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Antonio Carlos Souza de Carvalho

O sindicalismo e a democracia

Garantir o financiamento da estrutura sindical é garantir a democracia

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Antonio Carlos Souza de Carvalho

Advogado e cientista político, especializado em economia do trabalho e sindicalismo

Os sindicatos são uma instituição da democracia, e assim devem ser tratados. Está em desenvolvimento uma proposta de criação de contribuições a serem aprovadas em assembleias dos trabalhadores de cada categoria, no contexto da aprovação de seus acordos coletivos e isso não é a retomada do imposto sindical.

O imposto sindical, eliminado pela reforma trabalhista, consistia em um desconto obrigatório feito em folha de pagamento, em valor arbitrado pela lei, repassado automaticamente para as entidades sindicais. O mecanismo foi uma criação nada democrática da Era Vargas que tinha como objetivo controlar o financiamento dos sindicatos para que a própria estrutura de representação dos trabalhadores fosse controlada pelo Estado.

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Ato de centrais sindicais contra juros altos, em São Paulo - Danilo Verpa - 21.mar.23/Folhapress

Ao longo dos anos, a imposição desse modelo de financiamento foi responsável por sustentar sindicatos com baixo grau de representatividade e transparência com a efetivação desses recursos que acabaram por contribuir com um abalo considerável na legitimidade do sindicalismo. No entanto, esses mesmos anos assistiram um aprofundamento de crises políticas que abalaram a democracia em diversos países do mundo.

Foi nessa conjuntura que a reforma trabalhista aboliu o imposto sindical. No entanto, em consonância com a debilidade da democracia brasileira, a reforma não criou uma alternativa legal para o financiamento dos sindicatos. Isso aprofundou a crise da estrutura sindical, acompanhada de uma queda substancial nas taxas de sindicalização e de mecanismos até então eficientes na proteção dos trabalhadores. O que já não era muito bom, piorou.

Acontece que uma democracia precisa garantir voz e participação ao conjunto da população com força suficiente para fazer frente ao poder financeiro ou político. É na proteção da coletividade que se garante o jogo da democracia. Os sindicatos servem para criar aos trabalhadores um espaço legítimo e democrático para protegê-los, possibilitando algum equilíbrio na relação de trabalho. Sem uma garantia legal de financiamento, não há sindicalismo viável, e sem um sindicalismo viável, o trabalhador fica desprotegido.

Garantir um modelo de financiamento da estrutura sindical é garantir a democracia. A ideia discutida hoje pelo governo já é aplicada por diversas negociações coletivas no Brasil, como na convenção coletiva da categoria bancária, de abrangência nacional, com a participação de todos os bancos, tanto públicos quanto privados.

Isso significa dizer que o próprio sistema financeiro reconhece a relevância de uma estrutura sindical que funcione e que dê legitimidade ao interesse da classe trabalhadora. E isso acontece há mais de trinta anos. O modelo ora proposto não é exatamente uma inovação, mas é democrático.

O mecanismo da contribuição sindical autorizada coletivamente pelos trabalhadores quando aprovam o reajuste de salário e os direitos negociados pode ser um avanço da democracia e a correção de um erro grave cometido pela reforma trabalhista. Reunida, a categoria aprova um acordo e, nessa aprovação, decide pelo formato de financiamento do sindicato.

Mas essa iniciativa, por si só, não garante que os sindicatos cumprirão com o seu dever de representar o interesse dos trabalhadores. Devem ser conferidas as condições necessárias para que se tenha transparência, contraditório, e representatividade de fato nas entidades sindicais. Inclusive para que a contribuição sindical seja instituída. Inclusive para que o trabalhador tenha o direito de escolher o sindicato que o representará. Que seja possível disputar e concorrer às eleições sindicais, ou buscar um outro sindicato que garanta maior legitimidade e representatividade para os trabalhadores. Sindicato não é clube de amigos, não é partido político, não é máfia. Sindicato é uma instituição da democracia, e assim deve ser tratado.

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