Descrição de chapéu Coronavírus

Na TV, Bolsonaro manda recado a Mandetta e cita médico de petistas; leia íntegra comentada

Defesa da cloroquina para tratamento de pacientes da Covid-19 foi um dos principais pontos de novo pronunciamento

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São Paulo

Em seu quinto pronunciamento na TV sobre a crise do coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro cobrou nesta quarta-feira (8) sintonia de seus auxiliares após tensões com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e voltou a defender o uso da hidroxicloroquina contra a Covid-19.

O presidente também mais uma vez expôs divergências com governadores, listou medidas na área econômica e, em meio à divulgação de mais de cem óbitos devido à doença nesta quarta (o total no Brasil chegou a 800), afirmou que a situação da economia também pode provocar mortes.

Leia a íntegra comentada do pronunciamento em cadeia de rádio e TV:

Pronunciamento de Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (8)
Pronunciamento de Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (8) - Carolina Antunes/Divulgação Presidência

Boa noite.
Vivemos um momento ímpar em nossa história. Ser presidente da República é olhar o todo, e não apenas as partes. Não restam dúvidas de que o nosso objetivo principal sempre foi salvar vidas.

Gostaria, antes de mais nada, de me solidarizar com as famílias que perderam seus entes queridos nesta guerra que estamos enfrentando.

No dia em que mais uma vez mais de cem mortes no país foram confirmadas, o presidente procura mostrar mais empatia com aqueles que perderam amigos e parentes. No pronunciamento do dia 24, em que se referiu à doença como "resfriadinho", ele não manifestou apoio nesse tom.

Depois de falar no "maior desafio da nossa geração" no pronunciamento do dia 31, o presidente usa o termo "guerra" para definir a reação à pandemia, que já tinha sido usado por líderes mundiais anteriormente, como o francês Emmanuel Macron. É um novo contraponto à série de declarações que deu anteriormente minimizando os efeitos da moléstia.

Tenho a responsabilidade de decidir sobre as questões do país de forma ampla, usando a equipe de ministros que escolhi para conduzir os destinos da nação. Todos devem estar sintonizados comigo.

Na segunda-feira (6), em meio a rumores sobre uma possível demissão do ministro Mandetta, Bolsonaro foi pressionado por setores do governo, do Congresso e do Judiciário a mantê-lo no cargo. O presidente já disse publicamente divergir de seu ministro da Saúde.

Ao confirmar que permaneceria na pasta, Mandetta defendeu na segunda-feira que as orientações dos governos estaduais fossem seguidas. Os governadores pelo país se tornaram os principais alvos de ataques de Bolsonaro na pandemia.

Sempre afirmei que tínhamos dois problemas a resolver, o vírus e o desemprego, que deveriam ser tratados simultaneamente.

Respeito a autonomia dos governadores e prefeitos. Muitas medidas, de forma restritiva ou não, são de responsabilidade exclusiva dos mesmos. O governo federal não foi consultado sobre sua amplitude ou duração. Espero que brevemente saiamos juntos e mais fortes para que possamos melhor desenvolver o nosso país.

O presidente novamente atribui a responsabilidade das medidas a prefeitos e governadores, ainda que o Ministério da Saúde também tenha recomendado o isolamento social. Analistas e opositores veem na tática uma tentativa de se desvincular das consequências econômicas da pandemia, como a forte recessão já prevista para este ano.

Para especialistas, o sistema federalista do país concede autonomia administrativa para estados e municípios em aréas como saúde, educação e comércio, restringindo a possibilidade de interferência do presidente em decisões nesses setores.

O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, em decisão desta quarta-feira, reafirmou essa tese jurídica, afirmando que o governo federal não pode afastar unilateralmente medidas de prefeituras e governos estaduais.

Como afirmou o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, cada país tem suas particularidades, ou seja, a solução não é a mesma para todos. Os mais humildes não podem deixar de se locomover para buscar o seu pão de cada dia.

No pronunciamento da semana passada, o presidente tirou de contexto declaração do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, para defender que os trabalhadores voltassem a suas atividades. Agora, ele cita afirmação sobre peculiaridades de cada país para voltar à mesma tese. A OMS, porém, sempre defendeu o isolamento social para frear a disseminação do novo coronavírus e afirma que a suspensão dessas medidas deve ser "gradual e calibrada".

As consequências do tratamento não podem ser mais danosas que a própria doença. O desemprego também leva à pobreza, à fome, à miséria, enfim, à própria morte.

