Pode fazer o teste: é só abrir o aplicativo de qualquer plataforma de áudio para se deparar com podcasts para todos os gostos, de meditação a histórias de crimes, passando por conselhos financeiros e entrevistas com celebridades. Mas, em meio a esse cardápio tão variado, a preferência do brasileiro é pelos programas que falam de política.
O fenômeno foi apontado pela terceira pesquisa sobre hábitos culturais realizada por Itaú Cultural e Datafolha, que mostra que esse é o assunto mais procurado pelos ouvintes (19%). Em seguida, vêm assuntos diversos (11%) e notícias diárias (9%). Esportes, religião, arte e cultura têm a preferência de 8% cada um.
O levantamento ouviu 2.240 pessoas de 16 a 65 anos por telefone, entre 2 e 7 de junho.
A administradora Melina Lass, 43, é uma das ouvintes que passou a procurar podcasts com temas políticos. Começou pelo Café da Manhã (podcast de notícias diário da Folha) e foi descobrindo outros, como o Medo e Delírio em Brasília (podcast satírico sobre o governo Bolsonaro).
Ela conta que seu principal meio de informação ainda são os jornais, mas usa podcasts para não se perder na enxurrada de notícias relacionada ao período eleitoral.
"Escuto não só para ficar mais informada, mas também para saber a visão específica das pessoas daquele podcast em que eu confio", diz.
O pesquisador do INCT.DD (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital) Rodrigo Carneiro diz que houve um crescimento no interesse do brasileiro por informações políticas na última década.
"Mais precisamente, desde 2013 esse interesse vem aumentando a reboque do contexto político do país. Além disso, também é registrado um aumento significativo de uso de redes sociais para consumo de informação, de todos os tipos, principalmente com o uso de dispositivos móveis."
A soma desses dois fatores, acredita, tem ajudado a impulsionar os podcasts. Carneiro também explica que, no mundo todo, há um aumento na busca por informações sobre política em anos eleitorais —e o voto obrigatório no Brasil acentua essa tendência.
O levantamento mostrou, ainda, que o principal objetivo dos entrevistados ao ouvir um podcast é se informar (66%). Além disso, o público também procura entretenimento (49%) e educação (32%).
Apesar de ter começado como um formato de nicho, a audiência de podcasts vem crescendo a cada ano no Brasil. A pesquisa aponta que 42% dos brasileiros ouviram ao menos um programa no último ano, o equivalente a mais de 61 milhões de pessoas. O hábito foi um dos que cresceram com a pandemia —antes, esse índice estava em 32%.
E a prática parece ter vindo para ficar: 91% dos entrevistados pretendem continuar escutando esse tipo de conteúdo. Com um público maior e fidelizado, multiplicam-se também o número de podcasts e as formas de consumi-los.
Evidência disso é o investimento que as plataformas têm feito nos videocasts —programas disponibilizados também em vídeo, mostrando a gravação dos episódios. O Spotify, por exemplo, passou a dar suporte para podcasts com vídeo no Brasil em janeiro, com o Podpah de Verão.
"Eu acredito que é uma evolução natural, de oferecer [essa opção] e alcançar novos públicos, sabendo que tem pessoas interessadas nisso", explica o produtor de podcasts sênior do Spotify Rodrigo Vizeu.
Ele destaca que esses programas representam um formato complementar. "Se você for acessar um vídeo dentro da plataforma, vai ver que ele pode ser acessado em primeiro plano, como um vídeo mesmo, ou você pode deixar muito facilmente aquilo em segundo plano."
Quase metade (47%) dos entrevistados no levantamento costumam ouvir podcasts pelo YouTube —que é uma plataforma de vídeo. Já o Spotify, voltado para o áudio, é o favorito de 24% dos brasileiros.
Isso não quer dizer que todo esse público que busca o YouTube está "assistindo a podcasts". Muitos programas publicam na plataforma apenas o áudio, com uma imagem estática preenchendo a tela.
No entanto, definitivamente existe uma grande busca por videocasts, do qual talvez o melhor exemplo seja o Podpah. Considerado um dos maiores podcasts do país, a maior parcela da audiência dele é vinculada ao YouTube.
Criado em 2020, o programa é apresentado por Igor Cavalari, conhecido como Igão, e Thiago Marques, o Mítico, que começaram na internet como youtubers. Para o CEO do programa, Victor Assis, o vídeo foi um trunfo para o sucesso do Podpah porque aproxima a audiência do entrevistado.
"Eu consigo ver a expressão do cara, se ele está confortável ou não", conta ele, que acredita que isso também fez com que o podcast fosse levado mais a sério no mercado.
"Quando você vê o [rapper] Mano Brown rindo e muito confortável com os meninos, você pensa ‘ali as pessoas estão realmente relaxadas, tendo uma conversa’. Então você deixa de conhecer o trabalho do ‘artista pessoa jurídica’ e começa a conhecer o ‘artista pessoa física’", afirma.
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