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Haidar Eid

Além das palavras: é hora de frear o genocídio

Lula deve desistir já do acordo militar com Israel

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Haidar Eid

Professor associado de literatura pós-colonial e pós-moderna na Universidade al-Aqsa, em Gaza

Como palestino que suportou meses de genocídio na Faixa de Gaza, agradeço ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva por suas palavras durante a Cúpula da União Africana sobre os crimes horrendos cometidos por Israel contra o meu povo.

Elas mal arranharam a superfície desse genocídio, cuja brutalidade não tem precedentes na história recente. Mas essas palavras também trouxeram esperança necessária aos palestinos. Como cidadão sul-africano, aplaudo o fato de Lula ter confirmado seu firme apoio à iniciativa da África do Sul perante a Corte Internacional de Justiça (CIJ), que em 26 de janeiro emitiu ordem vinculante para que Israel evitasse e cessasse todas as ações genocidas.

No entanto, palavras condenatórias sem consequências práticas contra Israel não têm efeito sobre suas políticas. Desde a decisão da CIJ, Israel assassinou 2.798 palestinos, elevando o número de mortos para 29.252, e lançou um ataque maciço a Rafah, que havia sido designada como a chamada área "segura" e para onde mais de 1,3 milhão de palestinos fugiram. O objetivo do ataque é cumprir a política declarada de Israel de limpar etnicamente a Faixa de Gaza. Cerca de 75% da infraestrutura e das residências estão em escombros, e a fome é generalizada. Na Cisjordânia, as forças israelenses mataram mais de cem crianças nos últimos quatro meses. Israel continua a desfrutar de uma impunidade férrea proporcionada por seus aliados ocidentais.

A decisão da CIJ também vincula outros países, obrigando-os a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para contribuir com sua implementação. No Japão, a maior empresa militar de Israel, a Elbit Systems, perdeu seus acordos de cooperação, e a Bélgica, a Itália e a Espanha anunciaram que suspenderam todas as exportações militares.

Uma medida básica de sanção deveria ser a denúncia dos acordos militares e de segurança pública que o ex-presidente Jair Bolsonaro assinou com o Estado de Israel. Esses acordos preveem cooperação, treinamento conjunto e apoio logístico para as mesmas Forças Armadas que estão cometendo genocídio em Gaza e impondo o apartheid contra o povo palestino. A continuidade desses acordos pode levar o Brasil a violar suas obrigações de acordo com a decisão da corte internacional.

Além dos apelos da Palestina, movimentos brasileiros como MTST, CUT, Apib, MNU, movimentos de favela, bem como autoridades de segurança pública e mais de 60 parlamentares, pediram a denúncia desses acordos.

O presidente do Brasil deveria enfatizar que, globalmente, é Israel que deve ser "persona non grata" e que a cooperação com um regime genocida de apartheid é inaceitável. Se não for agora, quando será o melhor momento para o presidente denunciar esses acordos militares?

O ex-presidente Jair Bolsonaro e o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, em encontro em 2018, no Rio de Janeiro - Leo Correa/AFP - AFP

É hora de os países que têm feito declarações comprometidas com os direitos humanos e com o direito internacional tomarem medidas concretas para sancionar o Estado de Israel e seus líderes a fim de interromper o genocídio agora e desmantelar o apartheid.

A impunidade desfrutada pelo regime israelense durante décadas permitiu que ele agisse à margem da lei internacional. Se Israel não enfrentar as consequências de seus crimes, o direito e as instituições internacionais serão enterrados nos escombros de Gaza. E quem pagará o preço desse mundo será o Sul Global.

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