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Bráulio Borges

A economia deve melhorar em 2024? NÃO

São muitos ventos contrários e poucos a favor

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Bráulio Borges

Mestre em teoria econômica pela FEA-USP, é economista-sênior da LCA Consultores desde 2004 e pesquisador-associado do FGV IBRE desde 2015

Depois de crescer cerca de 3% ao ano em 2022 e 2023, as projeções de consenso mais recentes indicam que o PIB brasileiro deverá avançar bem menos em 2024, em torno de 1,5% (ritmo abaixo até mesmo do +1,7% ao ano observado em 2017-23).

Alguém poderia questionar essa previsão de desaceleração expressiva apontando que, desde meados de 2020, as projeções dos analistas subestimaram, e bastante, o desempenho efetivo da economia brasileira. No começo de 2023, por exemplo, esperava-se alta entre 0,5% e 1,0%.

Campo de soja no norte do Paraná - Mauro Zafalon/Folhapress

Contudo, uma análise cuidadosa do passado recente aponta que essas surpresas sistemáticas de 2020 a 2023 estiveram associadas a fatores que não tendem a se repetir em 2024.

Um deles diz respeito à postura da política fiscal brasileira, do governo federal e dos governos regionais: ela foi altamente expansionista no acumulado de 2020-22 (efeitos defasados do pacote de suporte fiscal expressivo adotado em 2020; medidas federais adotadas às vésperas das eleições de 2022; e o forte aumento do investimento dos governos regionais em 2022), assim como em 2023 (reflexo da PEC da Transição aprovada em dezembro de 2022). Já em 2024, haverá alguma consolidação fiscal, mesmo que a meta de zerar o déficit primário do governo federal não seja cumprida: o resultado primário do setor público consolidado deverá passar de algo próximo de -2% do PIB neste ano para algo entre -0,5% e -1,0% em 2024.

Um outro elemento está associado ao fluxo de renda primária gerada pelos setores produtores de commodities, bem como aos seus efeitos indiretos sobre o restante da economia (transbordamentos). Houve uma alta expressiva dessa renda a partir de meados de 2020: ela passou de cerca de R$ 650 bilhões por ano em 2017-19 para pouco mais de R$ 1 trilhão por ano em 2020-23 (somatório dos valores adicionados nominais da agropecuária e indústria extrativa mineral, a preços do terceiro trimestre de 2023 pelo deflator do PIB total). Eu estimo que, não fosse esse salto, o PIB brasileiro teria crescido apenas 0,9% a.a. em 2020-23, bem abaixo do +1,9% a.a. efetivamente observado.

Contudo, 2024 será um ano de queda da renda real gerada pelas commodities, sobretudo porque o PIB agropecuário brasileiro deverá passar de uma alta em volume de 18% em 2023 para algo entre -2% e -3% em 2024 (já que as estimativas do LSPA/IBGE e da Conab apontam queda na safra de grãos que será colhida no ano que vem).

Para finalizar, não podemos ignorar o que irá acontecer em nosso parceiro de Mercosul e principal destino de nossas exportações de produtos manufaturados, a Argentina. A terapia de choque proposta pelo novo governo para debelar o quadro de hiperinflação que se avizinha deverá gerar um tombo de 4% a 5% do consumo das famílias argentinas em 2024, após um pequeno crescimento em 2023.

Há como contrabalançar, ao menos parcialmente, todos esses ventos contrários em termos da política econômica doméstica? Sim, sobretudo no que toca à política monetária, já que não parece ser recomendável relaxar a meta de zerar o déficit fiscal (o Brasil precisa de um superávit primário de pelo menos 1,0% do PIB todos os anos para estabilizar a relação dívida/PIB).

A Selic, que deverá fechar 2023 em 11,75% a.a., ainda está em terreno bastante restritivo, bem acima das estimativas atuais de juro neutro para o Brasil (entre 8,5% e 9,0% a.a.). Com uma inflação esperada em 2025 relativamente próxima do centro da meta, parece existir espaço para que a Selic chegue mais rapidamente em um nível inferior a 10% a.a.

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