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Ciro minimiza ataque em ato em SP e propõe trégua com PT para enfrentar Bolsonaro

Organizadores repudiam agressões e mantêm aposta em unidade; reação de petistas é tímida

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São Paulo

Em busca de construir uma unidade entre campos políticos adversários pelo impeachment de Jair Bolsonaro, políticos e entidades envolvidas nos atos do último sábado (2) repudiaram os ataques a Ciro Gomes (PDT).

Mencionando diferenças com o PT, Ciro minimizou neste domingo (3) as agressões que sofreu no protesto na avenida Paulista e pediu uma "trégua de Natal" quando se tratar das ações para remover Bolsonaro.

A reação do PT, porém, foi tímida. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se manifestou. À Folha a assessoria dele afirmou que a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, já havia se manifestado.

Gleisi afirmou ao UOL que "isso nunca foi orientação do PT" e reforçou que Bolsonaro é o inimigo.

O ex-prefeito de São Paulo e presidenciável em 2018 Fernando Haddad, ao deixar o ato na avenida Paulista no sábado, afirmou ser lamentável o ataque a Ciro. Em seu discurso, após as vaias, disse que os manifestantes "não podem perder de vista" o que estão fazendo nas ruas, que é protestar contra o presidente.

Nem ele, nem Gleisi nem Lula haviam postado sobre o tema em suas redes sociais até a noite deste domingo.

O pré-candidato à Presidência Ciro Gomes (PDT) discursa em ato pelo impeachment de Bolsonaro na avenida Paulista
O pré-candidato à Presidência Ciro Gomes (PDT) discursa em ato pelo impeachment de Bolsonaro na avenida Paulista - Marlene Bergamo - 2.out.2021/Folhapress

Em sua pré-campanha, Ciro não tem poupado críticas a Lula e aos governos petistas. O pedetista foi vaiado ao discursar no palco da avenida Paulista. Ao deixar o local, teve que entrar rapidamente em seu carro para fugir de pedaços de pau sendo atirados contra ele.

Como mostrou a Folha, a maior parte do público da manifestação era de esquerda —especialmente de movimentos e partidos que trabalham para a eleição de Lula em 2022.

Ciro pregou unidade de campos políticos para conquistar uma maioria parlamentar pelo impeachment e mencionou sua ida à manifestação promovida pela direita, em 12 de setembro, organizada pelo MBL (Movimento Brasil Livre) e pelo VPR (Vem Pra Rua).

"Quando eu aceitei o convite do MBL, eu não superei as diferenças insuperáveis que tenho com MBL e nem, acabado o ato, fomos tomar cerveja", disse Ciro em entrevista à imprensa neste domingo.

"Também as minhas diferenças com o PT são cada vez mais profundas e insuperáveis, mas o que eu estou propondo, para toda a militância nossa, é não dar valor a esses incidentes, que são desagradáveis, mas são irrelevantes à luz da gravíssima hora que o Brasil está pedindo de todos nós: serenidade, equilíbrio e foco."

"Estamos propondo uma amplíssima trégua de Natal, como nas guerras. Quando o assunto for Bolsonaro e impeachment, a gente deve esquecer tudo e convergir para esse rasíssimo consenso, que já não é fácil", completou.

O pedetista afirmou que não havia recebido ligações de petistas em solidariedade até as 14h, mas também procurou não dar importância a isso —Ciro elogiou a manifestação de Gleisi ao UOL. À noite, em entrevista à Globo News, Gleisi voltou a repudiar os ataques e apoiou a trégua proposta pelo pedetista, mas cobrou que ele a siga, mencionando suas críticas frequentes ao PT.

Público vaia Ciro Gomes durante seu discurso, na avenida Paulista - Marlene Bergamo - 2.out.21/Folhapress

Depois do 7 de Setembro bolsonarista, a oposição ao presidente à esquerda e à direita vêm tentando ampliar suas ações, incluindo políticos adversários, para viabilizar o impeachment. A nova tentativa será em 15 de novembro.

A expectativa era que o ato do último sábado fosse o mais diverso entre as seis manifestações que a esquerda promoveu desde maio, com nomes de 21 partidos, mas houve diversas ausências —Ciro acabou sendo o único presidenciável na avenida Paulista.

