Descrição de chapéu Eleições 2020

Vitória de Covas aumenta independência em relação a Doria e projeta governador para 2022

Eleição tira prefeito da sombra do chefe do Executivo paulista, que foi escondido durante a campanha

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São Paulo

Aliados de João Doria (PSDB) comemoram a reeleição do prefeito Bruno Covas (PSDB), neste domingo (29), como uma vitória do próprio governador, que sai do pleito municipal fortalecido para seguir em seu projeto de construir uma chapa presidencial contra Jair Bolsonaro (sem partido) em 2022.

Aliados do prefeito ressaltam também que Covas, reeleito com votação própria, se projeta como um líder nacional do partido e deixa o papel de coadjuvante de Doria. Decisões importantes a respeito da cidade e do estado já não podem ser tomadas sem que o prefeito seja consultado.

O governador João Doria (PSDB) e o prefeito Bruno Covas (PSDB) durante votação na manhã deste domingo (29) - Adriano Vizoni/Folhapress

Se antes Doria predominava no tucanato paulista, agora há um novo equilíbrio entre as alas do partido —a do governador, que buscou uma guinada liberal e agora quer construir um centro democrático, e a da social-democracia, representada pelos tucanos históricos e com a qual Covas se identifica.

Membros do PSDB ouvidos pela Folha, porém, minimizam as chances de rivalidade entre os dois e afirmam que ambos devem atuar em parceria e buscar entendimento.

Êxito inconteste para o PSDB e para Covas, que liderou quase toda a corrida eleitoral, o resultado não foi, contudo, de todo positivo para Doria. A campanha em São Paulo evidenciou a rejeição do governador na capital —61% não votariam em candidato apoiado por ele, resultado pior do que o do ex-presidente Lula (PT).

Escondido durante a campanha, o governador reapareceu ao lado do prefeito na comemoração da reeleição na noite de domingo, mas fez questão de deixar claro, em discurso, que a "vitória foi conquistada coletivamente. Com um grande candidato, mas coletivamente."

No palanque, Doria falou por cerca de nove minutos, enquanto o discurso do próprio prefeito reeleito durou pouco mais de 7 minutos.

Pela manhã, Doria ressaltou a importância do pleito municipal de olho em 2022.

"Isso [eventual vitória de Covas] é uma retomada importante para o PSDB nacionalmente. Superada essa eleição, nós não temos que pensar na próxima eleição, nós temos que pensar na nação", afirmou o governador paulista.

A não ser neste domingo e no do primeiro turno, no último dia 15, quando votaram juntos e discursaram juntos após a apuração, Covas e Doria não fizeram campanha lado a lado em público. O governador chegou a gravar propaganda de TV para o prefeito, segundo a equipe do candidato, mas ela nunca foi ao ar.

No dia 12 de setembro, a convenção tucana que oficializou a candidatura de Covas teve a participação de Doria. O evento sinalizou que a campanha na capital fazia parte do projeto do governador para 2022.

"Cada momento é um passo. Neste momento, o passo é pela Prefeitura de São Paulo. Mas a soma de passos fortalece esta relação", afirmou Doria na ocasião.

O governador disse ainda que a eleição na capital paulista tem "uma representatividade muito expressiva no cenário nacional" e destacou a reaproximação do que classifica como "centro democrático liberal, que sabe dialogar com a esquerda e com a direita".

Para tucanos ouvidos pela Folha, a eleição de 2020 reabilitou o PSDB após o fracasso das eleições passadas, o que é um ganho indireto para Doria. Com o partido em boas condições de competitividade, seu desafio é vencer resistências internas na sigla, superar a rejeição do eleitorado paulista e aglutinar outros partidos em torno de seu nome para o Planalto.

Indagado na manhã deste domingo sobre o fato de o PSDB ter sofrido uma queda no número de prefeitos eleitos no país, na comparação com a eleição anterior, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que é mais relevante vencer nas grandes cidades, como São Paulo.

"Acho normal [perder prefeituras], com o tempo os partidos perdem a popularidade, se desgastam em algumas cidades. O importante é que vamos ganhar aqui, isso é o que vale. Não só São Paulo, as grandes cidades. Eleição no Brasil depende do candidato, não é do partido. Se o candidato não é bom, fazer o quê?"

A leitura entre adversários é que Covas venceu apesar de Doria e não por causa dele, já que a imagem do governador foi explorada pelas demais campanhas como um ponto negativo do prefeito. Mesmo tucanos admitem que o governador não vive um bom momento político.

