Lira aprova urgência de projeto que criminaliza institutos de pesquisas, mas base diverge

Votação é forma de o presidente da Câmara aumentar pressão sobre empresas que fazem levantamentos, em linha com a ofensiva do governo Bolsonaro

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Brasília

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aprovou nesta terça-feira (18) a urgência do projeto que pune e criminaliza institutos de pesquisa, mas não conseguiu acordo com partidos da base para votar o texto por divergências sobre o mérito da proposta.

O requerimento foi aprovado por 295 votos a 120 —precisava de pelo menos 257. Apenas PT, PSOL e Rede orientaram contra a urgência. MDB, PDT, minoria e oposição liberaram seus deputados. Os demais partidos orientaram a favor da votação.

A votação foi uma forma de Lira manter a pressão sobre os institutos de pesquisa, diante da falta de consenso de partidos como MDB, Republicanos e PSD em relação ao texto e em meio a ponderações sobre o fato de a análise ocorrer durante processo eleitoral.

A decisão de votar apenas a urgência foi tomada após reunião de Lira com líderes da base. Uma ala defendeu que o texto proibisse a divulgação de pesquisas nos 15 dias que antecedem as eleições; outro grupo queria punir civilmente —e não penalmente— institutos que divergissem duas ou três vezes acima da margem de erro do resultado do pleito.

Presidente Jair Bolsonaro e presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL)
Presidente Jair Bolsonaro e presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), após reunião no Palácio da Alvorada, em Brasília - Adriano Machado/Reuters

Na sessão, Lira afirmou que fez um compromisso com líderes da base e da oposição para conversar sobre o mérito do projeto. "Depois de o texto resolvido, ele vem ao plenário quando tiver com o mínimo de acordado possível."

Lira disse que se reuniria com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tratar deste assunto. "Não haverá açodamento, mas tem que haver um start com relação à disposição de trazer esse assunto com a urgência que ele requer, dado o histórico de três, quatro eleições com erros repetidos causando prejuízo à democracia brasileira."

Depois, em uma rede social, Lira falou em normatizar as pesquisas e disse ser "o primeiro passo para evitarmos possíveis distorções ou manipulações, aferindo dados mais próximos à vontade do eleitor."

Além da falta de consenso sobre o mérito, havia dúvidas se Lira votaria o texto, mesmo com a aprovação da urgência. Há uma avaliação de que isso poderia provocar desgaste desnecessário à Câmara, em especial após Pacheco declarar que a criminalização de pesquisas eleitorais a partir dos resultados das urnas é algo "absolutamente inadequado".

Segundo Pacheco, caso o projeto seja aprovado na Câmara e chegue ao Senado, ele terá que passar pela Comissão de Constituição de Justiça e ser amplamente debatido antes de ir ao plenário, o que dificilmente deve acontecer nesta legislatura.

O Senado tem freado a análise de propostas votadas a toque de caixa pelos deputados, como o Código Eleitoral, que também traz restrição à divulgação de pesquisas eleitorais.

Na semana passada, Lira manobrou para facilitar a votação do projeto no plenário, ao anexar o texto de Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, a uma proposição que já poderia ser analisada.

No entanto, em reunião no dia 11 com líderes da base governista, houve resistência à votação por parte de siglas como MDB e Republicanos. Assim, Lira decidiu adiar a apreciação do texto.

A aprovação da urgência seria uma forma de Lira manter a pressão sobre os institutos de pesquisa, em postura alinhada à do governo Bolsonaro. Na semana passada, o presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), Alexandre Cordeiro, e o ministro da Justiça, Anderson Torres, pediram investigações de institutos.

Cordeiro, ligado ao ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, enviou um ofício à Superintendência-Geral do Cade determinando a abertura de uma investigação contra os institutos, que, segundo ele, podem ter atuado como um cartel para "manipular" as eleições.

No mesmo dia, a Polícia Federal instaurou um inquérito, a pedido de Torres.

Em reação, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), decidiu barrar a instauração dos inquéritos sob alegação de ausência de justa causa e "incompetência absoluta" dos órgãos para uma apuração do tipo no período eleitoral.

O projeto de Barros, que se insere numa mobilização bolsonarista após o resultado do primeiro turno, faz parte de uma ofensiva para desacreditar os institutos com argumentos que ignoram características de levantamentos eleitorais.

O texto não leva em conta que pesquisas apontam tendências e a intenção de voto no momento em que pessoas aptas a votar são entrevistadas, sem a missão de antecipar o voto dado pelo eleitor.

O projeto de lei estabelece pena de prisão de 4 a 10 anos a quem publicar, "nos 15 dias que antecedem às eleições, pesquisa eleitoral cujos números divergem, além da margem de erro declarada, em relação aos resultados apurados nas urnas". Assim, a punição prevista na proposta pode ser maior do que a aplicada em casos de homicídio, cuja pena mínima é de seis anos de detenção.

Além de ignorar a natureza das pesquisas eleitorais, que não é a de antecipar o resultado das urnas, o texto de Barros pressupõe que a intenção de votos não terá mudanças nos 15 dias anteriores ao pleito.

Lira negou que o texto final votado pelos deputados será o de Barros e levantou dúvidas sobre como poderia ser feita a responsabilização penal em uma regulamentação de institutos de pesquisa.

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