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Walter Belik e José Graziano da Silva

Esforço redobrado no combate à fome

Brasil tem como mostrar ao mundo que é possível sair novamente do Mapa da Fome

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Walter Belik e José Graziano da Silva

Diretores do Instituto Fome Zero

Estamos no meio do caminho para o cumprimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas, conhecidos como Agenda 2030, firmada por 195 países reunidos na sede das Nações Unidas em 2015.

No caso do combate à fome, naquela ocasião, os líderes mundiais foram radicais e dobraram a aposta, firmando o compromisso de erradicar a fome e todas as formas de desnutrição. Nas cúpulas anteriores, a proposta era de reduzir pela metade a proporção de pessoas em estado de subnutrição e, depois, de forma mais modesta, reduzir pela metade o número de pessoas subnutridas em relação ao ano base de 1992.

Uma meta que nada tinha a dizer sobre a outra metade que ficava condenada a continuar na fome!

Integrantes da ONG Ação da Cidadania descarregam alimentos recebidos para a campanha Natal sem Fome, no Rio de Janeiro - Pilar Olivares - 16.dez.22/Reuters


A partir de 2015, diversos fatores contribuíram para o fracasso desses compromissos. Diferentemente do que supunha a declaração de 2015, que propugnava "uma parceria global revitalizada", surgiram novos conflitos armados e disputas comerciais que afastaram ainda mais os países de uma ação coordenada.

Mas, mais do que isso, o mundo viveu uma verdadeira convulsão, provocada pela pandemia da Covid-19, que jogou os países em desenvolvimento em uma crise ainda mais profunda. A partir dos relatórios anuais da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), dando conta de que o número de pessoas desnutridas estaria aumentando ao invés de diminuir, o secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, convocou em 2021 uma Cúpula dos Sistemas Alimentares e reconheceu que o mundo estava totalmente fora do caminho para atingir os objetivos anteriormente acordados.

A abertura das sessões da Assembleia-Geral nesse ano trouxe novos desafios para a segurança alimentar global. Nos discursos dos chefes de Estado, agregou-se à erradicação da pobreza extrema a questão da desigualdade social como prioridade. A questão climática avançou também algumas casas com o reconhecimento de que já ultrapassamos a meta de aquecimento global firmada em Paris, igualmente em 2015. Há um reconhecimento geral de que tanto a desigualdade de renda quanto a mudança climática estão impactando diretamente o acesso ao alimento.

Embora o nosso planeta produza quantidade suficiente de comida para alimentar toda a sua população, o acesso é precário. Não só um contingente de aproximadamente 670 milhões vive na extrema pobreza como, pela primeira vez em 30 anos, a riqueza extrema e a pobreza extrema cresceram simultaneamente, segundo relatório da Oxfam.

O 1% mais rico do mundo já acumula 2/3 da riqueza produzida desde 2020. Essa situação de pobreza e desigualdade interfere diretamente na quantidade e qualidade dos alimentos consumidos, induzindo uma dieta calórica vazia que, por sua vez, favorece o sobrepeso e a obesidade.

Os desastres e a emergência climática são hoje os principais focos da ajuda humanitária global e têm implicações diretas nos preços dos alimentos. Milhões de pessoas foram deslocadas de suas áreas em função de conflitos e eventos extremos e a ajuda humanitária internacional não foi suficiente para alimentar todos os desabrigados. Mais grave ainda, nos 15 países mais vulneráveis às questões do clima, o investimento para a mitigação desse problema foi de apenas 6% de toda a ajuda internacional para a adaptação, segundo o Global Humanitarian Overview da ONU, de 2022.

Os preços dos alimentos, passada a crise aguda de abastecimento provocada pela Guerra na Ucrânia, permanecem ainda em patamares elevados.

Neste dia 16 de outubro celebra-se o Dia Mundial da Alimentação, pois, em 1945, nesse dia —antes mesmo do final da 2ª Guerra—, foi criada a FAO, para conectar nutrição e produção. O seu mandato formulou, na época, uma visão para um sistema alimentar global que refletia o otimismo geral do pós-Guerra de que os problemas globais poderiam ser resolvidos através da cooperação internacional entre os países.

No meio do caminho para 2030 nos encontramos em uma encruzilhada. A saída do Brasil do Mapa da Fome, em 2013, maior país da América Latina, com seus diversos programas do Fome Zero, apontou o caminho.

As dificuldades são enormes, mas o Brasil ainda tem como mostrar para o resto do mundo que é possível sair novamente do Mapa da Fome.

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