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Eleições 2024 Datafolha

Polarização embaralha cartas da eleição em São Paulo

Empate frustra ilusão de favoritismo de Boulos e joga Nunes no colo de Bolsonaro

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Moscou

A nova pesquisa do Datafolha sobre a corrida eleitoral em São Paulo mostra a extensão do impacto da polarização que assola o Brasil desde que a centro-direita se organizou em torno do polo radicalizado encarnado em Jair Bolsonaro (PL) em 2018.

As cartas estão bastante embaralhadas, mas sua disposição na mesa sugere um cenário hoje mais favorável em termos de condições puramente eleitorais para o prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Os candidatos a prefeito líderes da pesquisa do Datafolha, Guilherme Boulos (esq.) e Ricardo Nunes
Os candidatos a prefeito líderes da pesquisa do Datafolha, Guilherme Boulos (esq.) e Ricardo Nunes - Marlene Bergamo/Folhapress

De certa forma, o empate registrado entre o alcaide e o postulante Guilherme Boulos (PSOL) mostra na pesquisa o que as ruas mostraram no dia 25 de fevereiro, quando milhares de apoiadores de Bolsonaro foram à avenida Paulista: eles estavam lá não só pelo enrolado ex-presidente, mas pelo conservadorismo tornado antipetismo.

A aposta envergonhada de Nunes pelo lado que está sob fogo da Justiça, simbolizada por sua presença muda no palanque da Paulista, deverá dar lugar a um maior cacife do grupo do ex-presidente no pleito municipal.

Por óbvio, o risco para Nunes está dado pelos problemas que Bolsonaro enfrentará, provavelmente sendo réu por atentado contra o Estado democrático de Direito ou algo similar durante a campanha. Mas mesmo isso tem limites.

O eleitorado que segue os carismáticos, como o presidente Lula (PT) e Bolsonaro, tende a descartar tais acusações como mera perseguição política. Foi assim com o petista, que amargou 580 dias na cadeia com uma claque fiel à porta da Polícia Federal de Curitiba só para voltar ao Planalto na sequência.

Assim, os rolos nada desprezíveis de ex-mandatário podem, ao fim, não respingar tanto em Nunes. A estratégia defendida por seu consultor Michel Temer (MDB) à Folha na semana passada se encaixa aí. "Ele está atrás dos bolsonaristas, não do Bolsonaro", disse o ex-presidente em Dubai.

Resta evidentemente saber como se comportará o eleitorado ante a previsível onda de denúncias de malfeitos da gestão Nunes, mais palpáveis e menos ideológicas. Até aqui, não houve efeito.

Se desenha uma disputa acirrada, mostrando que a divisão do eleitorado entre petistas e bolsonaristas apontada reiteradamente pelo Datafolha segue ditando a política em vários níveis, apesar do evidente apelo de questões paroquiais, o proverbial buraco de rua tapado —a melhoria da avaliação de Nunes corrobora o peso disso.

Para Boulos, o Datafolha é um balde de água fria, particularmente entre seus apoiadores que vinham cantando vitória antecipada dado o engajamento sem precedentes de Lula em sua campanha.

Eles partiam de premissas corretas. Desde que a então petista Luiz Erundina ganhou o pleito de 1988, um biorritmo se instalou na cidade: a cada prefeito de esquerda, dois de centro-direita. Por esse pêndulo, 2024 deveria coroar a volta de um esquerdista ao viaduto do Chá.

Engordava o raciocínio o desenho eleitoral de 2022, quando Lula venceu Bolsonaro no segundo turno na capital por uma margem algo maior do que a sua votação geral, marcando 53,45%.

A alta rejeição ao deputado federal, o preço que ele paga pela imagem de radical, é outra péssima notícia para sua campanha. Não é um índice fatal, aos 34%, mas avançou ante o levantamento anterior, ainda que não seja exatamente comparável devido à cartela diferente de opções ao eleitor.

O já ganhou que se ensaiava em setores da campanha de Boulos terá de ser revisto, assim como o pessimismo de aliados da ampla frente montada em torno de Nunes. O prefeito é visto como um produto eleitoral de difícil vendagem e o temor era o da repetição de um Geraldo Alckmin em 2018, ou de um Rodrigo Garcia em 2022.

Significativo nesse cenário é a anemia das opções de terceira via. A mais promissora na teoria, Tabata Amaral (PSB), ficou para trás na largada, após se mostrar na casa dos dois dígitos no ano passado. Kim Kataguiri (União Brasil) não deverá ter legenda.

É assim didático como o empate entre os líderes segue o mesmo quando ele e a deputada federal deixam a paleta de candidatos. Já o curioso caso do bom desempenho de Marina Helena (Novo), uma provável confusão do eleitor com Marina Silva, necessita de mais tempo para ser analisado.

Tabata, um experimento de Alckmin no seu ensaio de disputar pelo Bandeirantes em 2026, por ora está espremida pelos polos da eleição. Em favor de sua postulação está o fato de que ela nada perde com a exposição, ao contrário: é jovem, produto com potencial "storytelling" e ainda bastante desconhecida.

Nenhum dos dois lados na liderança fará bem, contudo, se acreditar que a sorte está selada, não menos porque surpresas sempre podem ocorrer. Mas a única vitoriosa até aqui é a polarização, para o sorriso de Lula e Bolsonaro, que se mantêm como magnetos de um país cindido.

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