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João Paulo Pacifico

É mais justo que o rico pague mais impostos do que o pobre

Que ensinemos às próximas gerações como criar uma sociedade com compaixão

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João Paulo Pacifico

CEO do Grupo Gaia

Caro João Camargo, li seu artigo nesta Folha ("Ser rico não é pecado", 2/9). Não estou aqui para criminalizar os mais ricos, até porque eu estaria sendo hipócrita, mas venho de forma respeitosa trazer argumentos para que possamos refletir e avançarmos como sociedade.

Em um trecho do texto, você diz que seria difícil fiscalizar a tributação de grandes riquezas. Ao dar esse argumento, você supõe que super-ricos só cumprem as leis que são fortemente fiscalizadas. Nesse caso, temos dois problemas, criminal e de caráter.

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João Paulo Pacífico, CEO do Grupo Gaia, durante o lançamento do livro "Seja Líder como o Mundo Precisa" - Ronny Santos/Folhapress - Folhapress

Precisamos acabar de uma vez por todas com a máxima do "jeitinho brasileiro", também conhecida como "lei de Gérson". Tenho certeza de que nesse primeiro ponto você já está concordando comigo. E, caso não concorde, vale lembrar que, com a conectividade, o rastreamento de transações está cada vez mais fácil e, consequentemente, a fiscalização mais forte.

Você bem disse que o empresário corre muitos riscos. Sim, concordo, e sei bem como são os desafios... Afinal, fundei uma empresa e anos depois vendi com sucesso. Mas, sem trabalhadores, eu jamais teria sido "bem-sucedido". Não considero que o sucesso seja individual, mas coletivo.

Se meus negócios tivessem dado errado, eu teria perdido dinheiro. Mas algum conhecido poderia conseguir um emprego para mim. Ou eu poderia correr atrás de investidores para a minha próxima "boa ideia". É mais fácil apostarem em mim do que em uma pessoa da periferia, né?

Aliás, risco real quem tem é o trabalhador que mora na periferia, pega três horas de ônibus por dia e que, se perder o emprego, não conseguirá pagar o aluguel do próximo mês. Chega a ser triste pensar que a vida de algumas pessoas está em nossas mãos.

Este ano visitei uma comunidade dentro de uma grande cidade brasileira. As pessoas não têm água em casa. Fazem as necessidades em um saco e jogam no córrego. A dignidade passa longe.

Nós dois concordamos que essa situação é inaceitável. E que o risco delas é maior do que o nosso. Porque é risco de vida.

Lula assinou a medida provisória durante cerimônia no Palácio do Planalto, com presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) - Folhapress - Folhapress

Ficamos felizes ao ver que, no Brasil, o SUS funciona (e que pode melhorar). Que qualquer pessoa pode fazer um transplante de coração, independentemente da classe social. Queremos que todas as crianças tenham educação de qualidade e que nenhuma pessoa passe fome. Acho que nisso estamos 100% alinhados, correto?

Obviamente, concordamos que o Estado tem que ser eficiente e que nenhuma corrupção é aceitável.

Dito tudo isso, o Estado precisa de recursos. Seria mais justo que o pobre e a classe média paguem mais impostos proporcionais ou que as pessoas mais ricas tenham alíquotas maiores?

Estudo recente concluiu que, no Brasil, enfermeiras pagam mais imposto proporcionalmente do que quem ganha mais de R$ 2 milhões por ano. Devemos concordar que isso não é justo.

Justificar que os super-ricos irão tirar recursos do país é aceitar o fato de que as pessoas não se preocupam com a desgraça alheia. Que só pensam em si. Que há mais egoísmo do que compaixão. O que talvez, para muitos, até seja o caso. Mas precisamos mudar isso.

E se a pessoa acha melhor empreender em outro lugar, não vejo problema. Sobrará espaço para alguém ocupar por aqui.

Quando alguém, que não foi o seu caso, diz: "Se aumentarem os impostos eu saio do Brasil", soa-me como ameaça. Parece aquela criança que afirma "a bola é minha, se não for como eu quero, ninguém mais joga". Como se só tivesse uma bola no mundo.

Termino com um exemplo recente de Massachusetts. Eles criaram um tributo adicional de 4% para quem ganha mais de US$ 1 milhão por ano e usaram esse dinheiro para melhorar as refeições das escolas públicas.

Nenhum rico ficou pobre, e os pobres tiveram alimentos melhores. A sociedade ganhou. E ouso dizer que muitos ricos ficaram felizes de fazer a diferença na vida dessas crianças.

O Brasil é um dos países do mundo com menor tributo sobre herança. Algo que poderia ajudar um pouco nas contas públicas. Se topar, lutamos juntos por esse tema.

Resumindo: não queremos miséria, pobre sofre muito mais do que a gente e corre mais riscos. O Estado tem que ser eficiente. É mais justo que o rico pague mais impostos do que o pobre.

Termino com um desejo: que a gente ensine para as próximas gerações como criar uma sociedade com compaixão. E que esse ensinamento seja muito mais por nossas ações, do que pelas palavras dos nossos artigos.

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