Descrição de chapéu Eleições 2020

Sem marcas de gestão, Covas esconde Doria e aposta em superação para tentar se reeleger em SP

Político discreto, tucano ganhou visibilidade ao tratar câncer e por ações na pandemia, mas não cumpriu metas como prefeito

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São Paulo

Bruno Covas (PSDB) chegou ao cargo de prefeito da maior cidade do país como um político discreto, com atuação forte nos bastidores. Cerca de dois anos e meio depois, ele enfrenta seu maior teste ao encarar as urnas pela primeira vez como cabeça de chapa para uma eleição majoritária.

Sem marcas de gestão e a bordo de uma grande coalizão de partidos, Covas centra sua campanha na própria experiência de luta contra o câncer e enfrentamento de períodos turbulentos que incluem uma pandemia de coronavírus. A aposta vem dando certo, com Covas liderando com folga a disputa nas pesquisas e vencendo em todos os cenários no segundo turno.

Então um político não muito conhecido, Covas assumiu o posto de vice do candidato João Doria (PSDB) como uma tentativa de pacificar o tucanato rachado pela presença de um outsider na cabeça da chapa. Era o começo de uma nova era no PSDB, na qual os antigos caciques perderiam o poder para o grupo dominado por Doria.

Ilustração mostra Bruno Covas em sua casa
Ilustração retrata Bruno Covas em sua casa; candidato chegou ao cargo de prefeito da maior cidade do país como um político discreto - Catarina Pignato

Embora seja membro do grupo político do governador, Covas desde o começo tentou demarcar a diferença entre os dois, que inclui o fato de nunca ter embarcado na onda ultraconservadora que varreu o país com a chegada de Jair Bolsonaro à Presidência.

Na primeira fala como prefeito, ele exaltou a política, após Doria ter sido eleito dizendo que não era político, mas um gestor. Enquanto Doria lançava novos programas e slogans, vestia-se de gari e vivia em embate contínuo com adversários e a imprensa, Covas tirou o pé do acelerador e apostou em terminar obras iniciadas por Fernando Haddad (PT) —algumas delas até hoje não entregues.

Na campanha eleitoral, Covas escondeu Doria de sua propaganda, enquanto rivais buscaram destacar a ligação entre eles, apostando na rejeição ao governador paulista.

O prefeito assumiu o cargo em um novo momento de sua vida, quando havia perdido 16 quilos, começado a fazer exercícios e raspado a cabeça. Pai de um adolescente e divorciado, ele teve, inicialmente, fama de prefeito baladeiro.

No primeiro ano de gestão, Covas passou mais de 40 dias afastado viajando. Estava na Europa em março de 2019, quando a região metropolitana enfrentou graves enchentes, que mataram 13 pessoas.

A imagem do prefeito mudou após diagnóstico, em outubro de 2019, de um câncer em estágio avançado, já em metástase, no trato digestivo. No início do ano seguinte, viria a pandemia do coronavírus.

Paralelamente ao tratamento, Covas manteve o trabalho e se mudou para a prefeitura no ápice da pandemia.

A gestão do prefeito foi favorável a medidas duras para promover o distanciamento social contra o coronavírus, algumas vezes mais restrititivas do que as propostas pelo governo Doria. Um exemplo foi adiar a abertura das escolas quando, de acordo com a regra estadual, já poderia abri-las.

A gestão criou dois hospitais de campanha e conseguiu conter a falta de leitos e respiradores que assolou outros locais do mundo e do Brasil. Por outro lado, também promoveu medidas questionadas, como bloqueios no trânsito e um rodízio ampliado, que acabou sendo abortado.

Em outubro, pesquisa Datafolha revelou que a aprovação do prefeito no enfrentamento à pandemia subiu de 39% para 46%.

Para aliados de Covas, o câncer e a pandemia aumentaram muito o nível de conhecimento do prefeito na cidade e a sua popularidade. Com a campanha eleitoral, a retórica é de prestar contas da gestão, o que não teria sido possível devido a tantas situações emergenciais, que incluíram desabamento de um prédio no centro, rachadura em um viaduto na marginal Pinheiros e a própria pandemia.

