Ambulantes de Salvador passam o Carnaval acampados na calçada
Conceição Maria Cruz, 53, come sem talheres o prato de feijão com arroz e farinha que está numa das mãos. Com a outra, faz sinal de que a reportagem pode se aproximar.
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"Só agora estou conseguindo almoçar", diz, quase 20h do domingo de Carnaval. Ela pagou R$ 60 à Prefeitura de Salvador por um espaço de 1 metro quadrado para trabalhar como um dos 3.500 ambulantes cadastrados na folia baiana.
O ponto fica na rua de trás do circuito mais badalado da festa, o Dodô, nas cercanias do Farol da Barra.
Para não correr risco de alguém roubar o espaço e ainda conter os gastos com deslocamento (Conceição mora em Plataforma, subúrbio ferroviário da cidade), passaria os seis dias de Carnaval (mais a Quarta-feira de Cinzas) longe de casa, "acampada" na calçada. Dorme numa lona.
Levou toda a família, incluindo quatro crianças, a mais nova de quatro anos. Além de roupa, trouxe sombreiro (para proteger-se do sol), carrinho de mão (para transportar as mercadorias), fogão a gás e até um freezer. Sem falar em um som "para animar" e um ventilador.
Conseguiu uma tomada graças à amizade com um porteiro de um dos prédios.
"Estou nessa batalha há 15 anos. Vendo cerveja e cachorro quente toda vez aqui", diz.
A cerca de 10 metros, passa o trio elétrico do bloco Me Abraça, em que um abadá custa R$ 1.225 e mais de 70% dos foliões é de turistas, a maioria de São Paulo.
Na esquina, há o camarote Contigo!, só para convidados, onde atores de TV surgem bancados por ações publicitárias. Ar-condicionado e pacote "all inclusive": comida e bebida de graça.
A ambulante diz não ligar. "Já me acostumei com isso".
Já os irmãos Josenilton e Josevaldo Oliveira se dizem cansados. Tanto que investiram para, nesse Carnaval, o descanso ser numa barraca de camping. "Dormir em papelão, pedaços de jornal, é complicado", afirmam. A dupla vende "churrasquinho de gato", como anunciam.
"A maioria absoluta do pessoal fica a semana toda, mesmo, na rua. É o jeito de compensar, ganhar um trocado a mais", diz Josenilton.
O governo do Estado informa que, para os filhos desses ambulantes não ficarem "expostos aos riscos do trabalho infantil, sem alimentação nem higiene adequada", oferece há sete anos um centro de acolhimento durante o folia, no bairro de Ondina, trecho final do circuito Dodô.
Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza, o local possui um grupo de 50 profissionais, numa ação em parceria com o Juizado de Menores e o Conselho Tutelar.
"Tivemos o caso de uma família sem moradia, que chegamos incluir no cadastro do Minha Casa Minha Vida e do Bolsa Família [programas sociais do governo federal]. Eram pessoas que não tinham direitos mínimos, foram atendidas durante o Carnaval e receberam este apoio", diz Andréia Macedo, assistente social do centro.
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