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O que a Folha pensa

Nunes precisa explicar obras sem licitação

Reportagens da Folha e do UOL mostram alto gasto em ações emergenciais contra cheias, em detrimento de obras estruturais

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Ricardo Nunes (MDB), prefeito de São Paulo (SP) - Zanone Fraissat/Folhapress

Algo estranho acontece na cidade de São Paulo. Obras emergenciais, realizadas pela gestão de Ricardo Nunes (MDB) com o objetivo de enfrentar enchentes, têm sido responsáveis por alagamentos que antes não existiam, segundo moradores da capital paulista ouvidos pela reportagem da Folha.

Isso não é tudo. De setembro de 2021 a dezembro de 2023, a mesma prefeitura contratou 140 obras emergenciais desse tipo, destinadas à contenção de margens de córregos. Custaram aos cofres públicos nada menos que R$ 2,2 bilhões, o equivalente a dois terços de toda a verba empenhada no período em iniciativas de combate às cheias.

Como se sabe, ações que tenham o carimbo da urgência estão dispensadas de passar por licitação. Faz sentido que seja assim: há momentos em que o poder público precisa dar uma resposta tão célere a algum infortúnio que não há tempo de garantir a devida concorrência no processo de contratação.

Nenhum paulistano, por sua vez, desconhece as situações de calamidade que as chuvas provocam na metrópole de uma hora para a outra —de modo que pode parecer natural o recurso às obras emergenciais para lidar com essas intempéries, mais frequentes nos primeiros meses do ano.

Há, contudo, sinais estranhos abaixo da superfície. Por exemplo, os R$ 2,2 bilhões gastos pela gestão Nunes seriam suficientes para concluir ao menos 15 obras do Plano Diretor de Drenagem, mas só 3 foram entregues até o fim de 2023.

Ainda que a prefeitura argumente que um tipo de intervenção não compete com o outro, o fato é que as ações sem licitação consumiram muito mais dinheiro público do que as iniciativas estruturais —as quais mereceram R$ 65 milhões.

E isso em uma gestão que, sem marca própria, destaca-se pelo recapeamento e, sobretudo, pela explosão de despesas livres de processo licitatório. Auditoria do Tribunal de Contas do Município mostrou que, de 2017 para 2022, o salto foi de 10.400%, uma enormidade carente de explicação.

Segundo reportagem do UOL, pelo menos 223 de 307 contratos emergenciais sem licitação tocados pela gestão Nunes têm indícios de combinação de preços entre empresas concorrentes.

Além disso, especialistas afirmam que as intervenções pontuais, ainda que não se prestem a desvios de recursos, são pouco recomendadas para o combate de enchentes, porque costumam ter prazo de validade curto e tendem a agravar o problema rio abaixo.

É urgente que se proceda a uma investigação séria desse caso —e Nunes deveria ser o primeiro a desejá-la, para ter a oportunidade de se defender de possíveis suspeitas de corrupção ou de incompetência.

editoriais@grupofolha.com.br

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