Descrição de chapéu Governo Tarcísio Sabesp

Tarcísio recua de recuos e impõe no governo ações antes colocadas em dúvida

Na campanha, governador voltou atrás após críticas, mas acabou implementando sua agenda inicial

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São Paulo

Na campanha para o Governo de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) chegou a voltar atrás em promessas consideradas polêmicas, como privatizar a Sabesp e acabar com as câmeras nos uniformes de policiais. Uma vez eleito, porém, o governador ignorou os recuos e levou adiante sua agenda inicial.

A privatização da Sabesp, que Tarcísio quer aprovar na Assembleia Legislativa de São Paulo ainda neste ano, não aparece no plano de governo do então candidato, mas se tornou a principal bandeira da sua gestão.

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) fala com a imprensa após ataque na Escola Estadual de Sapopemba - Paulo Pinto - 23.out.23/Agência Brasil

O documento fala em "avançar na universalização de água tratada e coleta e tratamento de esgoto, antecipando a meta de universalização de 2033 para 2027, com melhoria da qualidade do serviço e tarifas justas".

Um dos argumentos do governo a favor da privatização é o de que a capitalização trará recursos para antecipar a universalização do saneamento no estado para 2029 sem aumentar a tarifa para o consumidor.

O plano, contudo, fala em conceder ativos como "os aeroportos de Congonhas, Campo de Marte e os portos de Santos e São Sebastião". A Sabesp não é mencionada.

Ainda em fevereiro de 2022, Tarcísio afirmou que iria privatizar a Sabesp. "Chegando lá, a gente vai vender a Sabesp, sim, vai vender a participação na Sabesp", disse em um evento que reuniu empresários e o setor de finanças.

"Eu acho que tem que privatizar a Sabesp porque você ganha eficiência, ganha governança e gera recursos, bota dinheiro pra dentro", completou.

Principal adversário de Tarcísio naquela corrida, Fernando Haddad (PT) passou a responder à proposta, afirmando que a venda da estatal provocaria aumento na tarifa. O candidato do Republicanos, então, mudou o discurso e declarou que iria estudar a privatização da estatal.

"Vou estudar privatização desde o primeiro dia. Se eu chegar à conclusão que a privatização vai promover esse objetivo, vai melhorar a prestação de serviços e proporcionar uma tarifa mais baixa, vamos seguir com a privatização. Mas se a gente observar que a privatização, em alguma medida, pressupõe risco à prestação de serviço, para o cidadão, não faremos", disse em outubro de 2022 à Rádio Eldorado.

No entanto, depois de vencer o segundo turno, Tarcísio declarou em dezembro que venderia a Sabesp, mas os estudos para avaliar a viabilidade da privatização só seriam contratados em abril deste ano.

"Vamos vender a Emae primeiro. Enquanto isso, a gente vai trabalhando naquela que vai ser a grande privatização do estado de São Paulo, que é a Sabesp. Pessoal atacava muito na campanha, dizendo que a conta de água ia aumentar. Mentira, vai diminuir", disse em um evento.

Na campanha, em dois debates, Haddad chegou a ironizar a oscilação de Tarcísio em relação ao tema.

"Você não fala o que você vai fazer. Eu acho que você vai privatizar porque você já falou que ia privatizar. Aí você falou que voltou atrás. Aí você voltou a falar que está pensando, mas a gente não sabe o que você quer fazer com o maior patrimônio estatal paulista", declarou o petista.

Em um dos debates, Tarcísio, ao fazer uma comparação com a Eletrobras, afirmou que a privatização traria investimentos e que a conta iria diminuir para o consumidor.

Outra promessa ruidosa, a retirada das câmeras dos uniformes dos policiais, também sofreu diversas reviravoltas. Na prática, embora o governador tenha desistido oficialmente da sua ideia, ele vem promovendo medidas que enfraquecem essa política.

Na visão do então candidato Tarcísio, as câmeras inibiriam o trabalho policial. O posicionamento recebeu diversas críticas de especialistas no tema e, internamente, até da própria polícia. O programa Olho Vivo fez parte de uma iniciativa que levou oito anos para ser colocada em prática e que era considerada um sucesso.

Diante da reação pública, Tarcísio passou a afirmar que decidiria, ouvindo especialistas e a polícia, se manteria ou não as câmeras. Seu plano de governo abria espaço para as duas interpretações: "Rever política das câmeras corporais".

"Considero que hoje a câmera inibe o policial, tem atrapalhado a produtividade, mas isso é uma percepção. O que a gente vai fazer se eleito? Chamar as forças de segurança e avaliar do ponto de vista técnico a efetividade ou não e o aperfeiçoamento da política pública. Não existe nenhuma política pública que não possa ser reavaliada, reconsidera", disse em outubro de 2022.

