacional não atinja o resultado previsto.

É o que se nota no artigo que altera a Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2001, para estabelecer que o descumprimento dos objetivos traçados "não configura infração" à lei. Assim o mandatário escapa de consequências que, no limite, podem chegar a um processo por crime de responsabilidade.

Vale dizer: se a expansão dos gastos do governo petista resultar em um déficit superior ou um superávit inferior ao projetado, não há punições às autoridades.

O estímulo à imprudência é reforçado no projeto com o fim da obrigatoriedade de promover bloqueios preventivos de pagamentos caso se notem riscos para o cumprimento das metas —hoje, de acordo com a LRF, tais contingenciamentos são avaliados a cada dois meses, conforme as estimativas mais atualizadas da arrecadação.

Dispositivos desse calibre não estão no projeto por acaso. O governo percebe, por óbvio, que são remotas as chances de obter o prometido déficit zero já em 2024. Para isso será necessário um aumento exorbitante da carga tributária, já exagerada, ou uma contenção de despesas —que não se quer fazer.

O único impacto importante do descumprimento da meta será um aperto do limite para o crescimento anual do gasto acima da inflação, que cairia de 70% para 50% da expansão da receita.

Nem mesmo está claro, porém, com que tempestividade tal providência seria tomada, dado que o resultado de um determinado exercício só é conhecido no ano seguinte, quando já haverá um Orçamento aprovado e em execução. Se o descumprimento ocorrer no ano eleitoral de 2026, a conta fica para o próximo governo.

Sai de cena o teto de dispêndios inscrito na Constituição em 2016, já bastante avariado pela ofensiva eleitoreira de Jair Bolsonaro (PL). Propõe-se em seu lugar uma regra mais complicada, cheia de exceções e brechas para driblar as restrições orçamentárias.

Institui-se algum controle da despesa, o que, claro, é melhor do que nenhum. Entretanto o que importa é estancar a dívida pública, sem o que a economia ficará asfixiada. O Congresso precisa fazer exame rigoroso do projeto e zelar para que o governo se comprometa, de fato, com metas realistas e eficazes.

editoriais@grupofolha.com.br

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