Post engana ao sugerir fraude relacionada a inserções de propaganda eleitoral do PL em rádios

Também não é verdade que TSE admitiu falhas nos conteúdos

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São Paulo

É enganoso que ocorreram fraudes comprovadas nas inserções em rádios durante a propaganda eleitoral gratuita, como afirmam posts nas redes sociais. Também não é verdade que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) tenha admitido que houve erro. A acusação feita pela campanha de Jair Bolsonaro (PL) foi negada pelo órgão. De acordo com o órgão, a exoneração de um servidor de um cargo de confiança não teve relação com a denúncia de irregularidades na propaganda eleitoral.

Um trecho de um programa da Rádio Clube de Conquista, de Vitória da Conquista, na Bahia, em que o apresentador alega que foi confundido pela campanha do PT e, por isso, teria suprimido spots de Bolsonaro usados na peça de desinformação é verdadeiro. Porém, como verificado pelo Projeto Comprova, a própria rádio não assume que houve fraude, mas que o veículo foi induzido ao erro por falta de clareza da comunicação da campanha petista.

O caso da emissora é diferente dos casos a que se refere a denúncia feita pela campanha de Bolsonaro. Segundo Washington Rodrigues, diretor da rádio, eles acabaram colocando um direito de resposta petista quando a decisão estava suspensa por terem sido induzidos ao erro.

Foto a céu aberto mostra gramado com bloco suspenso em primeiro plano onde se lê "Tribunal Superior Eleitoral" e, ao fundo, prédio do TSE, com janelas espelhadas. Céu azul com algumas nuvens
Prédio do TSE, em Brasília - Lalo de Almeida - 6.jun.2017/Folhapress

A troca de emails entre a campanha e um funcionário da rádio, divulgada para o Comprova pela própria empresa radiofônica, mostra que a equipe de Lula enviou os spots que deveriam ser veiculados. Ao ser questionada em que momento deveriam ser exibidos, a equipe de Lula só respondeu que o mapa deveria ser obtido no site do TSE e que eles não poderiam mandar os horários.

O direito de resposta da coligação Brasil da Esperança, da candidatura de Lula, foi concedido no dia 19 de outubro pelo TSE. A primeira troca de emails é do dia 20 de outubro. A decisão concedia 164 inserções para Lula. No dia seguinte, no entanto, um recurso do presidente Jair Bolsonaro foi atendido pela ministra Maria Claudia Bucchianeri e a decisão foi suspensa.

Na troca de emails, a equipe da rádio perguntou à equipe de Lula, às 23h, se a decisão não tinha sido suspensa e recebeu uma resposta negativa. "Esse veto é referente a TV e não a Rádio", diz. No entanto, no dia seguinte, 21 de outubro, às 9h59, um novo email foi enviado pela equipe de Lula com a seguinte frase: "Acabamos de falar com o TSE e pode suspender o direito de resposta". No mesmo dia, no entanto, um novo email é enviado dizendo que a decisão que dava direito de resposta seguia valendo. Porém, o direito de resposta só voltaria a valer no dia 22 de outubro, quando o plenário do TSE decidiu favoravelmente para Lula, autorizando 116 inserções. Procurada, a equipe do petista não respondeu ao Comprova.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance

Até 2 de novembro, no Facebook, foram 650 mil visualizações e 33 mil curtidas. A publicação no Kwai foi apagada, mas alcançou 5.988 curtidas e 3.939 compartilhamentos até o dia 27 de outubro.

O que diz o responsável pela publicação

A reportagem entrou em contato com os responsáveis pelas publicações no Facebook e no Kwai. Nenhum deles respondeu até o fechamento desta checagem.

Como verificamos

A equipe do Comprova, primeiramente procurou na internet pela emissora que gravou o áudio. Pelas postagens nas redes sociais, foi possível identificar que o conteúdo era da rádio Clube de Conquista. Também pesquisamos na imprensa e no site do TSE a denúncia de que inserções do presidente Bolsonaro não teriam sido veiculadas e sobre o direito de resposta a que a gravação se refere. No site do TSE, foi possível consultar o processo sobre o assunto. Na página, a equipe também encontrou a nota do Tribunal sobre a exoneração do servidor Alexandre Gomes Machado. A reportagem entrou em contato com o Tribunal Superior Eleitoral, o Ministério Público da Bahia, a rádio Clube de Conquista e a assessoria de comunicação do PT. O partido não respondeu aos questionamentos até o fechamento da matéria.

