Descrição de chapéu Eleições 2022

Condução diferente da pandemia por Zema e Kalil vira tema na campanha em MG

Atual governador e ex-prefeito de Belo Horizonte tiveram posturas opostas; enquanto um priorizou medidas econômicas, o outro seguiu as recomendações científicas

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Carol Macário
Agência Lupa

Durante o período mais grave da pandemia da Covid-19, o governador Romeu Zema (Novo) e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD), ambos candidatos ao governo de Minas Gerais, adotaram narrativas e medidas diferentes na condução da crise sanitária.

Enquanto Zema, ainda no começo de 2020, criticou o fechamento do comércio e chegou a dizer que "o vírus precisa viajar", Kalil defendeu o isolamento e restringiu o funcionamento do comércio nos primeiros meses daquele ano.

As estratégias divergentes usadas pelos dois políticos, passados mais de dois anos, agora voltam ao centro do debate e pautam as críticas de um contra o outro na campanha eleitoral. A forma como cada um geriu a crise —um como governador do estado e o outro como prefeito da capital mineira— refletiu-se em números de casos e óbitos pela doença e foi também medida em rankings de eficiência.

O governador Romeu Zema e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil - Ane Souz/Folhapress e Divulgação/PSD

Em novembro do ano passado, um estudo feito pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) avaliou o desempenho dos estados no uso de evidências científicas para enfrentamento da Covid-19. Minas Gerais figurou entre as 15 unidades da federação cujas políticas de combate à pandemia não foram baseadas em evidências científicas (páginas 26 e 33).

Belo Horizonte figurou entre as cinco capitais que combateram a pandemia com mais eficácia, segundo pesquisa divulgada em setembro de 2021 pelo Instituto Votorantim. No mês seguinte, em outubro de 2021, um estudo do Imperial College London, da Inglaterra, destacou a cidade como a capital com menor mortalidade entre pacientes internados em hospitais com o novo coronavírus.

Também concluiu que cerca de 329 mil mortes pela doença poderiam ter sido evitadas no Brasil caso a pandemia tivesse sido conduzida nacionalmente da mesma forma como foi em Belo Horizonte.

Para o cientista político Thiago Silame, professor da Universidade Federal de Alfenas e pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), enquanto Zema esteve alinhado ao governo federal especificamente no entendimento de que a pauta econômica era mais importante, Kalil priorizou a adoção de protocolos de saúde pública, entre elas o distanciamento social.

"A gente não sabe se essa diferença vai influenciar nas eleições para o governo estadual. O mais grave da pandemia passou, a gente já não tem mais um número alto de mortes diárias e isso tem um efeito-memória", analisa o professor.

Ou seja, embora Belo Horizonte tenha se destacado como uma das capitais que melhor enfrentaram a Covid-19, o especialista entende que a campanha de Kalil terá que refrescar a memória da população se quiser tirar a diferença.

Isso porque Zema se desvencilhou do discurso do governo federal ao longo do caminho e reconheceu a gravidade da Covid-19. Com isso, sua gestão passou a ser mais bem avaliada. De acordo com a pesquisa mais recente do Datafolha, de 1º de julho, O governador lidera a corrida estadual com 48% das intenções de votos, seguido pelo prefeito da capital, com 21%.

As declarações de Zema

Ao analisar entrevistas de Zema durante a pandemia, a Lupa identificou que, embora o governador tenha se envolvido em polêmicas ao defender imunidade de rebanho, em 2020, e tratamento precoce, em 2021, o político procurou manter certa discrição sobre o assunto.

A primeira declaração polêmica foi em abril de 2020, quando o governador afirmou que "nessa crise nós precisamos que o vírus viaje um pouco". Ele foi criticado, na época, por infectologistas. Em junho de 2021, o político reconheceu que "foi uma declaração infeliz".

Em março de 2021, Zema disse, em uma entrevista ao jornal Estado de Minas, que "se não fosse o tratamento precoce, o colapso já teria acontecido". Na época, pesquisas já haviam sido feitas mostrando que, até aquele momento, não havia nenhum medicamento capaz de prevenir ou tratar precocemente o SARS–CoV-2. Dias depois dessa declaração, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais cobrou explicações da Secretaria de Saúde sobre o assunto.

Apesar do discurso similar ao do presidente Jair Bolsonaro (PL) em algumas ocasiões, o governador mineiro demarcou distância do chefe do Executivo e criticou a resistência de Bolsonaro ao uso de máscaras e as aglomerações provocadas por ele.

As declarações de Kalil

Alexandre Kalil, por outro lado, posicionou-se desde o começo da crise como alguém que "seguiria a ciência". Ele também defendeu o isolamento e fechamento do comércio. Ao jornal O Tempo, em março de 2020, Kalil disse que "nós aqui em Belo Horizonte fomos os primeiros a decretar [o fechamento de bares e comércios], porque é uma medida duramente impopular e ninguém teve a coragem de adotar antes".

A postura do prefeito foi criticada por Bolsonaro, foi alvo de protestos de empresários e foi um ponto de discordância com Zema, que chamou a prefeitura de BH de "fora da curva" em MG. Entre março de 2020 e abril de 2021, foram seis fechamentos e 16 flexibilizações na capital mineira.

Em dezembro de 2021,o ex-prefeito chegou a dizer que "existiu sim uma ditadura da medicina" e que "na época, nós não sabíamos, era uma loteria absoluta. Quem fala que sabia, não fala a verdade. Então tomamos o rumo absoluto da ciência".

Ainda que nas eleições municipais de 2020, quando Kalil concorreu à reeleição, as medidas de seu governo em BH tenham virado alvo de rivais, o empresário e ex-dirigente desportivo foi reeleito com 63,36% dos votos.

Números da Covid-19 em MG

Apesar das posições conflitantes, o estado e sua capital tiveram menos mortes, proporcionalmente, que seus pares. Segundo dados do Ministério da Saúde, em 31 de julho de 2022, Minas Gerais tinha uma média de mortes por Covid-19 de 297,1 por cada cem mil habitantes.

Embora seja altíssimo para os padrões mundiais —a média global é de 82,4 por cem mil—, o número está abaixo do patamar nacional, que está em 322,9 por cem mil. Todos os estados do Sudeste, do Sul e do Centro-Oeste tiveram desempenho pior.

Belo Horizonte, por sua vez, teve um número de mortes ligeiramente mais alto do que o resto do estado —315 por cem mil, segundo dados compilados pelo site G1. Com exceção de São Paulo, Florianópolis e Palmas, todas as capitais brasileiras tiveram um índice de mortalidade acima da média de seus respectivos estados.

Ainda assim, apenas sete capitais tiveram menos mortes causadas pela doença do que Belo Horizonte, proporcionalmente —e a única nessa lista que também está entre as dez cidades mais populosas do Brasil é Salvador, com 302,5 por cem mil.

Contudo, é importante pontuar que, em 2020, pesquisas apontavam para um alto índice de subnotificação no estado. O total de casos registrados naquele ano poderia ser dez vezes maior que o comunicado pela Secretaria Estadual de Saúde.

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