Descrição de chapéu Eleições 2024

Campanha de Marçal tem beneficiária de moradia social no topo de doações

Outras doações de R$ 25 mil chamam atenção após influenciador ter sido alvo da PF sob suspeitas em 2022; procurado, candidato não se manifestou

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São Paulo

Enquanto moradora do Jardim Lidiane, favela rente à marginal Tietê, no Limão, zona norte de São Paulo, Danecleide Claudia da Silva constava na lista de pessoas que receberam auxílio-aluguel até março de 2022, quando foi selecionada como beneficiária de um conjunto habitacional.

Dois anos e meio depois, ela é, atualmente, uma das maiores doadoras de campanha de Pablo Marçal (PRTB). Segundo consta no registro, fez um Pix de R$ 25 mil no último dia 27.

As doações de Danecleide e de outros apoiadores de Marçal, também no valor de R$ 25 mil, aparecem entre as mais vultosas na página do candidato na Justiça Eleitoral, ao lado de contribuições do bilionário Helio Seibel e do empresário Helvio Paulo Ferro Filho, que doaram R$ 100 mil cada.

Candidato sorri e faz gesto com a mão em alusão à letra M ao lado de apoiadores
Candidato Pablo Marçal (PRTB) chega para participar de debate na TV Gazeta - Bruno Santos - 1.set.24/Folhapress

As cifras chamam atenção num contexto em que o influenciador já foi alvo de uma operação da Polícia Federal, em julho do ano passado, sob suspeita de falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e apropriação indébita nas eleições de 2022, quando foi pré-candidato à Presidência da República e candidato a deputado federal, mas acabou tendo o registro indeferido pela Justiça Eleitoral.

Segundo a apuração da PF, Marçal e um sócio dele fizeram doações à campanha do influenciador e parte desses valores foi remetida às próprias empresas das quais são sócios por meio do aluguel de veículos e aeronaves.

Marçal afirma que não praticou ilícito e que a campanha não foi paga com dinheiro público, mas com doações e recursos próprios. Em relação às doações de 2024, a campanha do candidato foi procurada, mas não se manifestou até a publicação desta reportagem.

Nesta eleição de 2024, Marçal já recebeu R$ 1,28 milhão em doações de pessoas físicas. O valor doado por Danecleide é o quarto maior recebido pelo influenciador. A lei eleitoral determina que doações de pessoas físicas não podem ultrapassar 10% dos rendimentos brutos do doador no ano anterior à eleição.

Antes de ser selecionada no programa de urbanização municipal para a população de baixa renda, ela abriu, em 2020, uma pequena loja de roupas com capital declarado à Junta Comercial de R$ 10 mil na casa de fundos onde morava, na mesma favela.

Hoje, ela vive com o marido em um sobrado de cerca de 120 metros quadrados e avaliado em R$ 600 mil na Freguesia do Ó, na zona norte.

Antiga casa de Danecleide da Silva, no Jardim Lidiane, favela localizada rente à marginal Tietê, no Limão, zona norte de São Paulo
De verde, ao centro, antiga casa de Danecleide da Silva, no Jardim Lidiane, favela localizada rente à marginal Tietê, no Limão (zona norte de SP) - Carolina Linhares/Folhapress

A reportagem esteve na casa da doadora na manhã desta terça-feira (3) e foi informada por sua irmã de que ela tinha saído da residência para procurar emprego. Em contato por telefone, seu marido confirmou a doação, mas desligou sem dar detalhes. "Não vou responder por ela. Ela não quer saber sobre esse negócio não, ela só fez lá, mas não quer saber não", disse.

Além de Danecleide, Mariana Guimarães dos Santos também fez um Pix de R$ 25 mil para a campanha de Marçal no último dia 25, de acordo com os dados da Justiça Eleitoral.

Atualmente moradora de Barueri (SP), Mariana trabalha como gerente financeira da empresa de Marcus Marques, mentor e acelerador de empresas. Goiano assim como Marçal, ele é filho de José Roberto Marques, um dos pioneiros do coaching no Brasil.