Erro

O início do conteúdo verificado mostra um áudio que seria da Rádio Clube 98.1 FM. Na verdade, a gravação é da Rádio Clube de Conquista, da cidade de Vitória da Conquista (BA), que atua na estação 95.9 FM.

Washington Rodrigues, diretor do veículo, confirmou que a gravação é da rádio. A reportagem encontrou um vídeo mais longo do mesmo momento, que Rodrigues também atestou ser real. Foi solicitado o envio do áudio completo do programa, mas não foi enviado até a publicação desta checagem. Sobre o ocorrido, o diretor não fala em fraude por parte da campanha eleitoral petista, mas que a rádio foi induzida ao erro.

Durante a transmissão, realizada no dia 25 de outubro, apresentadores da rádio alegaram que a campanha do PT teria enviado diversas mensagens sobre inserção do direito de resposta favorável a Lula, concedido pelo TSE. Além disso, indica o veículo de comunicação, a campanha não foi clara sobre a aplicação, e a consequente suspensão, das mensagens que deveriam ser publicadas. Com isso, a rádio teria parado de veicular a campanha eleitoral de Bolsonaro por 12 horas.

"Saiu aquela decisão para dar direito de resposta para o Lula. Em seguida, saiu outra decisão para suspender. Teria um julgamento no sábado, e eles ficaram aqui na quinta e na sexta infernizando o email da rádio, dizendo que tinha que colocar, mandaram planilha, mandaram decisão e acabou induzindo. Durou pouco, durou 12 horas essa gracinha deles, mas induziu, sim, aqui, a rádio ao erro", afirma um apresentador.

Ele justifica dizendo que "não é muito difícil de induzir" ao erro porque as ações na rádio são muito dinâmicas e as propagandas, tanto as políticas quanto as comerciais, são enviadas diariamente. Os apresentadores comentam que a rádio confiou no partido porque presumiram que "um partido seja uma entidade que aja corretamente, principalmente no período eleitoral".

Para o Comprova, Rodrigues afirma que o caso Rádio Clube de Conquista é diferente das demais emissoras envolvidas nas questões das inserções. "Nós não deixamos de veicular inserções. Nunca deixamos de veicular as inserções. O que houve ali foi uma indução por parte da campanha do PT para que nós colocássemos o direito de resposta e isso acabou acontecendo por doze horas. Durante doze horas, nós colocamos direito de resposta, quando não era pra colocar", disse Rodrigues.

A rádio denunciou o ocorrido ao MPBA (Ministério Público da Bahia). Em nota, o órgão disse que ouviu o radialista da emissora, que prestou declarações e apresentou documentos. O material e as informações foram encaminhados, no último dia 26, para a PRE (Procuradoria Regional Eleitoral), que tem a competência de analisar e investigar os fatos, por se tratar de eleições gerais. O MPBA encerrou o documento dizendo que no Nuel (Núcleo Eleitoral), não havia recebido, até o dia 28 de outubro, denúncias relacionadas ao suposto "esquema de fraude" citado.

O Partido dos Trabalhadores foi procurado para esclarecer questões e apresentar seu posicionamento, mas não respondeu até a publicação da reportagem.

Sem falhas

A campanha de Bolsonaro denunciou para o TSE, no dia 24 de outubro, que rádios da região Nordeste teriam deixado de exibir inserções da propaganda eleitoral do candidato à reeleição. À imprensa, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, disse que Bolsonaro teve pelo menos 154 mil inserções a menos do que a campanha de Lula. Em resposta, o TSE pediu "provas e/ou documentos sérios" que pudessem comprovar a denúncia. A campanha de Bolsonaro, então, enviou à Corte Eleitoral um link que teria listado o resultado de uma auditoria contratada pela própria campanha. A denúncia foi rejeitada em 26 de outubro por não haver "qualquer indício mínimo de prova".

