Tarcísio é empossado governador de SP, cita tucanos e agradece a Bolsonaro

Novo ocupante do cargo assume cargo após ciclo de 28 anos do PSDB e sinaliza diálogo com Lula

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São Paulo

O novo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tomou posse no cargo neste domingo (1º) em cerimônias na Assembleia Legislativa e no Palácio dos Bandeirantes, com discursos de pacificação, diálogo com o governo federal e gratidão ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que o lançou candidato.

Tarcísio, 47, fez o juramento, assim como o seu vice, Felício Ramuth (PSD), na Assembleia. Depois, o presidente do Legislativo, deputado estadual Carlão Pignatari (PSDB), declarou os dois empossados. O 64º governador de São Paulo assume depois de um ciclo de 28 anos do PSDB no poder.

Apoiado por Bolsonaro, ele ressaltou no início de seus dois discursos a gratidão ao presidente recém-saído e elogiou a gestão federal, mas se distanciou do radicalismo do padrinho ao sinalizar moderação e deixar de lado bandeiras de comportamento. Na economia, reforçou o ideário liberal.

Tarcísio de Freitas toma posse como governador de SP
Tarcísio de Freitas (Republicanos) toma posse como governador de SP - Zanone Fraissat/Folhapress

"Na política, inicio meus agradecimentos, como não poderia deixar de ser, pelo presidente Jair Bolsonaro, que me lançou este desafio, que enxergou o que ninguém havia enxergado naquele momento. Quanta ousadia", disse, enaltecendo o que caracterizou como formação técnica do antigo governo federal.

Tarcísio fez alusão indireta ao novo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ao dizer que "uma das palavras mais pronunciadas na política hoje é pacificação", mas que isso "demanda gestos e passa seguramente por retrospectiva crítica, que nos blinde de erros cometidos, mas também pelo reconhecimento de avanços".

Na sequência, ele enumerou o que considera avanços obtidos sob Bolsonaro, sobretudo na área econômica. Lula chega ao poder com uma proposta de conciliação, mas disse em seu discurso de posse em Brasília que o governo recém-encerrado deixa um cenário "estarrecedor" para o país.

"Apesar de todas as adversidades, o Brasil hoje está crescendo, criando empresas, gerando empregos, com a inflação em queda", disse Tarcísio, desfiando uma série de números e ações deixados pela gestão Bolsonaro. "Houve melhora fiscal real e estrutural, mesmo diante do desafio da pandemia."

O governador afirmou que a pacificação só pode ser alcançada com o cumprimento de promessas pelos eleitos e sinalizou diálogo com o governo federal, a partir de agora comandado por Lula.

"O que se espera é que não haja retrocessos em termos de qualidade do gasto, gestão fiscal e parcerias com a iniciativa privada. São Paulo e o Brasil precisam caminhar juntos. Um não prospera sem o outro", afirmou, prometendo ainda dialogar com outros setores, na contramão do radicalismo bolsonarista.

"O diálogo é construtor de pontes. É fundamental dialogar com os outros Poderes, com o governo federal, com a imprensa, mas, sobretudo, com os mais necessitados, com excluídos, com invisíveis."

Ao fim, em entrevista coletiva, o governador disse esperar uma relação "profissional, republicana e cordial" com o governo Lula. "Acredito no diálogo republicano, no diálogo franco", afirmou, relatando que todos os contatos que teve até agora com a equipe do petista foram "excepcionais, excelentes".

Tarcísio disse ter a certeza de que o estado será atendido quando procurar o governo federal, mas não descartou "fazer o contraponto quando for necessário", tendo em vista os interesses de São Paulo.

"Tenho certeza de que o novo presidente quer que o Brasil prospere, que vá bem, e para isso é preciso que o estado de São Paulo vá bem também", afirmou.

Tarcísio também fez referências à sucessão de governos do PSDB, afirmando ser necessário "preservar o legado herdado", mas avançar. "Legado não pode ser ignorado, pelo contrário", discursou, falando em melhorias nas áreas de moradia, mobilidade, educação, saúde e combate à pobreza.

Ele citou obras inacabadas do PSDB, mas reverenciou nomes históricos do partido ao citar falas de políticos como Mário Covas, Franco Montoro e José Serra.

"Será necessária a criatividade para aumentar significativamente o investimento em universalização do saneamento básico e, ainda assim, reduzir as tarifas, para concluir o Rodoanel ou a linha 17 [do metrô], para fazer o metrô alcançar mais pessoas ou para ver ligações ferroviárias saindo do papel", disse.

"Precisamos entregar as pequenas coisas, que mudam a rotina e fazem a diferença. Como dizia Franco Montoro: 'Minha maior obra é o conjunto das pequenas obras', ou Mário Covas: 'Penso que, às vezes, mais vale eliminar uma fila do que construir um viaduto'", acrescentou.

Em suas falas, Tarcísio citou como compromisso o desenvolvimento econômico e combate à pobreza. Prometeu combater a desigualdade e ouvir demandas populares. Disse defender o "Estado como prestador de serviços", o que exige valorização do funcionalismo. "Motivar o serviço público é um desafio."