Ela também tem uma microempresa de treinamento profissional registrada em uma casa na periferia de Goiânia e recebeu, entre 2020 e 2021, um total de R$ 5.250 em auxílio emergencial do governo federal. Procurada, Mariana disse "não ter interesse em reportagem".

Como Marçal, ela migrou de Goiânia para Barueri, onde fica o Alphaville, bairro em que o influenciador tem uma mansão e concentra suas empresas. Conforme mostrou a Folha, a região se tornou uma meca do mercado da nova autoajuda.

O terceiro doador de R$ 25 mil também orbita o mundo digital de Marçal e recebeu auxílio emergencial na pandemia —R$ 4.200 no total. Vitor Augusto Ferreira Alonso fez o Pix no último dia 25.

Até o fim de 2022, ele era dono de uma microempresa de produtos digitais em Brasília. No ano seguinte, abriu uma nova empresa de consultoria em tecnologia da informação com capital social de R$ 20 mil em Alphaville Empresarial.

Questionado pela Folha, Vitor afirmou ter feito a doação de R$ 25 mil para Marçal, mas disse que o auxílio emergencial foi pedido em seu nome sem que ele soubesse. Falou ainda que fez um boletim de ocorrência e devolveu os valores. O empresário declarou não conhecer Marçal.

Já Thierry Campos doou R$ 10 mil no último dia 17. Ele recebeu R$ 4.200 em auxílio emergencial em 2020 e já teve duas empresas do ramo pet registradas em Jundiaí (SP).

Em fevereiro deste ano, Thierry fechou dois acordos em ações de cobrança movidas por bancos —ofereceu pagar R$ 22 mil para quitar uma dívida de R$ 80,8 mil e R$ 8.000 para quitar outra de R$ 28 mil. Nos processos, são listados dois endereços do empresário, uma casa simples e um imóvel às margens de uma estrada em Várzea Paulista (SP).

Questionado pela reportagem Thierry afirmou não ter recebido auxílio e ter doado por agradecimento. "Aprendi muita coisa com Pablo [Marçal] quando ainda era classe baixa e hoje sendo próspero resolvi ajudar na campanha."

Pouco antes de ser selecionada no programa de moradia social, Danecleide e o marido, Willian da Silva Cardoso dos Santos, foram investigados, em 2021, pela Divisão de Crimes Cibernéticos da Polícia Civil de São Paulo. Condenado em primeira instância pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Santos é acusado de integrar organização criminosa que praticava estelionato contra idosos.

O caso lembra a condenação de Marçal por furto, em 2010, acusado de participação em uma quadrilha especializada em invadir contas bancárias pela internet e que mirava especialmente aposentados.

Como revelou a Folha, a investigação da Polícia Federal afirma que, além de fazer a manutenção dos computadores da quadrilha, Marçal operava um programa responsável por captar emails para os quais seriam enviados spams. Por meio deles, a quadrilha fisgaria dados das contas bancárias das vítimas.

Registrada como taxista pela Prefeitura de São Paulo, Danecleide tem cinco veículos registrados em seu nome —Land Rover Evoque, Honda HR-V, Chevrolet Onix, Volkswagen Virtus e Hyundai HB20, este último na cidade de São José do Rio Preto (SP).

Ela responde, porém, a três processos em que instituições financeiras pedem a busca e apreensão de três veículos por falta de pagamento do financiamento. O valor das causas soma R$ 261 mil.

Em nota, a defesa de Willian afirmou que ele e a mulher "não possuem quaisquer envolvimentos com atividades ilícitas". O advogado Johnny de Melo Silva diz que recorreu da condenação do cliente e está confiante em sua absolvição. Também declara que ambos são inocentes em relação ao inquérito policial.

"A doação para campanha de Marçal ocorreu de forma voluntária e respeitou toda a legislação vigente, se tratando de valores lícitos que não possuem qualquer relação com atividades duvidosas, tampouco com os processos/inquéritos citados, pois se tratam de procedimentos antigos", completa.

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