Descrição de chapéu Folhajus

Juiz anula delação e tranca investigação em caso de Fecomercio e advogados

Decisão é consequência de determinação do STF que tirou caso das mãos do juiz Marcelo Bretas

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Rio de Janeiro

O juiz Marcello Rubioli, da 1ª Vara Criminal Especializada do Rio de Janeiro, arquivou a denúncia da operação E$quema S, que acusava advogados de tráfico de influência em tribunais com desvio de recursos públicos para favorecer Orlando Diniz, ex-presidente da Fecomercio.

O magistrado também trancou o avanço de qualquer investigação sobre o tema, anulou a delação de Diniz e teceu críticas às investigações conduzidas pela força-tarefa da Operação Lava Jato do Rio de Janeiro.

"[Em] Momento algum, quer das investigações, quer da delação cuja homologação ora se anula, houve referência ou afirmação de que a contratação de causídicos e suas bancas seria especificamente para influenciar em julgamentos de tribunais superiores. Houve suposições nesse sentido. O mesmo se diga aos fatos indicados como exploração de prestígio, eis que não há uma linha nos autos que indique qualquer cobrança para influência em julgados", escreveu Rubioli.​

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Orlando Diniz, ex-presidente da Fecomércio, é preso na Operação Jabuti, que investiga crimes envolvendo o ex-governador Sérgio Cabral - Reginaldo Pimenta - 23.fev.2018 / Raw Image/Folhapress

O juiz também repete na decisão a tese das queixas dos advogados alvos da operação. Ele afirma que as acusações "têm o nítido intuito de criminalizar o exercício da advocacia".

"Até como o próprio delator inquina inicialmente na delação até seu direcionamento, os contratos celebrados refletem avença sobre serviços advocatícios. Se os mesmos não foram prestados, ou não foram prestados a contento, é caso de ilícito civil e não fato a ser perseguido na esfera penal", afirmou o magistrado.

A Operação E$quema S, como foi chamada, foi deflagrada em setembro de 2020 e teve como alvos os advogados do ex-presidente Lula, Cristiano Zanin e Roberto Teixeira, acusados de liderar o esquema, e parentes de ministros do Superior Tribunal de Justiça e do TCU (Tribunal de Contas da União), entre eles Eduardo Martins, filho do atual presidente do STJ, Humberto Martins.

De acordo com o Ministério Público Federal, os denunciados desviaram R$ 151 milhões do Sistema S, que inclui instituições como Sesc, Sesi e Senac, bancado em parte com dinheiro público, arrecadado com contribuição compulsória de empresas.

A tramitação do caso foi interrompida um mês após a deflagração da operação por liminar do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Em agosto do ano passado, a Segunda Turma da corte confirmou o entendimento de que o juiz Marcelo Bretas, responsável por homologar a delação de Diniz, autorizar atos de investigação e aceitar a denúncia, não tinha competência para atuar no caso.

Prevaleceu o entendimento de que apurações sobre verbas vinculadas ao Sistema S são de competência da Justiça Estadual, para onde o caso foi encaminhado. Coube a Rubioli decidir sobre o destino do caso.

Zanin, principal alvo da operação, disse, em nota, que a sentença "resgata definitivamente a dignidade da advocacia ao colocar fim à perseguição praticada pela Lava Jato contra mim e contra diversos colegas advogados que prestaram serviços jurídicos à Fecomercio-RJ durante o intenso litígio que a entidade privada manteve com a congênere CNC".

"É mais um relevante ato para resgatar a credibilidade da Justiça após diversos atentados cometidos por ímprobos e delirantes agentes públicos que agiam sob a alcunha de ‘Lava Jato’", afirmou o advogado, em nota.

Cristiano Zanin Martins
O advogado Cristiano Zanin Martins, um dos alvos da operação E$quema S, arquivada pela Justiça - Denise Andrade/Divulgação

O MPF afirmou, em nota, que outras provas além da delação premiada corroboraram a denúncia.

