Relatório que expõe Moraes mobiliza bolsonaristas, mas governo e base minimizam

Presidente do Congresso minimizou episódio durante reunião fechada com líderes e defendeu regulamentação das redes

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Brasília

O governo do presidente Lula (PT) e parlamentares da base buscaram minimizar o impacto da divulgação de decisões sigilosas do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes em que determina a derrubada de perfis nas redes sociais.

A visão de membros do governo é a de que se trata de um factoide, que pode provocar um alvoroço na base bolsonarista, mas sem efeitos práticos.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes - Pedro Ladeira - 6 mar. 24/Folhapress

Integrantes do governo optaram por não comentar publicamente o episódio, justamente pela avaliação de que o assunto não terá grandes desdobramentos.

A análise interna é a de que a divulgação do relatório pela comissão do parlamento americano será explorada por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL), em particular na mobilização para a manifestação prevista para ocorrer no próximo domingo (21), no Rio de Janeiro.

Um interlocutor do governo disse que a divulgação das decisões não terá nenhum efeito prático e que pode se voltar contra bolsonaristas, considerando que o documento volta a colocar em evidência mensagens golpistas.

Após a divulgação dos documentos, parlamentares da oposição passaram a discutir apresentar novos pedidos de impeachment contra Moraes. Segundo relatos, o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) começou a procurar os colegas para colher assinaturas.

Há a avaliação entre os próprios membros da oposição, no entanto, de que esse tema não deverá comover outros setores da Câmara –mas apostam numa mobilização da militância para pressionar qualquer iniciativa no Congresso.

A deputada Carla Zambelli (PL-SP), por sua vez, disse acreditar que isso pode ser encampado por parlamentares de centro e gerar o "reposicionamento de vários membros do Congresso", porque, na avaliação dela, Lula e Moraes estão enfraquecidos.

"Deve haver um posicionamento do Pacheco e do Lira para fortalecer o Legislativo. Finalmente entenderam que a gente estava vivendo um papel terciário, nem secundário, no que tange a definição do que está acontecendo no Brasil. As pessoas do centro estão vendo isso, não são bobos", afirmou à Folha.

A divulgação do relatório mobilizou nas redes sociais aliados de primeira hora de Bolsonaro.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, compartilhou foto do documento e escreveu que "se as redes sociais fossem regulamentadas jamais veríamos o rei nu como estamos vendo", referindo-se a Moraes. Em outra publicação, afirmou que "o jogo está apenas começando".

A deputada Bia Kicis (PL-DF) compartilhou a notícia dizendo que os documentos "comprovam que o Judiciário brasileiro forçou o X a censurar perfis".

Já o senador Marcos do Val (Podemos-ES), um dos alvos de Moraes citados no relatório americano, divulgou o documento por meio de seu WhatsApp —ao qual têm recorrido desde que teve todas as demais redes sociais bloqueadas, em junho do ano passado.

O senador disse em uma das mensagens enviadas à imprensa que entregou parte da documentação divulgada e repetiu, falsamente, que houve participação do governo Lula no ataque aos três Poderes, em 8 de janeiro.

Aliados do presidente no Congresso, por outro lado, aproveitaram a divulgação do relatório para criticar Musk e afirmar que se trata de uma estratégia da extrema-direita para atacar as instituições.

"É urgente botar um paradeiro nessa escalada contra nosso país e nossas instituições. A liberdade que eles proclamam é exclusivamente para oprimir e se impor", escreveu nas redes sociais a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR).

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também minimizou a divulgação durante a reunião de líderes desta quinta e voltou a defender a regulamentação das redes, segundo relatos feitos à reportagem.

O tema foi levantado pelo senador bolsonarista Eduardo Girão (Novo-CE) —que usou a tribuna do Senado na semana passada para agradecer a Musk em inglês por "apoiar a liberdade de expressão" no Brasil.

Pessoas que estavam presentes afirmam que o presidente do Senado teria cortado logo de início a abordagem de Girão. Teria dito também que a oposição prega gestos do Supremo para pacificar a relação, mas não demonstra estar disposta a fazer o mesmo.

Pacheco inclusive teria cobrado que não houve nenhuma manifestação em sua defesa quando foi divulgada a minuta do golpe, sendo que ele era um dos alvos de uma possível prisão.

O presidente também afirmou que um dos problemas da falta de regulamentação é a exposição de crianças. Procurada, a presidência do Senado não quis comentar os termos da conversa durante a reunião de líderes.

O discurso de Pacheco a favor da regulamentação foi reforçado pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA), um dos vice-líderes do governo na Casa, de acordo com relatos dos participantes.

Apesar da divulgação ocorrer em um momento em que há um acirramento entre o Legislativo e o Judiciário, cardeais do centrão dizem que isso serve para compor a narrativa da oposição de que há censura nas redes sociais na tentativa de mobilizar a sua militância —mas que o grupo não deverá aderir a esse movimento.

Parlamentares afirmam que o que pode mobilizar os deputados numa ofensiva contra o STF são questões como a discussão do foro privilegiado e medidas que restrinjam operações da Polícia Federal no Congresso. Mas reconhecem que esse movimento deve ser coordenado com o Senado para prosperar.

Eles pontuam também que o encontro de Moraes e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), nesta semana, pode ter contribuído para um distensionamento desse embate com o Judiciário.

Há também a avaliação compartilhada por deputados governistas e do centrão de que esse foi um assunto suscitado por parlamentares estadunidenses, e que a Casa não pode chancelar uma movimentação que venha de "fora para dentro".

"Da mesma forma que os parlamentares brasileiros não têm o poder de interferir numa decisão da Suprema Corte americana, os parlamentares americanos também não têm direito de interferir aqui", diz à Folha o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), coordenador da frente parlamentar Brasil-Estados Unidos.

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