Do lado de fora da Assembleia, Tarcísio foi celebrado por uma multidão de golpistas que está acampada ao lado da Casa Legislativa pedindo "intervenção militar" ao Comando Militar do Sudeste, em contestação à eleição de Lula. Quando o governador apareceu, um grupo cantou "Tarcísio, cadê você? Eu vim aqui só pra te ver" e o hino nacional.

Depois da etapa na Assembleia, com o juramento de cumprir a Constituição federal e a estadual e obedecer às leis, a comitiva foi para o Palácio dos Bandeirantes, onde a solenidade incluiu a posse dos 25 membros do secretariado e cumprimentos de políticos e apoiadores.

Em seu discurso na sede do governo, o novo governador repetiu trechos similares aos ditos no plenário do Legislativo, mas dedicou um espaço da fala para homenagear a esposa, Cristiane de Freitas, os filhos e os pais. Emocionado, enxugou lágrimas e teve que fazer pausas para seguir falando.

Assim como fez na Assembleia, ele agradeceu a Bolsonaro, no momento mais aplaudido do evento. O tom geral do evento foi comedido e formal, sem a presença de expoentes nacionais do bolsonarismo. Apoiadores do ex-presidente, entre eles deputados estaduais, compareceram.

Gilberto Kassab (PSD), que foi um dos articuladores da candidatura e virou operador político na formação do novo governo, teve a atuação exaltada por Tarcísio ao comentar a nomeação do aliado como secretário de Governo e Relações Institucionais. O ex-prefeito da capital foi bastante aplaudido.

Durante os dois atos, foi feito um minuto de silêncio em homenagem ao craque do futebol Pelé, recém-falecido. O governador deverá comparecer ao funeral do ex-jogador, nesta segunda-feira (2), em Santos.

Ao agradecer aos eleitores, que lhe deram 13,4 milhões de votos, Tarcísio fez referência ao fato de ter nascido no Rio de Janeiro, motivo de críticas de adversários. "A população de São Paulo me acolheu de forma muito carinhosa, nunca me perguntou de onde eu vim, preferiu apostar no 'para onde podemos ir'", disse.

"Entendemos o recado das urnas: vamos governar para todos, renovando a esperança de um futuro melhor, percebendo e explorando cada potencial do Estado, apostando na inovação, na tecnologia como arma poderosa para o crescimento e para a melhoria na prestação dos serviços."

O novo governador paulista passa a comandar o estado mais rico do país com situação financeira confortável (R$ 30 bilhões em caixa) e base política formada. Tem, no entanto, o desafio de equilibrar interesses de aliados, entre moderados e bolsonaristas, e avançar em suas promessas de privatização.

Após Rodrigo Garcia, que tentou a reeleição e foi derrotado, o PSDB deixa de comandar o estado onde venceu todas as eleições de 1994 a 2018. Rodrigo apoiou Tarcísio no segundo turno contra Fernando Haddad (PT).

O vice Felício Ramuth, 54, foi prefeito de São José dos Campos entre 2017 e abril de 2022, quando renunciou para disputar a eleição estadual. Inicialmente, ele tentaria a cadeira de governador, mas as negociações de seu partido, o PSD, levaram Ramuth a ir para a vice de Tarcísio.

A candidatura de Tarcísio foi patrocinada pelo ex-presidente Bolsonaro, que designou seu então ministro da Infraestrutura para concorrer em São Paulo, apesar de ele ter nascido no Rio de Janeiro e vivido em Brasília.

A vitória no estado foi também uma demonstração de força do bolsonarismo, que saiu derrotado na eleição nacional, vencida por Lula.

O novo governador terá ampla maioria na Assembleia Legislativa de São Paulo —os partidos que o apoiam somam 63 das 94 cadeiras da Casa. Os deputados da nova legislatura tomam posse em março.

TARCÍSIO É OFICIAL DO EXÉRCITO E FOI MINISTRO DE BOLSONARO

Tarcísio é oficial do Exército formado pela Aman (Academia Militar de Agulhas Negras) e serviu na missão de paz no Haiti. É graduado em engenharia civil e tem mestrado em engenharia de transportes pelo Instituto Militar de Engenharia.

Foi diretor-executivo e diretor-geral do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) no governo de Dilma Rousseff (PT). Depois, atuou como secretário do Programa de Parceria de Investimentos, durante os governos Dilma e Michel Temer (MDB).

Antes do Dnit, Tarcísio passou pela pela CGU (Controladoria-Geral da União), onde foi assessor da direção de auditoria e, depois, coordenador de auditoria. Foi também analista legislativo da Câmara dos Deputados. Em 2019, com o início do governo Bolsonaro, foi nomeado ministro da Infraestrutura, cargo que ocupou até março de 2022.

Em outubro de 2021, Tarcísio mudou seu domicílio eleitoral para São José dos Campos (SP). No primeiro turno, viralizou nas redes sociais uma entrevista em que ele não sabia indicar seu local de votação na cidade. Como mostrou a Folha, o ex-ministro não morava no endereço indicado como seu domicílio: um apartamento que alugou do próprio cunhado.

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