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Graziele Grilo

Tabagismo atinge desproporcionalmente os diferentes estratos sociais

Desigualdade influencia até a exposição à publicidade do tabaco

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Todos os indivíduos deveriam ter a mesma oportunidade de alcançar o bem-estar. No entanto, as barreiras à saúde vão além das escolhas pessoais e podem ser determinadas por fatores como desigualdades socioeconômicas e falta de acesso a serviços públicos.

O tabagismo, principal causa de morte evitável no mundo, também atinge desproporcionalmente os diferentes estratos da sociedade. E até a exposição à publicidade do tabaco é influenciada pela desigualdade.

Entre 2006 e 2019, a prevalência do tabagismo entre adultos teve queda de 2,9 pontos percentuais no Brasil. Entretanto, os mesmos dados do IBGE que sugerem uma melhora geral também demonstram como isso se dá nos diferentes grupos.

A prevalência de tabagismo nas populações negra, parda e branca do Brasil é de 13,7%, 13,5% e 11,8%, respectivamente. Quando cruzamos os dados com o nível de escolaridade e renda, temos um quadro ainda mais desigual: a proporção dos que usam produtos do tabaco é duas vezes maior entre aqueles com escolaridade até o ensino fundamental em comparação aos que concluíram o superior.

Outras pesquisas mostram que o tabagismo afeta desproporcionalmente outras minorias, como pessoas LGBTQIA+, que são mais propensas a usar produtos de tabaco por dificuldade de acesso a serviços de saúde, desinformação e discriminação.

A ilustração de Martin Kovensky mostra homem usando regata listrada (listras horizontais vermelhas e pretas) com três cigarros na boca e muita fumaça escura ao seu redor. De frente para ele, um homem calvo, vestindo terno e com óculos, fuma um charuto e solta pequenos anéis de fumaça clara
Ilustração de Martin Kovensky para artigo de Graziele Grilo de 7 de outubro de 2023 - Martin Kovensky/Folhapress

Há outro fator que os dados por si só não consideram: o impacto desigual das estratégias de marketing da indústria do tabaco. Um estudo do Instituto para o Controle Global do Tabaco (IGTC), da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health, apontou que a exposição à publicidade de cigarros eletrônicos difere com base em raça/etnia, idade, educação, renda, sexo, identidade de gênero, orientação sexual e demografia (seja a nível individual ou comunitário).

Embora a publicidade desses produtos seja proibida no Brasil, sua promoção ainda ocorre por mensagens em redes sociais direcionadas a grupos específicos ou com campanhas de "responsabilidade social corporativa". Em 2019, um grande produtor de cigarros patrocinou a 27ª Parada do Orgulho LGBTQIA+ em São Paulo e expôs 3 milhões de pessoas ao marketing do tabaco. A mesma empresa foi multada em 2014 por uma campanha publicitária direcionada a jovens de 18 a 24 anos.

Raça, orientação sexual, escolaridade e renda estão entre os fatores individuais mais associados à prevalência do tabagismo no Brasil. As condições de moradia e de trabalho, os obstáculos que impedem o acesso aos serviços de saúde mental e pública e a exclusão social também podem tornar os brasileiros mais suscetíveis ao consumo de tabaco e aumentar a probabilidade de exposição tanto ao marketing da indústria do tabaco quanto ao fumo passivo.

Enfrentar a epidemia do tabaco – responsável por quase 190 mil mortes no Brasil por ano – é um bom ponto de partida para enfrentar disparidades relacionadas ao seu uso. Felizmente, a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT) da OMS, da qual o Brasil é signatário, oferece medidas para monitorar o consumo de tabaco e aumentar os impostos sobre seus produtos, além de fornecer informações valiosas para ajudar a parar de fumar e programas de apoio voltados às populações mais afetadas.

O Brasil já é o 18º colocado entre 180 países em termos de implementação da CQCT. Embora continue a executar políticas de controle do tabaco no mais alto nível, é importante que o país considere intervenções adicionais que também afetem os grupos marginalizados. Entre elas, destacam-se proibições de patrocínio, de responsabilidade social corporativa e de exibição de produtos em pontos de venda, além de padronizar as embalagens em formatos sem atrativos de marketing e tornar os produtos de tabaco menos acessíveis. Uma abordagem baseada na equidade para a formulação de políticas sobre o tabaco pode ajudar o Brasil a superar as disparidades estruturais e alcançar um estado de saúde e bem-estar que seja melhor para todos.

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