Eleito, afirmou que manteria o programa. "A questão das câmeras, eu fui mais crítico na campanha, agora vamos segurar. Vamos manter. Vamos ver o resultado e que ajustes a gente pode fazer", disse ele em dezembro.

O que se viu na prática, porém, foi diferente. Primeiro, a gestão descontinuou um estudo científico que tinha avaliado o impacto das câmeras corporais no comportamento de policiais militares em São Paulo.

No mês passado, em uma nova redução do programa, o governo cortou R$ 15,2 milhões do financiamento das câmeras corporais. Em agosto, o governo já havia retirado R$ 11 milhões.

Em 30 de outubro passado, Tarcísio afirmou não ter planos para comprar novas câmeras. A declaração vem no momento em que a letalidade policial cresceu 86% no terceiro trimestre no estado de São Paulo em comparação com o mesmo período do ano anterior.

Mais um caso em que Tarcísio acabou recuando do recuo foi na nomeação do seu concunhado Mauricio Pozzobon Martins. O governador chegou a nomeá-lo, desistiu após acusação de nepotismo, mas meses depois Martins assumiu outro cargo em órgão do estado.

No início do ano, Martins foi nomeado como assessor especial do governador. O STF (Supremo Tribunal Federal) estabelece que o nepotismo viola a Constituição Federal, o que abrange concunhados. Tarcísio afirmou que não sabia do veto e cancelou o ato.

No entanto, acabou se tornando em maio passado um dos membros do comitê de auditoria da Desenvolve SP, agência de fomento do governo. O concunhado foi eleito por um conselho de administração que inclui o presidente do órgão, indicado por Tarcísio, e representantes das secretarias estaduais.

Em setembro, a remuneração de Martins foi de R$ 16 mil.

Procurada pela reportagem, a assessoria do governo afirma que Tarcísio "está cumprindo rigorosamente o que disse ao longo de toda campanha eleitoral de 2022, em diversas entrevistas, sabatinas e debates" a respeito da Sabesp.

Ou seja, que "o modelo de governança da companhia seria objeto de estudos técnicos e que a desestatização seria uma opção caso se mostrasse vantajosa para a população".

Em nota, o governo diz ainda que o programa de câmeras "tem recursos garantidos para a manutenção dos 10.125 equipamentos atualmente em uso" e que "é incorreta a alegação da reportagem de que o programa esteja sendo cortado".

A respeito do concunhado de Tarcísio, a assessoria afirma que a posse de Martins foi "autorizada pelo Banco Central e está em acordo com a legislação" e que a eleição dele "cumpre os requisitos do regimento interno" da Desenvolve SP.


Veja momentos em que Tarcísio recuou de recuos

Privatização da Sabesp

  • Afirmação original: Em fevereiro de 2022, Tarcísio afirmou que privatizaria a Sabesp, argumentando haver um ganho de eficiência e mais recursos à companhia
  • Recuo: Após Fernando Haddad (PT), também candidato, afirmar que a proposta aumentaria a tarifa nas contas de água, Tarcísio passou a dizer que estudaria a desestatização, e caso gerasse risco ao cidadão, não a realizaria
  • Recuo do recuo: Eleito, Tarcísio voltou a dizer que venderia a Sabesp, mas primeiro privatizaria a Emae; afirmou ainda que a conta de água abaixará

Câmeras nos uniformes da PM

  • Afirmação original: Disse que as câmeras inibiriam o trabalho policial, e por isso, defendeu a retirada do equipamento, recebendo diversas críticas de especialistas no tema e até da própria polícia
  • Recuo: Com a repercussão negativa, o então candidato afirmou que decidiria manter ou não a política após ouvir especialistas; após eleito, o governador afirmou manter o programa, dizendo ser necessário avaliar primeiro o resultado da política pública
  • Recuo do recuo: O governo cancelou um estudo avaliando o impacto das câmeras no comportamento dos policiais em São Paulo; em agosto, cortou R$ 11 milhões do financiamento do equipamento; em setembro, foram R$ 15,2 milhões, e em 30 de outubro, Tarcísio disse não ter planos para comprar novas câmeras

Concunhado indicado

  • Afirmação original: Tarcísio nomeou Mauricio Pozzobon Martins, seu concunhado, como assessor especial do governador
  • Recuo: Depois cancelou o ato e disse não saber de súmula do STF que proíbe o nepotismo
  • Recuo do recuo: Pozzobon tornou-se um dos membros do comitê de auditoria da Desenvolve SP, eleito por conselho incluindo representantes das secretarias estaduais e pelo presidente da agência, escolhido por Tarcísio
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