"A denúncia foi acompanhada por um rol de mais de cem provas, inclusive auditoria do TCU e depoimentos de ex-dirigentes do Sesc e Senac, o que demonstra que a narrativa dada pelo colaborador não é fantasiosa", afirma a nota.

A Procuradoria criticou ainda a decisão que anulou a homologação do acordo de colaboração premiada de Diniz.

"Vários anexos da mesma colaboração continuam sendo utilizados no âmbito da Justiça Federal, inclusive por determinação do STF, razão pela qual a Justiça Estadual não tem competência para apreciar a validade do acordo, cabendo-lhe apenas apreciar os fatos que lhe foram declinados."

Parte da investigação foi baseada na delação de Orlando Diniz, presidente da Fecomercio, Sesc e Senac Rio por quase 20 anos. O empresário foi preso em 2018 na Operação Jabuti, sob acusação de participar da lavagem de dinheiro do ex-governador Sérgio Cabral.

O MPF afirmou que os advogados Cristiano Zanin, Roberto Teixeira e Ana Teresa Basílio formavam o "núcleo duro" da organização criminosa que supostamente desviou recursos do Sistema S do Rio de Janeiro.

Os escritórios dos três eram contratados para atuar em favor dos interesses pessoais de Orlando Diniz na disputa jurídica pelo controle do Sesc/Senac Rio iniciada em 2012. Embora atendessem aos interesses particulares do empresário na briga do Sistema S, o MPF afirma que os contratos com os defensores eram assinados com a Fecomercio, que não tinha relação direta com o caso.

Fazer os contratos e pagamentos em nome da Fecomercio tinha como objetivo, segundo os investigadores, fugir da fiscalização do TCU e da CGU (Controladoria-Geral da União) em relação aos gastos do Sesc/Senac, que recebem verba pública.

Em razão disso, as duas entidades —chamadas de paraestatais pela Procuradoria— devem respeitar regras semelhantes às de licitações públicas, ainda que com exigências específicas.

Boa parte do dinheiro para custear os serviços advocatícios, porém, tinha como origem justamente os cofres do Sistema S, por meio de um acordo privado entre as três entidades para rateio de despesas. Na prática, Sesc e Senac bancavam a maior parte desses contratos, segundo a Procuradoria.

Isso foi possível porque Diniz comandava as três entidades desde 2004. Um dos crimes, para o Ministério Público, era o uso do dinheiro público sem licitação e critérios para definição de preços.

Além disso, Zanin e Teixeira ofereceram, ainda segundo Diniz, uma "solução política" para o caso, sugerindo influência em decisões nos tribunais superiores, na avaliação dos procuradores. Essa atuação ocorreu, de acordo com a denúncia, através da contratação de outros escritórios ligados a ministros do STJ e do TCU.

O Ministério Público do Rio de Janeiro concordou que a denúncia não fosse ratificada, mas solicitou a reabertura de investigação sobre os serviços advocatícios supostamente não fornecidos. Rubioli, porém, rejeitou o pedido e decidiu trancar qualquer investigação.

"A jurisprudência vem entendendo que a não ratificação da peça já formulada opera arquivamento sobre os fatos e imputações lá contidas, exigindo provas novas para a tramitação das investigações", afirmou o magistrado.

O juiz também afirma que a investigação sobre os fatos, ocorridos entre 2012 e 2016, já transcorreu por muito tempo.

"Ora, de tudo o que dos autos consta não se apurou mais que a narrativa de uma associação de advogados que tutelavam as estratégias jurídicas de pretensão do então presidente do Sesc/Senac-RJ. Além disso, urge reconhecer, após tantos anos de colaboração espúria, investigação e medidas reconhecidas como ilegais, a irrazoabilidade no prazo da presente investigação", declarou o juiz.

Além disso, avaliou que há crimes prescritos e outros não identificados na investigação, motivo pelo qual trancou qualquer investigação sem fatos novos.

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