A constante troca de comando na Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo (SMA) tem preocupado os quadros técnicos da pasta, que nos últimos anos passou a compor as trocas de apoio partidário do governo estadual.
Desde a reeleição do governo Alckmin, em 2015, a SMA passou pelo comando da professora de Direito Ambiental da USP Patricia Iglecias, pelo administrador Ricardo Salles (PP) e pelo economista Mauricio Brusadin, substituído nessa terça pelo seu secretário-adjunto, Eduardo Trani. Esse é o quarto secretário em quatro anos. A expectativa é de que ele permaneça até dezembro.
No sábado, o governador Márcio França conversou pessoalmente com o diretor da ONG SOS Mata Atlântica, Mário Mantovani, que estaria cotado para assumir a pasta, segundo fontes do governo. Mantovani não confirma. "Não levei a conversa como um convite, mas como um consulta". Negando a possibilidade de aceitar um cargo no governo —"eu sou o diretor da SOS; não tenho nem perfil para isso", o ambientalista contou ter expressado a França sua preocupação com as trocas políticas na SMA e recomendou que "um perfil técnico deveria tocar [o trabalho]".
“Sugeri que o governo confirmasse o nome do Trani, porque é um nome técnico, com 40 anos de casa, que conhece cada projeto. Coloquei energia em muitas coisas que estão às vésperas de sair e, mais importante que as pessoas, é dar continuidade ao projeto”, afirma Brusadin.
Segundo ele, a gestão ambiental sofre mais do que outras secretarias com as trocas partidárias por envolver muitos interesses conflituosos, de mineradoras a comunidades tradicionais, e requerer anos de diálogo e negociação para viabilizar projetos de longo prazo. “Tem que aprovar no território, com conselhos, depois troca o comando e tem que começar tudo do zero de novo”, diz.
Entre as preocupações do secretário que deixa o cargo, está a continuidade da implementação de consórcios regionais para tratamento de resíduos sólidos, com parcerias público-privadas. “Conversei com mais de 500 prefeitos, recebi 30 embaixadas interessadas no investimento estrangeiro para gerar energia a partir do lixo, imagina recomeçar tudo isso?”, diz.
Ele ainda cita o envio de US$ 30 milhões aprovados pelo Banco Mundial —mais de R$ 99 milhões— para pagamento de serviços ambientais para revitalizar áreas degradadas e a publicação de dois editais para concessão de parques públicos à administração privada. "Deu um trabalho danado convencer os ambientalistas disso, agora não podemos sinalizar ruptura para todos que se envolveram”, afirma.
Com um time técnico de mestres e doutores em equipamentos de gestão que se tornaram referência na América Latina, como é o caso da Cetesb, a SMA enfrenta um ‘clima de fracasso generalizado’, segundo fontes do alto escalão da pasta. As trocas de comando e, portanto, de prioridades, têm dificultado o trabalho dos funcionários que encaminham agendas com outros atores, como empresas e sociedade civil organizada.
Incerteza e descontinuidade são as palavras mais citadas pelas fontes ouvidas nos bastidores da SMA. A leitura corrente é de que os governos Alckmin e França têm revezado entre acenos para a sociedade e os ambientalistas —com nomeações ligadas à área ambiental— e sinalizações a partidos aliados. Depois de responder ao jogo partidário com a saída de Brusadin, a expectativa é de que o governo mantenha Trani para acenar de volta aos ambientalistas.
Entre as políticas que ficaram prejudicadas de 2015 para cá, fontes da SMA citam os atrasos no Zoneamento Ecológico Econômico e nos planos de manejo das áreas protegidas. Os consórcios regionais para tratamento de resíduos sólidos também ficaram aquém da meta: dos 6 previstos, só 1 foi apoiado pela Secretaria até agora.
A área de Educação Ambiental é outro exemplo de descontinuidade: com status de coordenadoria na gestão de Patricia Igleciais, em 2015, foi rebaixada para departamento por Salles em 2016 e voltou a ser coordenadoria já em 2017, com Brusadin. Os funcionários reclamam que as mudanças gastam recursos sem criar avanços, aprofundando a dificuldade orçamentária.
Preocupado com a politização dos programas ambientais, o ex-secretário Xico Graziano (2007-2010) interpreta o recente aumento do interesse partidário na pasta como um sinal de desvalorização da agenda nas últimas gestões. "Ela perdeu importância, então sobra para oferecer", diz.
Em nota, a assessoria de imprensa do Governo do Estado de São Paulo diz que "não houve impacto nas políticas públicas de meio ambiente por se tratar de programas e projetos de longo prazo, gerenciados por líderes e quadros técnicos especializados, capacitados em administrar e conduzir as políticas públicas, como os movimentos ambientalistas sugerem".
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