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Virgilio Viana

Adaptação climática, economia e sofrimento humano

Crise exige estimativa realista do volume de investimentos necessários

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Virgilio Viana

Superintendente-geral da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), é professor associado especial da Fundação Dom Cabral (FDC)

As tragédias do Rio Grande do Sul, da Amazônia e do Pantanal não deixam margem para dúvida. Estamos na era da adaptação às mudanças climáticas. Enfrentar isso deve ser a prioridade de governos, empresas, universidades e sociedade civil.

Muitos meios de comunicação têm prestado um desserviço à humanidade ao alimentar uma falsa polêmica sobre o fato de as mudanças climáticas serem causadas pela ação humana. Vale lembrar que na história do cigarro as empresas foram eficientes em arregimentar cientistas para minimizar ou refutar as evidências dos impactos do tabagismo sobre a saúde. O mesmo ocorreu com indústrias ligadas aos agrotóxicos. Estariam as empresas de petróleo fazendo o mesmo? É hora de relegar os negacionistas climáticos ao ostracismo. É o momento de dar ouvido aos alertas do papa Francisco, tanto na exortação "Laudato Deum" quanto na encíclica "Laudato Si", que trata do cuidado e da conservação do meio ambiente.

Bairro Mathias Velho, na cidade de Canoas, no Rio Grande do Sul, após enchentes - Pedro Ladeira - 14.mai.2024/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress

Há quase 20 anos, o histórico Relatório Stern continha uma mensagem clara: os custos da inação climática são cerca de cinco vezes maiores do que os custos para prevenir o problema. Os relatórios anuais da ONU e do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) vão na mesma direção. Em outras palavras, é economicamente mais inteligente prevenir do que remediar. Estamos colhendo os frutos dessa inação, infelizmente.

Os números da enchente no Rio Grande do Sul são impressionantes: mais de 200 mortos e desaparecidos, 80 mil pessoas desabrigadas e 100 mil residências inundadas. As enchentes afetaram mais de 90% da atividade econômica do estado e a estimativa do governo local é de um custo de R$ 200 bilhões para a recuperação dos estragos.

Os impactos econômicos, sociais e ambientais da seca recorde na Amazônia em 2023 foram gigantescos. As queimadas recordes deste ano no Pantanal e outros biomas brasileiros também são trágicas. Até quando vamos esperar para agir?

Segundo o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, 66% dos 5.570 municípios brasileiros têm capacidade baixa ou muito baixa de adaptação a eventos climáticos extremos. De acordo com a Confederação Nacional de Municípios, houve 60 mil decretações de emergência no Brasil de 2013 a 2023. É urgente pensar mais em adaptação do que em ações emergenciais.

O Ministério do Meio Ambiente apoiará a construção de 260 planos municipais de adaptação à mudança do clima —menos de 5% do total. Seria possível alcançar 100% dos municípios até a COP30, que ocorrerá no final de 2025, em Belém? Temos uma oportunidade única para mostrar à comunidade internacional a seriedade do Brasil nessa agenda.

Necessitamos de uma estimativa realista do volume de investimentos necessários para preparar nossos municípios para a adaptação climática. Com base nisso, poderemos buscar fontes de financiamento nacional e internacional.

O Brasil deve estruturar um ambicioso programa de apoio à gestão, à inovação tecnológica e ao financiamento para a adaptação. É o único caminho para diminuir as perdas econômicas e o sofrimento humano.

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