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Acusação de que eu divido a esquerda não me comove, diz Erundina

Adriano Vizoni/Folhapress
SAO PAULO - SP - BRASIL, 22-09-2016, 15h20: ENTREVISTA LUIZA ERUNDINA. A candidata a prefeitura de Sao Paulo Luiza Erundina (PSOL) durante entrevista exclusiva em seu comite. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, PODER) ***EXCLUSIVO FSP***
A candidata a Prefeitura de São Paulo Luiza Erundina (PSOL) durante entrevista em escritório político na Vila Mariana

Com 5% das intenções de voto na pesquisa Datafolha, a candidata do PSOL, Luiza Erundina, deputada federal e ex-prefeita (1989-1992), diz que a crítica de que sua candidatura divide a esquerda "não procede".

Empatada tecnicamente com o prefeito Fernando Haddad (PT), ela afirma não "se comover" com a sinalização do PT à sua campanha na reta final. "Eu não vim para brincar de eleição", disse à Folha.

A candidata, que teve projetos barrados por falta de apoio na Câmara quando prefeita, afirma também que não faria nada diferente do que fez na gestão anterior.

Ela diz ver suas propostas, de aumentar serviços públicos por meio de taxação aos ricos, como necessárias para "civilizar" a cidade.

*

Folha - A sra. foi prefeita e não conseguiu implementar muito do que havia prometido. Não tinha apoio da Câmara nem do governo estadual e federal. O que faria diferente hoje?
Luiza Erundina - Faria tudo igual. Não cederia aos interesses escusos dos vereadores. Eu não constituí maioria porque a troca de apoio a gente já sabe qual é, né? E o que eu posso fazer de diferente é eu mesma assumir a relação com a Câmara, que antes foi do secretário de Governo. Eu tenho esperança de que a qualidade dos representantes seja um pouco melhor do que na época e que eles pensem mais na cidade do que na sua reeleição.

A sra. saiu mal avaliada e não conseguiu fazer um sucessor. Por quê?
O PT e o [Eduardo] Suplicy, que era o candidato e senador na época, ficaram mais ligados com a questão nacional, o impeachment do [Fernando] Collor. Além disso, o PT não entendeu o significado de ter ganhado a Prefeitura de São Paulo e não valorizou o governo. Durante a campanha, não aproveitou aquilo que deu certo no governo. Muito pelo contrário, o PT era praticamente oposição. E a avaliação do "Estado de S. Paulo", de dezembro de 1992, me deu 38% de aprovação.

Há a crítica de que sua candidatura divide a esquerda. Por que resolveu disputar e não apoiar a reeleição de Fernando Haddad (PT)?
Não foi uma decisão pessoal. Isso interessava ao PSOL e foi até por pressão dos movimentos populares para que eu saísse candidata. E são dois projetos, dois partidos. Essa crítica não procede. Primeiro, eu quero saber qual é o projeto de esquerda que está em disputa? Eu não vejo. Segundo, em nenhum momento, fomos consultados se teríamos candidato, ou fizeram uma sinalização. Por que estão fazendo agora às vésperas da eleição? Não faz sentido. Não me comove. Vamos até o final.

A sra. não teme a perda para o voto útil nessa reta final?
Isso não está em discussão. Se são dois turnos, é para dar a liberdade para o eleitor escolher aquele que ele entende que seja o melhor. E o segundo turno para escolher aquele menos pior, digamos assim. É o jogo democrático. Intervir nesse jogo democrático na última hora não é correto. Eu não vim para brincar de eleição. Eu vim para disputar para valer.

Tendo em vista as votações de reformas que virão, a sra. e seu vice, Ivan Valente (PSOL-SP), não seriam mais úteis à oposição como deputados?
As coisas estão muito ligadas. Se a gente ganha a prefeitura, nosso poder de fogo em relação à questão nacional é muito maior. Essa não é qualquer cidade. Eu imagino a prefeita ou prefeito como algo além de gestor –como um candidato aí que fica negando ser político e diz que é gestor. Eu acho o contrário: o prefeito tem que ter uma excelente equipe. E foi o que eu fiz no meu governo. Aquele que está no comando do barco tem que estar liberado para fazer a macropolítica, que significa influenciar Brasília.