Sem grandes marcas na gestão, como as ciclovias e faixas de ônibus de Fernando Haddad (PT) ou a Cidade Limpa de Gilberto Kassab (PSD), ele tenta se vender com um resolvedor de problemas. O fato é que, até o fim de outubro, havia cumprido apenas 33 das 71 metas, o equivalente a 46%.

Entre as metas que ainda não foram cumpridas estão a entrega dos 12 CEUs (Centros Educacionais Unificados), baixar para 30 dias de espera dos exames prioritários e implantar 10 novos parques, entre outras.

Apesar do discurso a favor da mobilidade, a gestão de Covas privilegiou o transporte individual, ao diminuir a meta de 72 km de corredores de ônibus para apenas 9 km. A administração apostou boa parte das suas fichas (e verbas) em um amplo programa de recapeamento, o que costuma ter muita visibilidade e apelo eleitoral entre os paulistanos.

Político habilidoso nos bastidores, Covas conseguiu passar projetos importantes na Câmara, como uma reforma da previdência. O bom trânsito, porém, ocorre também às custas também de loteamento de cargos para vereadores.

Covas costuma dizer que o que gosta de fazer na vida é política. Nesse ponto, o avô é até hoje sua grande referência. Na adolescência, Covas deixou Santos, cidade da sua família, e foi morar com o avô, então governador de São Paulo, para estudar no Colégio Bandeirantes.

O início na política foi em 2004, como candidato a vice-prefeito na chapa de Raul Christiano à Prefeitura de Santos, que foi derrotada. Após dois anos, ele se candidatou a deputado estadual e foi eleito. Em 2010, foi reeleito com 239 mil votos, a maior votação do estado.

Bruno Covas foi secretário de Meio Ambiente de 2011 a 2014, na gestão Alckmin, período em que teve uma atuação discreta.

Em setembro de 2014, durante a campanha eleitoral, um ex-assessor de Covas foi flagrado transportando R$ 102 mil em espécie, sem documento que comprovasse sua origem, e 16 cheques em branco assinados "Eleição 2014 Bruno Covas Lopes".

A Justiça Federal tratou o caso como suspeito de lavagem de dinheiro. Bruno Covas não foi investigado no inquérito. Em 2018, após quatro anos, a apuração foi arquivada por falta de provas.

Na eleição de 2014, ele foi eleito deputado federal com 352 mil votos, uma das maiores votações do estado.

Da época como deputado, é possível ver registro de Covas no documentário "Democracia em Vertigem", da cineasta Petra Costa, durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT). Bem mais gordo, ele aparenta comemorar o processo, junto com outros políticos favoráveis à saída da então presidente.

Após assumir a prefeitura, porém, Covas passou a fazer acenos à esquerda. O principal marco desse processo foi a chegada de Alê Youssef ao cargo de secretário da Cultura --que, inclusive, promoveu um festival na cidade contra a censura.

"Ele é diferente dos políticos que surgiram mais atualmente, como o Doria, Bolsonaro e o Witzel. O Bruno é mais discreto e ao mesmo tempo essa discrição dá a ele a possibilidade de se situar no centro, na medida em que ele não fica dando declarações que o compliquem", afirma o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV.

Covas enfrentou momentos de tensão com João Doria durante a dobradinha tucana no governo e prefeitura. Para Teixeira, vencendo a eleição, ele pode passar a ser um concorrente do governador dentro do PSDB, reeditando rivalidades como a de José Serra e Geraldo Alckmin.

Raio-X

Bruno Covas Lopes

Formado em direito na USP e em economia na PUC-SP, tem 40 anos, é divorciado e pai de um adolescente. Foi deputado estadual com 26 anos. Foi reeleito e virou secretário estadual do Meio Ambiente. Em 2014, foi eleito deputado federal. Em 2016, Covas foi eleito vice-prefeito na chapa de João Doria. Assumiu a prefeitura em abril de 2018.

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