Nesse sentido, a intimidação a ele foi destacada, sobretudo entre partidários da direita, como mais uma razão para evitar atos conjuntos com o PT. O deputado Paulinho da Força (SP), presidente do Solidariedade, também foi vaiado.

Ciro fez essa ponderação. "Quantas pessoas poderiam ter ido lá e não foram com medo de serem retaliadas e agredidas?", questionou. "Eu sabia que ia acontecer e ainda assim fui, porque considerei que era um dever meu ter humildade, ter paciência, aguentar, para dar meu exemplo."

Como mostrou a Folha, presidenciáveis como Alessandro Vieira (Cidadania), Simone Tebet (MDB) e Luiz Henrique Mandetta (DEM) eram esperados no ato e estiveram na manifestação de 12 de setembro, ao lado de João Doria (PSDB) e João Amoêdo (Novo) —todos ausentes desta vez na avenida Paulista.

Mandetta e Tebet, por exemplo, afirmaram ter agendas pessoais coincidentes. Também foi frustrada a presença de representantes de PSD, Podemos e PSL. Alguns políticos participaram por vídeo, o que os poupou de vaias.

Segundo Fernando Guimarães, organizador dos atos e coordenador do Direitos Já (fórum de 19 partidos e diversas entidades pela democracia), imprevistos explicam melhor a falta de nomes de fora do campo progressista do que uma decisão política de não participar.

"É natural que as pessoas tenham essa leitura, mas não dá para dizer que as lideranças não vieram por uma questão de avaliação política", afirma ele, lembrando que as falas de políticos de esquerda foram por unidade. "No dia 15 de novembro, vamos ter essa unidade lado a lado."

Ele avaliou as manifestações como grandiosas, com a participação de setores diversos da sociedade. "É um processo de acumulação de frente ampla. Foi um exercício, um primeiro passo, uma sinalização do que podemos fazer", disse.

Para Guimarães, o episódio com Ciro "são pedras no caminho, que não podem ser impeditivo de uma construção que é um imperativo histórico, a frente ampla pela democracia".

"O Direitos Já expressa solidariedade a Ciro. Esse tipo de violência, feita pela minoria da minoria, se identifica com aquilo que a gente busca combater", completa.

Erick Santos, do Movimento Acredito, que também participou da construção dos atos, diz que a presença de certas figuras fez falta, mas afirmou ter havido "passo importante em direção à ampliação".

"É preciso neutralizar o discurso divisionista para que possamos avançar no sentido de uma maior amplitude, mas o espírito geral dos organizadores é de unidade. Não haverá tolerância com desrespeito nos próximos atos."

Uma série de políticos do campo progressista condenou os ataques a Ciro, como Guilherme Boulos (PSOL), Orlando Silva (PC do B) e Marina Silva (Rede).

"A presença de amplos setores políticos é fundamental para a luta pelo impeachment. Neste sentido, a hostilização de lideranças que foram à Paulista, entre elas Ciro Gomes, é inaceitável. Setores minoritários da manifestação não expressam o sentimento de unidade que tomou as ruas ontem [sábado]", publicou Boulos.

Orlando Silva tuitou: "Foram massivos, capilarizados em todo o país e ampliaram com representação bem-vinda de centro e centro-direita. É a frente ampla tomando forma. Inaceitável o ataque Ciro Gomes".

As centrais sindicais também criticaram a hostilidade e afirmaram, em nota, que divisões só fortalecem "o atual governo de extrema direita".

De forma geral, os pedetistas alvos da agressão identificaram militantes do PCO (Partido da Causa Operária), da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e do PT como autores das ações, mas Ciro evitou apontar culpados.

Ele disse ter visto "30 camaradas com logomarca de partido avançando" em sua direção. Depois, afirmou supor que eram do PCO e do PT, ressaltando que "Bolsonaro é muito capaz de infiltrar gente para produzir cadáver".

A assessoria da CUT informou que Sérgio Nobre, que preside a entidade, não poderia responder neste domingo.

O PCO fez uma plenária de avaliação, na qual o presidente da sigla, Rui Costa Pimenta, defendeu a ação contra Ciro, a quem chamou de vigarista e pilantra.

