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Paulo Sérgio Pinheiro

Israel e o genocídio dos palestinos em Gaza

Espera-se que o Brasil apoie a iniciativa da África do Sul

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Paulo Sérgio Pinheiro

Professor titular de ciência política da USP, foi coordenador da Comissão Nacional da Verdade (2013) e ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos (2001-02, governo FHC)

O governo da África do Sul apresentou, em 29 de dezembro passado, uma petição à Corte Internacional de Justiça da ONU, em Haia, órgão com 15 juízes que julga disputas entre Estados. A petição acusa o Estado de Israel de descumprir a convenção de prevenção e punição do genocídio de 1951. Essa petição conta até agora com o apoio de Malásia, Turquia, Jordânia e dos 57 países da Organização de Cooperação Islâmica.

Como o Brasil, entre inúmeros outros governos, qualificou a situação dos palestinos em Gaza de genocídio, é de se esperar que apoiemos a gestão da África do Sul. As primeiras audiências terão lugar na corte nas manhãs de 11 e 12 de janeiro.

A petição, com 80 páginas, é uma descrição rigorosa e detalhada do genocídio em Gaza. Os fatos invocados pela África do Sul se situam num contexto de apartheid, expulsão, limpeza étnica, anexação, ocupação, discriminação e a negação contínua do direito do povo palestino à autodeterminação.

Prédio destruído em Jabalia, no norte da Faixa de Gaza - Mohammed Ali/Xinhua

Em particular depois de 7 de outubro, Israel não conseguiu prevenir o genocídio e falhou em impedir o incitamento direto e público ao genocídio por parte de representantes de Israel ao mais alto nível político.

Mais grave ainda, Israel arrisca-se a se envolver ainda mais em atos genocidas contra o povo palestino em Gaza. Aqueles atos incluem matá-los, causar-lhes graves danos mentais e corporais e infligir-lhes deliberadamente condições de vida calculadas para provocar a sua destruição física como grupo nacional e étnico.

Essa intenção deve ser inferida da natureza e condução da operação militar de Israel em Gaza, considerando-se a falha em fornecer ou garantir alimentos essenciais, água, remédios, combustível, abrigo e outros serviços humanitários de assistência ao povo palestiniano sitiado e bloqueado, à beira da fome.

Fica também claro esse intuito pela natureza, âmbito e extensão dos ataques militares de Israel a Gaza, com um bombardeio contínuo durante mais de 11 semanas em uma das regiões mais densamente povoadas do mundo, forçando a evacuação de 1,9 milhão de pessoas (85% da população de Gaza) de suas casas. São deslocadas para áreas cada vez mais exíguas, sem abrigo adequado, onde continuam a ser bombardeadas, mortas e feridas. Israel já matou mais de 21.110 palestinos, incluindo mais de 7.729 crianças.

Israel devastou vastas áreas de Gaza, incluindo bairros inteiros, danificou ou destruiu mais de 355 mil casas palestinas, terras agrícolas, padarias, escolas, universidades, empresas, locais de culto, cemitérios, sítios culturais e arqueológicos, serviços municipais e instalações de água e saneamento e redes de eletricidade. E prossegue um ataque implacável ao sistema médico e de saúde palestino. Israel reduziu e continua a reduzir Gaza a escombros, matando, ferindo e destruindo a sua população e criando condições de vida calculadas para a sua destruição física como grupo nacional.

A África do Sul, em consequência desses fatos, pede àquela corte que indique medidas provisórias para "proteger contra danos adicionais, graves e irreparáveis os direitos do povo palestino sob a Convenção do Genocídio". Como a petição não pede uma decisão definitiva sobre o mérito das acusações a Israel, se levarmos em conta julgamentos recentes na corte, medidas provisórias de proteção dos palestinos em Gaza poderão ser emitidas em semanas.

Caso essas medidas provisórias determinem um cessar-fogo das operações militares e Israel não as cumpra, os danos à reputação internacional do país serão irreparáveis. Talvez por isso mesmo Israel, ao contrário do desprezo e desrespeito sistemático às decisões de organismos internacionais e da ONU, decidiu comparecer a Haia para se defender.

É lamentável e patético que o sistema judicial paulista e a Polícia Federal aceitem ser instrumentalizados para calar o jornalista Breno Altman. As entidades por trás dessa sonsice querem enfiar goela adentro da democracia brasileira o embuste de que criticar o Estado de Israel é antissemitismo. Total solidariedade a Breno Altman.

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