Família Brazão, suspeitos de mandar matar Marielle, mantiveram influência política no Rio

Irmãos foram presos em operação da PF no Rio; Câmara referendou reclusão de Chiquinho

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Rio de Janeiro

Presos pela Polícia Federal sob suspeita de mandar assassinar a vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e o motorista Anderson Gomes em março de 2018, Domingos Brazão, conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio, e o deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil -RJ) fazem parte de uma família com forte influência política no estado do Rio de Janeiro.

Ao menos até meados deste mês, a família Brazão tinha indicados na Prefeitura do Rio de Janeiro e no governo estadual e representantes na Câmara dos Deputados, Assembleia Legislativa fluminense, Câmara Municipal da capital e de São João de Meriti.

Na operação deste domingo, além de Domingos e Chiquinho, a PF também prendeu o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil no Rio.

O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), empossa o deputado federal Chiquinho Brazão na secretaria de Ação Comunitária, em outubro de 2023; ele foi exonerado, mas mantém aliados na pasta - Divulgação

O deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil) chegou a assumir a Secretaria Municipal de Ação Comunitária da gestão Eduardo Paes (PSD) em outubro passado.

Ele foi exonerado em fevereiro deste ano, uma semana após a divulgação de que o líder do grupo havia sido citado nas negociações para delação premiada do ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime contra a vereadora e o motorista.

Segundo levantamento do gabinete do vereador Pedro Duarte (Novo), a secretaria mantinha 15 pessoas nomeadas durante a gestão de Chiquinho.

"O loteamento da prefeitura a grupos políticos só tem aumentado, e não é diferente com a família Brazão, mesmo após tudo o que repercutiu na imprensa", disse o vereador.

Neste mês, Domingos Brazão afirmou à Folha que a manutenção da influência de seu grupo político mostrava confiança dos aliados no Rio de Janeiro. "Quem convive na política fluminense não dá crédito a essas suspeitas. Isso até nos conforta. Nada tem mais força do que a verdade."

Ele disse na ocasião que seu cargo no TCE o afastou das negociações por cargos na administração pública, mas reconhecia que ainda participava de discussões do grupo político. "Conselheiro pode dar conselho. Não vou mais à rua. Mas a política está no nosso dia a dia."

Desde 2018 havia suspeitas sobre Domingos Brazão no caso. Pessoas ligadas ao conselheiro foram acusadas de tentar atrapalhar as investigações com uma falsa testemunha.

O próprio ex-deputado chegou a ser nomeado como mandante do crime contra a parlamentar pela ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge numa denúncia que o envolvia na tentativa de obstruir a apuração. Contudo a Justiça arquivou a acusação contra o ex-deputado.

O conselheiro sempre negou as acusações. Afirmou que já havia sido investigado por quase seis anos no caso e que nunca havia sido encontrado nada contra ele.

Procurados por meio de suas assessorias de imprensa neste mês, Paes e o governador Cláudio Castro (PL) não comentaram a influência do grupo em suas administrações. Chiquinho Brazão também não retornou.

Chiquinho foi nomeado em outubro no primeiro escalão da prefeitura como parte de um acordo com o Republicanos para o apoio à reeleição de Paes. Quatro meses depois, foi substituído pelo ex-deputado Ricardo Abraão (União Brasil).

Apesar da filiação à União Brasil, os dois vinham influenciando o Republicanos na capital para se transferir na janela partidária.

A nomeação gerou bate-boca na Câmara Municipal em dezembro, quando a Casa analisava as contas do ex-prefeito Marcelo Crivella (Republicanos). A base de Paes atuou pela aprovação para evitar rusgas com a sigla aliada.

A vereadora Mônica Benício (PSOL), viúva de Marielle, afirmou que a nomeação do secretário lhe causava "náuseas". "Queria dizer que estou surpresa, mas estaria mentindo. Para se manter no poder, o atual prefeito já deixou nítido que vale tudo, até se aliar com quem ele mesmo responsabilizou pela destruição do Rio de Janeiro."

O vereador Waldir Brazão (ex-chefe de gabinete do deputado estadual Manoel Brazão, irmão de Domingos) afirmou que a morte de Marielle era a "única pauta" da vereadora e saiu em defesa do grupo político na ocasião.

"O [ex-deputado Marcelo] Freixo prendeu um monte de gente na CPI das Milícias e a gente passou batido, como vem passando batido em tudo. A menos quando querem se aproveitar do nome que a gente tem. Do que a gente construiu. Toda vez que ela fizer isso, eu vou responder. Cada vez num grau maior", disse ele.

Mônica respondeu: "Sinto muito que o senhor tenha sido pressionado a vir ao microfone fazer esse tipo de fala. [...] Quem disse da possibilidade do envolvimento da família Brazão foi a Polícia Federal. Não fui eu. O final do processo está chegando. E aí os nervosos podem ficar mais nervosos ainda, porque é uma questão de tempo. [...] A execução dela irá transformar a política e o submundo do Rio de Janeiro quando a revelação dos nomes dos mandantes e todos os envolvidos chegarem ao conhecimento público".

No governo estadual, o grupo mantém como área de influência a Companhia Estadual de Habitação. O diretor financeiro da estatal é Flávio Brazão, sobrinho de Domingos e filho de Pedro. O vice-presidente da estatal, Guilherme Bencardino, também se apresenta como um dos representantes da família em suas redes sociais.

Bencardino afirmou, em nota, que atua em cargos da administração pública há 13 anos e que tem formação acadêmica na área. "Qualquer relação política que mantenha fora da instituição não interfere no trabalho desempenhado e nem determinou sua nomeação para o posto."

Flávio não comentou. Domingos defendeu neste mês a nomeação dos dois. "Você precisar ver o currículo deles. Os dois estudaram e se aperfeiçoaram. Meu sobrinho deve ter umas dez pós-graduações."

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