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Pretensões cambiais

Lula contesta o poder do dólar numa semana em que o mercado sorriu para o país

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Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursa durante cerimônia de posse de Dilma Rousseff (PT) no Banco Brics, em Xangai (China) - Ricardo Stuckert/Handout via Reuters

De acordo com uma piada contada entre economistas, Deus inventou o câmbio para humilhá-los, ou ao menos para ensinar-lhes humildade —tamanha é a imprevisibilidade dos movimentos das moedas e tantos são os fracassos de governos em controlar as cotações.

Nesta semana, o câmbio sorriu para o Brasil, pela primeira vez no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A moeda nacional teve expressiva valorização, e a cotação do dólar ficou abaixo dos R$ 5, como não se via desde junho de 2022.

Como de hábito nessas ocasiões, motivos diversos foram aventados. Números da inflação no Brasil e nos EUA vieram abaixo dos esperados; a economia da China se recupera; haveria mais otimismo quanto à regra a ser proposta pelo governo para conter a dívida pública.

De mais certo e óbvio, pode-se dizer que aumentou a oferta de dólares, em boa parte graças a um avanço de exportações, e caiu a demanda pela divisa americana, provavelmente por uma menor apreensão de investidores. Como sempre em qualquer mercado, o apetite por ganhos e o medo de perdas guia os participantes.

A valorização da moeda nacional não é necessariamente boa ou má notícia. Economistas da corrente dita desenvolvimentista, muito influentes no PT, preferem o dólar mais caro, para incentivar exportações. Neste momento, a queda da cotação vem a calhar, por contribuir para o recuo da inflação.

Foi apenas coincidência que, numa semana favorável no mercado, Lula tenha contestado o poder do dólar durante sua viagem à China. O petista questionou por que os Brics, que incluem também Rússia, Índia e África do Sul, não podem fazer suas transações em outra moeda, própria do grupo.

Essa é uma ideia recorrente na esquerda e em outros meios antipáticos aos EUA. Poucas semanas atrás, os governos aliados de Brasil e Argentina especulavam sobre uma moeda em comum.

O câmbio deveria ensinar humildade também a políticos. Imagine-se a tarefa dantesca de unir os interesses brasileiros aos de países tão diferentes quanto a China ditatorial, a Rússia em guerra e a Argentina no caos econômico.

A aceitação de uma divisa depende não apenas das dimensões econômicas, mas também da confiabilidade do Estado emissor —a começar por seus compromissos em honrar dívidas e conter a inflação. Por aqui, nem mesmo a autonomia do Banco Central é tema pacífico.

editoriais@grupofolha.com.br

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