Além disso, foi uma articulação de Doria que trouxe para Covas a principal dor de cabeça de sua campanha, o vice-prefeito eleito, Ricardo Nunes (MDB).

As acusações contra Nunes, reveladas pela Folha, a respeito de ligações controversas com entidades gestoras de creches e de ameaça a mulher dominaram os ataques à chapa tucana no segundo turno.

O papel do governador Doria durante a campanha ficou nos bastidores. Ele atuou para formar a coligação de 11 partidos em torno de Covas com o propósito de que essa frente seja o prenúncio de uma coalizão a favor de sua candidatura ao Planalto em 2022.

A escolha de Covas por Nunes, no dia 11 de setembro, se deu num contexto de pressão da coligação e de Doria para que o prefeito aceitasse o emedebista na chapa. Aliados de Covas preferiam a hipótese de chapa pura tucana, e o próprio prefeito chegou a dizer que, originalmente, pretendia ter uma mulher como vice.

Para Doria, porém, o MDB é peça-chave na frente que envolve ainda Sergio Moro, Luciano Huck e o DEM de Rodrigo Maia —grupo que prega uma alternativa que consideram de centro contra a reeleição de Bolsonaro. Durante o período eleitoral, como mostrou a Folha, Doria investiu no contato com esses atores.

Conforme planejado por Doria, o pleito municipal serviu para dar protagonismo ao bloco formado por PSDB, DEM e MDB, diante das derrotas dos candidatos bolsonaristas nas urnas.

Enfatizando esse aspecto nacional, aliados do governador diminuem a importância da rejeição de Doria na capital. Lembram ainda que, em número de prefeituras, o PSDB paulista ampliou sua hegemonia no estado, embora a sigla tenha encolhido na contagem total do país.

Se a coligação de Covas e sua vitória ajudaram a clarear o caminho de Doria para 2022, o resultado embaralhou outro campo de batalha que permanece indefinido –o do governo do estado na próxima eleição.

Tucanos evitam falar em nomes e dizem que tudo pode mudar em dois anos. Covas está credenciado para a disputa, mas a avaliação é a de que ele deve cumprir os quatro anos de mandato, como prometeu, para não repetir o desgaste de Doria.

O vice de Doria, Rodrigo Garcia (DEM), é a opção aventada pelo governador, mas, para isso, o PSDB tem que abrir mão da cabeça de chapa. O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) também é nome lembrado.

Havia uma expectativa de que, dado o antagonismo entre Doria e Bolsonaro, os tucanos pudessem nacionalizar a campanha, o que não ocorreu. A avaliação foi a de que o embate não traria votos —Covas não apenas deixou de comprar a briga do governador com o presidente, como escondeu o aliado.

Em uma propaganda na TV em que Covas se apresenta e dá detalhes de sua carreira política, o agora eleito omite o período em que foi vice-prefeito de Doria.

Isso abriu margem para que os adversários na corrida eleitoral questionassem o sumiço do governador e até se referiam ao candidato como "Bruno Doria", para reforçar a ligação entre os dois.

Covas se defendia dizendo que sua ligação com Doria era mais do que sabida e que o governador não poderia abandonar suas funções para fazer campanha.

Os dois tucanos, no entanto, já tiveram seus atritos quando ambos batiam ponto na prefeitura. O ápice foi quando Doria retirou Covas da Secretaria de Subprefeituras em novembro de 2017, em um momento em que o prefeito era criticado pela situação da zeladoria da cidade.

Covas ganhou a prefeitura de presente após Doria vencer a eleição em 2016, no primeiro turno, e abandonar o cargo pouco mais de um ano depois para tentar ser governador. Uma eleição vencida pelo próprio Covas, agora, tende a dar mais independência a ele, na avaliação de correligionários.

O prefeito já vinha cavando essa autonomia ao longo dos dois anos e meio em que esteve na cadeira. Sua medida mais escancarada nesse sentido foi em relação aos grafites nas empenas de prédios pela cidade.

Doria começou sua gestão apagando as pinturas com tinta cinza, e Covas, depois que assumiu, incentivou e espalhou murais pelo centro expandido.

Covas ainda mudou o plano de metas de Doria, aumentando de 53 para 71 o número de objetivos, e alterou 20 delas. Além disso, deixou de lado o programa Trabalho Novo, voltado para emprego a moradores de rua, e reformulou o Redenção, para usuários de drogas na cracolândia.

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