Com 80 mil óbitos pelo mundo em decorrência da pandemia e após ser muito criticado por contrapor medidas sanitárias ao desenvolvimento econômico, Bolsonaro busca associar a morte também à futura situação da economia no país.

Com esse espírito, instruí meus ministros. Após ouvir médicos, pesquisadores e chefes de estado de outros países, passei a divulgar, nos últimos 40 dias, a possibilidade do tratamento da doença desde sua fase inicial.

Há pouco conversei com o doutor Roberto Kalil. Cumprimentei-o pela honestidade e compromisso com o juramento de Hipócrates, ao assumir que não só usou a hidroxicloriquina, bem como a ministrou para dezenas de pacientes. Todos estão salvos.

Disse-me mais: que, mesmo não tendo finalizado o protocolo de testes, ministrou o medicamento agora, para não se arrepender no futuro. Essa decisão pode entrar para a história como tendo salvo milhares de vidas no Brasil. Nossos parabéns ao doutor Kalil.

O presidente busca ligar a um profissional conhecido da medicina do país, e que já tratou os ex-presidentes petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, a sua insistência no uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19.

O tom do pronunciamento de Bolsonaro incentiva um uso amplo da substância, o que não é o protocolo do Ministério da Saúde atualmente. O ministério já prevê o uso para casos considerados graves e críticos, mas, segundo o ministro Mandetta, não faz sentido prescrever cloroquina a partir dos primeiros sintomas da doença.

Conforme disse o ministro nesta quarta, não seria inteligente receitar a medicação para pessoas que não precisam dela.

Temos mais boas notícias. Fruto de minha conversa direta com o primeiro-ministro da Índia, receberemos, até sábado, matéria-prima para continuarmos produzindo a hidroxicloriquina, de modo a podermos tratar pacientes da Covid-19, bem como malária, lúpus e artrite. Agradeço ao primeiro-ministro Narendra Modi, e ao povo indiano, por esta ajuda tão oportuna ao povo brasileiro.

A partir de amanhã começaremos a pagar os R$ 600 de auxílio emergencial para apoiar trabalhadores informais, desempregados e microempreendedores, durante três meses.

Concedemos também a isenção do pagamento da conta de energia aos beneficiários da tarifa social, por três meses, atendendo a mais de 9 milhões de família que tenham suas contas de até R$ 150.

Disponibilizamos R$ 60 bilhões via Caixa Econômica Federal para capital de giro destinados a micro, pequenas e médias empresas e à construção civil. Os beneficiários do Bolsa Família, que são quase 60 milhões de pessoas, também receberão um abono complementar do auxílio emergencial.

Autorizamos, ainda, para junho, um saque de até R$ 1.045 aos que têm conta vinculada ao FGTS.

Ainda cobrado por mais iniciativas de proteção social de atingidos pelos efeitos da pandemia, o presidente lista as medidas já tomadas na reação.

Repatriamos mais de 11 mil brasileiros que estavam no exterior, num esforço capitaneado pelo Itamaraty, Ministério da Defesa e Embratur.

Tenho certeza de que a grande maioria dos brasileiros quer voltar a trabalhar.

Os números do Datafolha em pesquisa feitas dos dias 1º a 3 de abril mostram apoio majoritário à atual política de restrição dos estados. No levantamento, os entrevistados foram questionados se pessoas fora do grupo de risco deveriam sair para trabalhar ou continuar em isolamento. Disseram que essas pessoas deveriam continuar em isolamento 60% dos entrevistados, ante 37% que defenderam que saiam para trabalhar.

Esta sempre foi minha orientação a todos os ministros, observadas as normas do Ministério da Saúde.

Após a menção indireta à crise com Mandetta, Bolsonaro manifesta respeito à pasta de seu auxiliar, em um aceno.

Quando deixar a Presidência, pretendo passar ao meu sucessor um Brasil muito melhor do que aquele que encontrei em janeiro do ano passado. Sigamos João 8:32, “E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará!”.

A frase bíblica virou um bordão para Bolsonaro usado em diferentes assuntos. Só em seu perfil no Twitter, ele já a citou dez vezes desde 2016, para falar, por exemplo, de quilombolas, do preço da gasolina ou para rebater adversários.

Desejo a todos uma Sexta-Feira Santa de reflexão e um feliz Domingo de Páscoa! Deus abençoe o nosso Brasil!

Colaborou Wálter Nunes, de São Paulo

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