"O PCO não deliberou fazer isso aí nem nada, mas por uma questão tática. Não que a gente não gostasse de fazer. Mas o pessoal foi lá e fez? Eu defendo o pessoal que foi lá e fez", disse ele, ressaltando que trabalhadores da CUT é que correram atrás do pedetista.

Antonio Carlos, dirigente nacional do PCO, afirmou à Folha que o partido não identificou seus militantes na ação, que considerou "espontânea e natural" diante dos ataques de Ciro a Lula.

"A gente expressou nossa posição com panfletos, faixas e com vaias, quando achava que era o caso", disse, completando que o partido, no entanto, não condena e apoia o cerco à Ciro.

Antonio Carlos afirma que Ciro e setores da direita são responsáveis pela eleição de Bolsonaro e por reformas que prejudicaram o povo, embora agora se digam arrependidos.

"É preciso ouvir as bases dos movimentos, que não quer essa unidade, que é uma ilusão. A cúpula [dos partidos] quer que a gente esqueça reivindicações populares em nome da unidade para no final não dar em nada", completa ele, ressaltando que a pressão popular, com manifestações robustas e greves, é que pode levar ao impeachment.

Em seu discurso na Paulista, Ciro afirmou que "meia dúzia de bandidos travestidos de esquerda acham-se donos da verdade". "O povo brasileiro é muito maior do que o fascismo de vermelho ou de verde e amarelo."

​Ao sair do palco, pediu a repórteres para procurarem no Google sobre o Cabo Anselmo —agente duplo da ditadura. Neste domingo, seu tom foi mais ameno. A menção, explicou, foi para dizer que "às vezes o ultrarradical não está a serviço da causa que parece que está".

Na entrevista, o presidente do PDT, Carlos Lupi, manteve críticas veladas ao PT. "Aqueles que querem fazer de conta que querem impeachment, enganar a população apenas para ter palanque, o povo vai julgar na hora certa", disse.

Já Ciro pediu serenidade à militância do PDT, que segundo ele ficou "muito aborrecida". Para ele, a militância não deve "entrar nesse clima de beligerância" e deve mostrar "superioridade moral". "Temos que ter uma capacidade de não entrar nesse tipo de coisa lateral", disse.

"Recebo com carinho todas as expressões de gratidão, mas não dou a menor bola à bobagenzinha que aconteceu lá", afirmou o ex-ministro. Ele disse ainda ser necessário "aguentar tudo que tiver que aguentar" em nome da coesão pela democracia.

Questionado sobre o PT aderir à trégua, Ciro afirmou que "pouco importa". "Eu não espero [que haja adesão do PT], porque eu já vi acontecendo coisas com [Leonel] Brizola, com Mario Covas, comigo mesmo. Isso é irrelevante."

"Não temos que esperar que eles aceitem ou se comportem como nós gostaríamos, nós é que temos que nos comportar de forma coerente com o que o Brasil precisa: uma trégua ao redor de um único assunto", disse Ciro, ressaltando que, para além do "fora, Bolsonaro", vai continuar estabelecendo "diferenças com o lulopetismo".

Questionado sobre adesão da chamada terceira via ao impeachment, Ciro disse não ter "nada a ver com essa terceira via que está aí". Segundo ele, seu projeto se diferencia econômica e politicamente.

Neste domingo, Ciro afirmou ainda que as manifestações de sábado em todo o país foram positivas, "um sucesso extraordinário", e que é preciso insistir na unidade dos campos políticos e na mobilização de rua.

"Só a rua, de forma ampla, generosa e absolutamente plural, vai permitir que a gente tire [o presidente da Câmara] Arthur Lira [PP-AL] da omissão criminosa de despachar o processo de impeachment."

O pedetista reiterou que Bolsonaro cometeu crimes graves e que continuará tentando dar um golpe.

Ciro afirmou ainda que a manifestação de 15 de novembro será maior e deu sugestões: de que tenha mais participação de artistas e de que haja uma mobilização que circule pelo país, a exemplo das Diretas Já, segundo ele.

O pedetista chegou a mencionar Belo Horizonte, Porto Alegre e Salvador para dizer que não é preciso haver um único palco em São Paulo. "Vou tentar também que a gente se divida, talvez, para não ter melindres, as grande figuras se dividam. Eu quero ir a Belo Horizonte."

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