Apontado como assassino de Marielle, Ronnie Lessa faz acordo de delação

Colaboração está no STJ e é a segunda desde que Polícia Federal assumiu investigação da morte da vereadora e do motorista Anderson Gomes

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Rio de Janeiro

O ex-policial militar Ronnie Lessa fechou um acordo de delação premiada no inquérito que investiga a morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. O caso corre em sigilo no STJ (Superior Tribunal de Justiça), e a colaboração ainda precisa ser homologada pela corte.

A informação da delação de Lessa foi dada pelo colunista Lauro Jardim, de O Globo, e confirmada pela Folha. No tribunal, a delação está a cargo do ministro Raul Araújo.

Marielle e Anderson foram mortos em 14 de março de 2018 no Estácio, centro do Rio de Janeiro, após o carro em que estavam ser atacado a tiros. Um ano após o crime, Lessa e Élcio de Queiroz, que também é ex-policial, foram presos. O primeiro foi acusado de ser o autor dos disparos, enquanto o segundo, de dirigir o veículo usado no assassinato.

Marielle é uma mulher negra, com cabelos cheios e loiros. Ela discursa em um púlpito da Câmara
A vereadora Marielle Franco foi morta a tiros em março de 2018 - Câmara Municipal do Rio

A delação de Lessa é a segunda a ser feita para chegar ao mandante do crime desde que a Polícia Federal assumir o caso. Em julho do ano passado, Queiroz firmou um acordo de colaboração, confessou sua participação no crime e deu detalhes sobre a noite em que a vereadora foi morta.

A delação que Queiroz fez o caso avançar após cinco anos sem respostas sobre quem mandou matar Marielle. Após o depoimento do ex-PM, o investigadores chegaram a novas suspeitas de envolvimento de Domingos Brazão, conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado do Rio).

Como Brazão tem foro privilegiado, o inquérito foi enviado ao STJ em outubro do ano passado. A Folha tentou contato com a defesa do conselheiro, mas, até o momento, não obteve retorno. Em outras ocasiões, o ex-deputado sempre negou qualquer ligação com o crime.

Segundo o site Intercept Brasil, na nova delação, Lessa apontou Brazão como um dos mandantes da morte da vereadora.

O ex-deputado já havia sido citado em investigações passadas sobre o caso. Em 2019, um relatório da PGR (Procuradoria Geral da República) pediu que o conselheiro fosse investigado como possível mandante do crime. Ele também foi denunciado sob suspeita de tentar atrapalhar as investigações.

Os investigadores ainda não conseguiram esclarecer de forma definitiva os motivos que teriam levado o Brazão a mandar matar a vereadora.

Para que a delação de Lessa seja homologada, é preciso que o que foi dito por ele seja provado pelos investigadores do caso. O acordo de colaboração foi negociado no final do ano passado.

Procurado, o advogado de Lessa, Bruno Castro, disse desconhecer sobre a delação do cliente e afirmou que deixará o caso assim que for informado do acordo de colaboração.

"Por ideologia jurídica não atuamos para delatores", afirmou.

Castro afirmou que seu cliente tinha preocupações com a família caso viesse a falar sobre o assassinato da vereadora. "A única coisa que ele me disse, há uns dois ou três anos, é que ele sabia quem tinha matado a Marielle. Mas afirmou que, se falasse, a família dele morreria", disse o advogado. "Acho que ele nunca comentou [sobre o interesse de fazer a delação] por saber que meu escritório não faz esse tipo de acordo."

A preocupação com a família também foi uma questão para Élcio de Queiroz quando firmou sua colaboração, no ano passado. Uma das contrapartidas pedidas por ele foi que seus parentes passassem a ter uma segurança reforçada.

Queiroz também foi transferido de presídio após a colaboração. Ele estava no presídio federal em Brasília e foi para o Complexo Penitenciário da Papuda, também no Distrito Federal.

Estratégia da PF

Em nota na noite desta terça (23), a PF também criticou a circulação de notícias sobre a delação. "A divulgação e repercussão de informações que não condizem com a realidade comprometem o trabalho investigativo e expõem cidadãos", declarou.

Ressaltando que as apurações estão sob sigilo, a corporação diz que vem conduzindo o caso há cerca de 11 meses e que, desde então, "ocorreu uma única delação na apuração do caso, devidamente homologada pelo Poder Judiciário".

Nos bastidores, porém, há avaliação dentro da Polícia Federal de que o caso Marielle só será concluído com os depoimentos dos envolvidos. A justificativa para isso é que, como já se passaram quase seis anos do assassinato, muitas das provas não existem mais.

Em um relatório feito após a colaboração de Élcio de Queiroz, a PF citou falta de registros telefônicos dos suspeitos e de imagens do entorno do crime como "limites intransponíveis" para a investigação.

Essa avaliação se baseia também na própria delação de Queiroz, que possibilitou a prisão do ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, conhecido como Suel, como uma das pessoas que participaram da campana para monitorar Marielle.

Segundo fontes a par da investigação ouvidas pela Folha, Suel chegou a ser sondado pela PF para firmar um acordo de delação no final de novembro do ano passado. Porém, as conversas não foram adiante, pois Lessa decidiu colaborar.

A viúva de Marielle, a vereadora Monica Benicio (PSOL-RJ), afirmou nas redes sociais que vê com preocupações o vazamento de informações que possam comprometer o andamento do caso.

"Aguardamos com esperança que a delação de Ronnie Lessa apresente de fato novos elementos probatórios que representem um avanço significativo na busca por justiça. No entanto, é necessário ressaltar que, até o momento, não houve atualizações oficiais por parte das autoridades envolvidas, e a delação ainda precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça para confirmar sua validade", disse.

Também nas redes, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que, com a delação de Lessa, "cessa a narrativa descomunal e proposital criada por grande parte da imprensa e pela militância da esquerda". Ele e Lessa eram vizinhos no condomínio Vivendas da Barra, no Rio de Janeiro.

Bolsonaro afirmou ainda que comentará o assunto no domingo (28) em uma live.

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