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Carlos Marun

Há fortes evidências de genocídio na reação israelense

Antissemitas são Netanyahu e os que apoiam esses massacres que sujam a imagem do povo judeu

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Carlos Marun

Advogado e engenheiro, foi ministro-chefe da Secretaria de Governo (2017–2019)

São cada vez mais fortes as evidências de prática de genocídio na reação israelense aos atentados terroristas praticados pelo Hamas em 7 de outubro.

No momento do bárbaro ataque se estabeleceu uma justa comoção mundial em relação a Israel e em repúdio àqueles atentados. A grande maioria da humanidade apoiou imediatamente uma reação dura de Israel em relação ao Hamas.

Porém, como dizem no Rio Grande do Sul, Netanyahu "virou o fio". Na ânsia de permanecer no governo e fora da cadeia, Bibi já se havia aliado a uma ultradireita ainda mais radical do que ele. E o resultado é que tanto Gaza quanto Israel passaram a ser governados por fanáticos religiosos perigosíssimos. E a prática de genocídio começou a acontecer.

Vamos à definição do crime de genocídio. Socorro-me do estabelecido tanto na Convenção para a Prevenção do Crime de Genocídio, de 1948, quanto no que está posto no Estatuto de Roma, do Tribunal Penal Internacional, de 1988.

As definições são idênticas:
Art ll - Na presente Convenção entende-se por "genocídio" qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, tal como:
A) Assassinato de membros do grupo;
B) Dano grave a integridade física ou mental dos integrantes do grupo;
C) Submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial;
D) Medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;
E) Transferência forçada de menores a outro grupo.

Li artigo do doutor Cláudio Lotemberg, pessoa por quem tenho consideração pessoal, como a tenho por todos os muitos judeus com os quais convivo, no qual ele afirma que na região quem é genocida é o Hamas. E ele não deixa de ter razão. Realmente, o Hamas quer a destruição de Israel, e isso se constituiria em um genocídio. Porém Israel é hoje comandado pelo velho carrasco e sabotador da paz Netanyahu. Então crescem as evidências de prática genocida por Israel, com um agravante: o Hamas até pode desejar acabar com Israel, mas não pode fazê-lo. Já Israel pode acabar com os palestinos, e são cada vez mais fortes as evidências de que está tentando fazer isso.

Netanyahu conquistou o poder em função do assassinato com um tiro pelas costas de Itzak Rabin. E chegou com o objetivo claro de acabar com o processo de paz que se robustecia. O assassino era simpatizante do seu partido e ele venceu Shimon Pérez, um ganhador do Prêmio Nobel da Paz, em um momento em que a maioria do eleitorado israelense referendou aquele crime bárbaro.

Segue governando há cerca de 30 anos, com algumas interrupções é verdade, mas sempre lutando contra a paz. É dele a teoria de que Israel não precisa de paz, mas de segurança. O resultado é que praticamente acabou com as chances de pacificação e levou Israel ao maior fracasso de sua história em termos militares.

Diante dessa realidade, Netanyahu está querendo provar que ainda é a pessoa certa para governar Israel, neste momento em que a sua população está sedenta de vingança e pensa que precisa de alguém suficiente mau para praticá-la. E, com esse objetivo, começou no mesmo dia dos ataques a esparramar pelas ruínas de Gaza sangue de palestinos que nada tinham a ver com o Hamas.

Palestinos feridos em Khan Younis, sul da Faixa de Gaza - Yasser Qudih/Reuters

As evidências de genocídio são muitas. Vamos aos fatos.

Israel já matou mais de 20 mil civis palestinos desarmados, e continua os matando, a maioria mulheres e crianças, lançando sobre eles centenas de bombas de uma tonelada, sendo que dessas mais de 50% não tinham alvo definido. Eram tipo "punhalada de louco", ou seja, "onde pegar pegou". Além disso, um ministro de Israel já declarou que a ajuda humanitária de que Gaza precisa são essas bombas e outro disse que uma bomba atômica pode ser utilizada na região. Na sequência, as Forças Armadas de Israel mataram três reféns que fugiram e se aproximaram portando uma bandeira branca, em uma evidência que a ordem é "atirar para matar em tudo o que se mexer". Outra evidência de genocídio são os ataques preferenciais a hospitais. Isso diminui a chance de sobrevivência daqueles que saem "só" feridos dos bombardeios. Por fim, a absoluta falta de cuidado com o número de crianças mortas também evidencia a prática de genocídio, pois revela o objetivo de atingir o futuro do povo palestino.

Some-se a isso o fato de a história já ter provado que o genocida é um arrogante. E arrogância não falta no Governo de Israel, que faz questão de afirmar que "não está nem aí" para o que o mundo pensa a respeito dos massacres que promove. O próprio Netanyahu ameaçou transformar Beirute em uma Gaza. Sim, a nossa Beirute, que tantos brasileiros descendentes de libaneses como eu amamos.

Palestinos são enterrados em cova coletiva em Rafah, sul da Faixa de Gaza - Mahmud Hams/AFP

O povo judeu foi vítima de um processo genocida na Alemanha nazista. Foi a partir dali, inclusive, que surgiu o termo "genocídio". Isso gerou justa comoção mundial, e a própria existência de Israel foi sua consequência. Hoje, em gesto de extrema arrogância, o Governo de Israel age como se estivesse "pouco se lixando" para essa comoção mundial da qual tanto já se serviu. Porém o mundo não pode permanecer em silêncio diante da utilização por Israel contra os palestinos de práticas da qual seu povo já foi vítima.

O mundo deve exigir o fim desse genocídio. E a partir daí e de um reconhecimento de que vidas palestinas valem tanto quanto vidas israelenses e de que os palestinos também têm direito a um Estado como os israelenses já conquistaram, se tornaria possível a construção de um processo de paz.

Não dá para negociar com o Hamas? Por quê? Porque são fanáticos e terroristas? Ok! Então que seja substituído também o Governo de Israel, tão fanático e terrorista quanto o Hamas. Que um novo governo israelense seja formado por gente de bem, que existe em grande número em Israel, e com coragem de lutar pela paz. E que esse novo governo negocie com a Autoridade Nacional Palestina uma paz que tenha condições de se sustentar.

Por fim, garanto uma coisa: querer um cessar-fogo e defender a solução de dois Estados não é ser antissemita. Antissemitas são Netanyahu e os que apoiam esses massacres, pois nada denigre mais a imagem do povo judeu do que essas imagens de gente destroçada por bombardeios que percorrem diariamente os noticiários pelo mundo afora.

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