Anderson Torres afirma que minuta golpista era descartável e 'sem viabilidade jurídica'

Ex-ministro, que está preso, prestou depoimento à Polícia Federal nesta quinta-feira

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Brasília

Anderson Torres, ex-ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, afirmou em depoimento à PF nesta quinta-feira (2) que acredita ter recebido em seu gabinete no Ministério da Justiça a minuta de decreto que previa a imposição de estado de defesa no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Como a Folha revelou, a Polícia Federal encontrou na casa do ex-ministro, que depois se tornaria secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, uma proposta de decreto para o então presidente Bolsonaro instaurar estado de defesa na sede do TSE.

O objetivo, segundo o texto, era o de reverter o resultado da eleição, em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) saiu vencedor. Tal medida seria inconstitucional.

Sobre o documento ter sido encontrado em sua casa, ele disse que a sua assessoria separava duas pastas de documentos para sua análise e, em razão da sobrecarga de trabalho, levava todos os documentos da pasta para seu domicílio.

O ex-ministro da Justiça Anderson Torres - Adriano Machado - 15.jun.22/Reuters

"Os documentos importantes eram despachados e retornavam ao ministério, e os demais eram descartados", declarou Torres à Polícia Federal. Ele está preso há três semanas por ordem do Supremo Tribunal Federal.

Esse foi o primeiro depoimento dado à Polícia Federal. Logo após ser preso, o ex-ministro depôs em uma audiência de custódia, na qual disse que nunca questionou o resultado das eleições.

Posteriormente, houve dois depoimentos marcados à Polícia Federal. No primeiro, optou por permanecer em silêncio. No dia 23, acabou adiado para aguardar uma decisão do ministro Alexandre de Moraes.

No depoimento desta quinta, ele também afirmou considerar a minuta do decreto "totalmente descartável" e que se tratava de um documento "sem viabilidade jurídica". Disse ainda acreditar que uma funcionária de sua casa possa ter colocado o documento em sua estante.

"Não é por ter sido encontrado na estante é que teria importância; que na verdade já era para ter sido descartado: que deixa ressaltado que tecnicamente o documento é muito ruim, com erros de português, sem fundamento legal, divorciado da capacidade dos assistentes do Ministério da Justiça em produzir o documento", disse no depoimento, de acordo com a transcrição.

Também declarou não ter ideia de quem elaborou o documento, que nunca pediu para que fosse feito e que teria tomado conhecimento pela imprensa que outras pessoas receberam documentos de teor semelhante.

Acrescentou desconhecer as circunstâncias em que foi produzido e que tal documento não foi encaminhado para ninguém.

"Declara expressamente nunca ter levado tal documento ao conhecimento do então presidente Bolsonaro, que sua assessoria preparava sua pasta; que não tomou providências, pois ignorou completamente aquele escrito, eis que aquilo não tinha valor nenhum no seu entender", diz o depoimento.

Indagado a respeito da localização do seu aparelho celular, ele informou que não o deixou nos Estados Unidos, "mas o perdeu".

Ele contou que, com a decretação de sua prisão no Brasil, "passou a ser procurado por uma infinidade de pessoas, ocasião em que resolveu desligar o celular; que não sabe onde ele se encontra, mas pode fornecer a senha da nuvem".

Ele também disse que nunca houve uma conversa com o então presidente sobre a alternância de poder e que ouviu uma entrevista dele dizendo que caso perdesse a eleição iria respeitar o resultado das urnas, mas que, após eleição, Bolsonaro "passou a ficar introspectivo".

Porém disse que durante o mandato Bolsonaro questionava o método de apuração e que deveria ser mais transparente e, após a eleição, não foi questionado o resultado da eleição e percebeu que o presidente passou por um "processo de aceitação de sua derrota".

Indagado sobre sua opinião a respeito de possível fraude no processo eleitoral, respondeu que "particularmente não acredita e que esse assunto não era tratado pelo declarante como ministro da Justiça".

Sobre a sua participação em uma "live" com o ex-presidente Bolsonaro em julho de 2021, quando ele questionava a lisura do sistema eleitoral, respondeu que essa transmissão durou duas horas e apenas participou de cinco minutos do final para apresentar um documento público que tratava sobre medidas que garantiriam maior transparência ao sistema eleitoral.

O documento, segundo Torres, teria sido produzido em razão de um chamamento público do TSE para que organizações da sociedade civil e instituições pudessem opinar a respeito da higidez e segurança e melhorias do sistema eleitoral.

"O relatório que leu na live foi elaborado por peritos criminais federais que apontavam melhorias para o sistema eleitoral; que deixa consignado que esse chamamento público é realizado há muitos anos, e os relatórios anteriores dos peritos da polícia federal caminhavam no mesmo sentido."

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