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O que a Folha pensa Venezuela

Estado imaginário, ditador de verdade

Maduro instiga fantasia de anexar território da Guiana com objetivo de facilitar a sua agenda liberticida na Venezuela

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Nicolás Maduro, ditador da Venezuela, anuncia lei que cria a Guiana Essequiba - Zurimar Campos/Presidência da Venezuela via AFP

Na caixa de ferramentas dos autocratas preocupados com a sua sustentação no poder consta a instigação de conflitos com países estrangeiros. Por meio da patriotada, o regime cria um pretexto para inibir a oposição doméstica em nome da mobilização das energias nacionais contra um inimigo externo.

Nicolás Maduro não inova na forma, portanto, ao promover a celeuma em torno do território do Essequibo, da vizinha Guiana. Já no conteúdo o ditador venezuelano deixa a sua contribuição pessoal para a coleção universal das barbaridades praticadas pelo despotismo em suas disputas de fronteira.

Na quinta-feira (4), o sucessor de Hugo Chávez promulgou uma lei que cria o estado venezuelano da Guiana Essequiba, expropriando em um golpe de caneta a Guiana de dois terços de seu território. Tudo não passa de um exercício de ficção aplicado à geopolítica.

Tumeremo, a "capital" da unidade federativa parida pela imaginação chavista, fica na região de Bolívar, dentro da Venezuela. As decisões administrativas porventura tomadas pelos governantes do estado de fancaria não encontrarão quem as execute dentro do território soberano da Guiana.

Tanta criatividade não se confunde com ingenuidade ou loucura. O ditador manipula o sentimento da população, que majoritariamente rejeita o traçado fronteiriço definido em 1899, tendo submetido o tema a plebiscito em dezembro.

A descoberta recente de portentosas reservas petrolíferas na costa do Essequibo aguçou a cobiça retórica do regime chavista sobre a região, embora a hipótese da invasão militar pareça improvável diante dos estragos que provocaria na diplomacia das Américas e na depauperada economia venezuelana.

O objetivo real dessa pantomima nacionalista é facilitar a navegação de Nicolás Maduro na repressão a qualquer possibilidade de competição eleitoral viável em seu país.

A ditadura fechou as portas à participação das candidatas opositoras mais populares no pleito presidencial de 28 de julho. O descaramento foi tal que chegou a provocar críticas do governo petista, até então sempre disposto a defender as atrocidades do aliado.

A detenção por razões políticas atingiu quase 16 mil pessoas na última década, segundo a ONG Foro Penal. Mais de 250 continuam encarceradas, e milhares são objeto de medidas que restringem as suas liberdades civis.

O regime prepara uma legislação, cinicamente denominada antifascista, para apertar ainda mais o garrote contra os opositores.

A ditadura de verdade —opressora, violenta e corrupta— recorre à fantasia da Guiana Essequiba apenas para acelerar a marcha de sua agenda liberticida doméstica.

editoriais@grupofolha.com.br

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