A sra. ajudou a fundar o PT, passou pelo PSB e entrou no PSOL, mas já querendo viabilizar um novo partido, o Movimento Raiz Cidadanista. Por que criar mais um partido?
O problema não é número de partidos, é o que esses partidos significam. Antes de decidir sair do PSB, eu já estava com um grupo de jovens, inspirados na experiência da Espanha, interessados em fazer uma discussão sobre outra forma de organização partidária.

Já estava envolvida nesse processo quando o PSOL me convidou. Eleita pelo PSOL, estarei no PSOL até o último dia de mandato e posso até ficar no PSOL. Não há um conflito. Eu fui saindo por fidelidade a mim mesma, ou seja, por coerência política.

Suas propostas buscam ampliar serviços públicos mesmo em período de crise. Taxar os ricos, que são relativamente poucos, é suficiente para aumentar a arrecadação?
São poucos, mas são muito ricos. São Paulo é uma cidade com muito poder econômico, desde seu Orçamento, de R$ 54 bilhões em 2016. Claro que se a gente ficar só administrando o Orçamento, frente às demandas crescentes, ele vai ser sempre insuficiente. Tem que definir prioridades, e não muitas.

Além disso, a dívida ativa do município é de R$ 66 bilhões, os grandes devedores estão inadimplentes. Vamos resgatar essa dívida no limite de 5% ao ano, o que dá R$ 3,3 bilhões por ano. Essa é uma fonte de receita viável, desde que você tenha uma ação de cobrança.
Outra é adotar o IPTU progressivo, para imóveis acima de R$ 5 milhões. E também para terrenos vazios que estão especulando. É possível através de política tributária, que também faça justiça fiscal, você ter mais recursos nos cofres públicos.

E a questão da dívida do município, como será tratada?
Temos de acionar o governo federal, que cobra da cidade juros sobre juros. Os Estados conseguiram uma liminar do STF [para acabar com isso] e a prefeitura conseguiu uma boa redução da dívida, mas não tratou dessa questão e continua pagando mais de R$ 3 bilhões de juros e serviços da dívida por ano. Não tem sociedade que aguente. E isso porque o governo federal quer pagar a dívida com os banqueiros internacionais. Isso quem paga é a população com menos direitos, saúde, serviços.

O seu programa fala em dar mais poder às subprefeituras. Isso não criará um 'Frankenstein' administrativo?
São realidades muito distintas, com história distinta, vocação econômica distinta, então, o mais lógico é que o planejamento estratégico geral no plano orçamentário seja feito no âmbito de cada grande cidade dessas que são as subprefeituras.
Você faria um planejamento de baixo para cima, destinaria a gestão financeira para lá para não precisar ir até uma secretaria fazer licitação para uma necessidade de solução imediata. Não precisa ter tanta secretaria.

Mas quando João Doria (PSDB) afirmou querer cortar secretarias, a sra. o criticou.
Ele quis acabar com algumas ideologicamente, e nem todas eram secretarias. A das pessoas com deficiência sim, mas mulheres e LGBT não.
Isso reforça o preconceito que ele tem com essas populações, é a prova do quanto é estreito, fundamentalista. Sequer empresário ele é. Se é tão bom gestor, porque não gerencia ele mesmo o Autódromo, o Pacaembu? Quer privatizar até os corredores de ônibus. Vai privatizar a cadeira de prefeito também?

Mas é possível entregar o que promete sem parcerias com setor privado e terceiro setor?
É possível, mas não de pronto. Eu não vou desmontar o que está aí, os convênios prestando serviço. Vou fiscalizar, vou verificar os contratos, porque todo gestor precisa saber o que está contratado. Na saúde, 68% dos equipamentos estão nas mãos de Organizações Sociais. Creches são 1.060 com OSs, e 1.500 diretamente na prefeitura. Nós vamos investir para expandir a rede pública, para que a prefeitura possa ter o controle dos serviços que são dever do Estado. Mas as OSs vão se manter.

A sra. critica o uso de radares para engrossar o caixa da prefeitura. A sra. vê uma 'indústria da multa' na cidade?
Acho que antes de colocar radar para multar, tem que fazer campanha de educação para o trânsito. A multa não vai pesar no bolso de quem tem muito, não vai funcionar. Mas conscientização de que aquilo é bom para a cidade talvez possa.
É preciso fazer entender que uma cidade mais justa é boa para todo mundo, inclusive para o rico, que não precisa gastar tanto dinheiro com guarda particular, com muro tão alto nas suas mansões. Dá um sentido mais civilizatório. São Paulo precisa de civilização na forma de a gente se comportar na cidade.

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