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Saída de presos tem objetivo meritório; regra não deve ser debatida sob emoção

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Presos deixam penitenciária em Campinas (SP) para saída temporária - Marcelo Soubhia - 23.dez.95/Folhapress

É trágica a morte do policial militar mineiro Roger Dias da Cunha, no dia 7 de janeiro, após ser baleado durante perseguição a um presidiário foragido do sistema. O criminoso havia sido beneficiado com a saída temporária, mas não retornou na data prevista.

A funesta ocorrência estimulou senadores adeptos da abordagem linha dura em segurança para agilizarem a aprovação de um projeto de lei, já votado na Câmara, que põe fim às saídas temporárias.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse ser favorável ao debate dessa e de outras propostas que tornam mais rígidas as regras do sistema penal.

Parlamentares são eleitos para, entre outras funções, criar e aperfeiçoar leis. Porém devem fazê-lo com temperança, baseados em racionalidade e evidência científica. Legislar ao sabor das emoções não costuma render bons resultados.

Institutos penais como saída temporária, a popular "saidinha", livramento condicional, comutação, indulto e a progressão de regime existem não por bondade do legislador, mas porque constituem incentivos que visam à ressocialização do preso e a tornar os presídios manejáveis.

Eliminar partes desse sistema, além de ferir princípios humanitários, tende a produzir efeitos indesejáveis não imediatamente óbvios.

No Brasil, as organizações criminosas costumam recrutar sua mão de obra entre presos recém-ingressos nas penitenciárias. Eles aderem às facções em troca de proteção, para sobreviver no ambiente carcerário hostil. Quanto mais lotados os presídios, isto é, quanto piores forem as condições de vida, mais vantajosa será a barganha.

Obviamente, é preferível testar antes o comportamento dos presos em saídas temporárias a soltá-los em bases mais definitivas. E esse, apesar de casos trágicos como o do sargento Cunha, é uma mecanismo do sistema que funciona.

Levantamento feito pela Folha aponta que 56,9 mil presos tiveram direito ao benefício no último Natal em em 17 estados e no Distrito Federal. Desse total, 54,2 mil, ou 95,2%, voltaram ao sistema. Há espaço para aperfeiçoamentos dos critérios, sem dúvida, mas estamos longe de um descalabro.

Algo a evitar é a tendência de alterar leis de modo açodado e reativo, como resposta a crimes que chocam a opinião pública.

De fato, o sistema penal não pode ignorar por completo sentimentos e valores da sociedade. Mas daí não se segue que a legislação deva tornar-se mera caixa de ressonância desses afetos. Se o fizer, produzirá vingança e não justiça.

editoriais@grupofolha.com.br

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