No dia seguinte à denúncia, o servidor do TSE Alexandre Gomes Machado, assessor de gabinete da Secretaria Judiciária da Secretaria Geral da Presidência, foi exonerado do cargo. Machado era responsável pelo recebimento das propagandas eleitorais e disponibilização delas no sistema do TSE. A exoneração foi publicada no Diário Oficial da União.

Questionado pela imprensa, o TSE disse que a exoneração fazia parte de "mudanças gradativas" na equipe do tribunal. De acordo com a Agência Brasil, integrantes do órgão afirmaram que a demissão faz parte de mudanças usuais na equipe devido ao fim do período de propaganda eleitoral na TV e no rádio. Na mesma semana, no entanto, Alexandre Gomes Machado procurou a Polícia Federal e prestou um depoimento no qual disse que foi demitido do tribunal por ter relatado a seus superiores irregularidades na veiculação das propagandas de Bolsonaro.

No mesmo dia, o TSE divulgou outra nota segundo a qual o servidor foi demitido devido a "reiteradas práticas de assédio moral, inclusive por motivação política, que serão devidamente apuradas". O tribunal também negou que Machado tenha feito alguma denúncia ao Tribunal sobre irregularidades. "Se o servidor, no exercício de suas funções, identificou alguma falha nos procedimentos, deveria, segundo a lei, ter comunicado imediata e formalmente ao superior hierárquico, sob pena de responsabilização", diz a nota.

Portanto, não há relação da exoneração dele com a denúncia feita pela coligação Pelo Bem do Brasil, de Bolsonaro, de que rádios no Nordeste teriam cortado suas inserções no horário eleitoral gratuito.

Acusação arquivada

Na quarta-feira (26), o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, negou o pedido da campanha de Bolsonaro e extinguiu o processo. Na decisão, Moraes acionou o procurador-geral eleitoral, Augusto Aras, para apurar "possível cometimento de crime eleitoral com a finalidade de tumultuar o segundo turno do pleito" por parte da campanha de Bolsonaro. O magistrado também acionou a Corregedoria-Geral Eleitoral para apurar se houve desvio de finalidade do uso do Fundo Partidário para contratação de uma auditoria e determinou que o caso fosse acrescentado no inquérito de milícias digitais no Supremo Tribunal Federal (STF).

"Não restam dúvidas de que os autores – que deveriam ter realizado sua atribuição de fiscalizar as inserções de rádio e televisão de sua campanha – apontaram uma suposta fraude eleitoral às vésperas do segundo turno do pleito sem base documental crível, ausente, portanto, qualquer indício mínimo de prova", disse o ministro.

Obrigação

O TSE não é responsável pela distribuição e fiscalizações das peças. O conteúdo veiculado é enviado por partidos, coligações ou federações a um grupo de emissoras responsável por gerar o sinal dos programas eleitorais. É de responsabilidade dos veículos de rádio e TV o planejamento para a divulgação dos programas conforme orienta a Justiça Eleitoral. Já a fiscalização é de competência dos partidos e coligações.

As rádios JM, de Minas Gerais, e Viva Voz, da Bahia, duas das que constam na denúncia feita pela campanha de Bolsonaro, disseram que as inserções de Bolsonaro não foram enviadas a tempo para serem veiculadas nas emissoras. Já a Rádio da Bispa (PE) disse que é vítima de "fake news".

Na sexta-feira (28), o ministro das Comunicações, Fábio Faria, admitiu profundo arrependimento de ter dado a entrevista para denunciar um suposto boicote às inserções.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. No atual momento, conteúdos que contêm desinformação sobre o atual presidente ou o eleito podem tumultuar a democracia.

A apuração desse conteúdo foi feita por Metrópoles, Correio Braziliense, Estadão e CNN Brasil e publicada em 2 de novembro pelo Projeto Comprova, coalizão que reúne 43 veículos na checagem de conteúdos virais. Foi verificada por Folha, GZH, A Gazeta, BandNews, Correio e Estado de Minas.

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